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TERRA DE VULCÕES
Atividade incessante do Kilauea há 20 anos transforma paisagens interrompendo florestas com lava
Erupção faz ilha do Havaí crescer todo dia
DA ENVIADA ESPECIAL AO HAVAÍ
No último dia 3 de janeiro, o Kilauea, o vulcão mais ativo do
mundo, completou 20 anos de
erupção contínua. Nesse tempo,
já despejou lava capaz de acrescentar à ilha do Havaí 5.000 quilômetros de terra, criando uma paisagem crua e seca, em que florestas tropicais são interrompidas
por rios de pedra recém-endurecida. Com a força da natureza, desaparecem, sem aviso prévio,
plantações, estradas e até mesmo
cidades inteiras.
Viver na ilha é uma aventura
constante. A cada dia, a terra fervendo brota do chão e toma um
rumo imprevisível. De tempos em
tempos, a costa é atingida por ondas violentas, com mais de 100 km
de extensão, as tsunami, provocadas, entre outras causas, por terremotos nos continentes mais
próximos. A lembrança disso está
no sofisticado sistema de alerta,
com dezenas de alto-falantes espalhados pela costa. O inverno
cobre de neve o topo dos vulcões.
Mesmo a capital, Hilo, teve seus
edifícios históricos totalmente
destruídos duas vezes por tsunami. Em 1946, um terremoto no
Alasca provocou as ondas gigantes. A tsunami de 1960 começou
no Chile. A cidade também já foi
ameaçada pela lava, que chegou a
menos de 6 km de seus limites. A
chuva cai quase 280 dias por ano.
Mas esse ambiente aparentemente inóspito acolhe viajantes
do mundo todo, interessados nas
praias pedregosas, no espetáculo
de fogo do Parque Nacional dos
Vulcões, onde fica o Kilauea, e na
amabilidade do povo.
Na ilha, esparsamente povoada,
foram encontrados os mais antigos vestígios de agrupamentos
polinésios e, ainda hoje, vive ali a
maior comunidade de população
nativa havaiana entre as grandes
ilhas do arquipélago.
No interior, enormes fazendas
de gado nos arredores da cidade
de Waimea estabeleceram uma
genuína cultura caubói, conhecida localmente como "pañiolo".
Aliada aos resquícios da indústria do açúcar, que movimentou a
economia até os anos 30, produziu uma arquitetura simples e de
aspecto rural, com casinhas baixas, pintadas de cores vivas, dispostas ao longo de calçadas elevadas de madeira. Cada uma abriga
charmosas galerias de arte, restaurantes e lojinhas de produtos
naturais. Muitas ainda reúnem
comunidades alternativas, remanescentes dos anos 60.
Na costa, exóticas praias de
areia negra, na chuvosa Hilo ou
na ensolarada Kailua-Kona, no
outro lado da ilha, cedem espaço a
sete vales escarpados que partem
da capital rumo ao norte.
O maior deles, o vale Waipio,
percorre quase 10 km em direção
ao centro da ilha. Uma via íngreme, com 1,5 km de extensão, leva
ao fundo do vale. Pode ser percorrida apenas por veículos com tração nas quatro rodas ou pelos que
se dispuserem a caminhar 30 minutos de descida difícil e outros 40
de subida inclemente na volta. Lá
embaixo, uma trilhazinha plana
conduz à praia de água brava, ladeada por uma cachoeira que cai
diretamente no mar.
Um desvio na estrada cênica
que leva a Waipio passa por outra
cachoeira bem mais famosa, a
Akaka, com 120 m de queda. Para
chegar até lá, percorre-se uma trilha fácil de menos de meia hora
no meio da vegetação tropical no
pequeno parque estadual que
conserva a área.
Mas a grande atração da ilha são
mesmo seus vulcões, responsáveis por um ciclo constante de
criação e destruição. Unidos por
uma mesma base no fundo do
mar, o Mauna Kea e o Mauna Loa
formam o maior conjunto vulcânico da Terra e dominam a paisagem seja qual for o ponto de vista.
Só o Mauna Loa, com seus 4.169
m de altitude, ocupa mais da metade da superfície da ilha.
Na garganta que separa as duas
montanhas, a estrada de Saddle,
quase sem tráfego, liga as duas
costas da ilha. Nos seus 89 km, o
cenário varia de floresta tropical a
campos de lava endurecida. No
meio do caminho, uma estrada
sem identificação leva ao topo do
Mauna Kea, onde há 12 dos mais
precisos telescópios do mundo.
Tudo isso faz da ilha do Havaí
um laboratório natural, onde o
céu e a terra em formação podem
ser observados sem barreiras.
(ANA LUCIA BUSCH)
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