São Paulo, segunda-feira, 12 de março de 2001
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LITORAL DE CONTRASTES Povoado considera importante preservar natureza e identidade cultural Ponta Grossa quer turismo light
MARISTELA DO VALLE NO LITORAL CEARENSE Ainda não é coisa do passado aquela aldeia de pescadores quase imaculada dos vícios da sociedade moderna e que parece existir apenas em novelas regionais. A cerca de 190 km a leste de Fortaleza, a praia de Ponta Grossa, no município de Icapuí, mantém intacta sua beleza de falésias e rochas cor-de-fogo e ainda conserva uma população ingênua e ao mesmo tempo preocupada com a manutenção de sua identidade. Os moradores afirmam categoricamente que não querem seguir o exemplo da vizinha Canoa Quebrada, que sucumbiu ao turismo de massa e aos vícios da sociedade moderna, com sua música altíssima, seu trânsito incessante de bugues e caminhões, sua ocupação desordenada. "Os moradores de Canoa venderam a preço de banana suas terras aos gringos. A gente não cai nessa, não", comenta Jeová Crispim, habitante de Ponta Grossa. Ele se refere aos estrangeiros que um dia se apaixonaram por Canoa Quebrada e ali construíram pousadas, restaurantes e bares, "empurrando" os moradores para áreas afastadas da praia. A Prefeitura de Aracati, onde fica Canoa, afirma ter planos para dar assistência à população que se prejudica com o turismo desenfreado. "Se não tomarmos cuidado, é a própria cultura do Ceará que vai deixar de existir, a do pescador e suas jangadas", diz Régis Azevedo, assessor da Secretaria de Cultura e Turismo da cidade. Porém quem trabalha com turismo agradece a transformação do povoado. "Trabalho muito menos e ganho muito mais agora que sou bugueiro", comenta Olavo da Rocha Grangeiro, que nasceu em Canoa e trabalhou como pescador durante muito tempo. Pacto Com os prós e os contras que o turismo pode trazer a Ponta Grossa, a população, de cerca de 180 habitantes, tem alguns cuidados para manter seus direitos e a natureza protegidos. Segundo a Prefeitura de Icapuí, a comunidade tem um pacto que não permite a venda de suas terras a pessoas estranhas ao povoado. Também segundo a prefeitura, outros três pontos resguardam a região: 70% da área pertence a uma APA (Área de Proteção Ambiental), o local tem um projeto de desenvolvimento sustentável e há um conselho de turismo no município, com representantes de todas as praias que abrangem os 67 km do seu litoral. Esse conselho discute os projetos relativos a turismo e tem o poder de barrar propostas de empresários interessados em construir megarresorts e parques em Ponta Grossa. Outro detalhe é que no povoado só é permitida a existência de pousadas domiciliares. Tanto que ali só há um meio de hospedagem, com três quartos. O turismo está chegando a Ponta Grossa aos poucos. A maioria dos visitantes chega ao local com bugueiros de Canoa que comercializam passeios até a praia. Mas a comunidade obriga que os bugues de Canoa abaixem o som ao chegarem ali. Os veículos também são proibidos de subir nas dunas próximas a Ponta Grossa, atualmente delimitadas por uma cerca de arame farpado. Tais medidas não inspiram os moradores de Canoa, onde veículos circulam por todos os lados, incluindo a duna do Pôr-do-Sol, onde todo fim de tarde se reúne uma boa quantidade de bugues. Coincidência ou não, a internacionalmente conhecida praia de Jericoacoara, do outro lado do Ceará, tem uma duna com o mesmo nome. Mas, como em Ponta Grossa, nenhum tipo de veículo pode circular sobre ela, e os moradores acatam a medida sem a necessidade de haver barreiras. A conscientização dos moradores de Jeri, onde raramente se vê lixo nas ruas, aliada à dificuldade em se chegar ao local -pela má qualidade das estradas- ainda mantém a sua aura natural. Embora Jeri esteja fisicamente bem mais distante de Ponta Grossa do que Canoa, parece que o exemplo da praia do litoral oeste está mais presente no ainda desconhecido povoado. Próximo Texto: Simpatia do cearense encanta turistas Índice |
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