São Paulo, segunda-feira, 13 de janeiro de 2003

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BAHIA DE TODAS AS FESTAS

No dia 2 de fevereiro, Rainha do Mar recebe oferendas debaixo do oceano, onde habitaria

Pescadores saúdam Iemanjá com flores

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Diferentemente das festas da Boa Viagem e do Bonfim, a de Iemanjá, no dia 2 de fevereiro, é exclusivamente do candomblé. As outras são festas católicas frequentadas por adeptos do candomblé, em que o sincretismo predomina. Mas na festa de Iemanjá só há espaço para o culto à Rainha do Mar.
A procissão de barcos que levam presentes para a orixá lembra a cerimônia da festa de Bom Jesus dos Navegantes, mas, na de Iemanjá, as embarcações vão abarrotadas de flores e presentes que serão jogados no fundo do mar, onde habitaria a deusa, que é representada pela imagem de uma mulher vaidosa, de cabelos longos e seios grandes.
A festa para Iemanjá ocorre no largo de Santana, no bairro do Rio Vermelho, onde está localizada a sede da colônia de pescadores Z-1, que tem mais de 650 profissionais afiliados e compreende a área que vai da Boca do Rio à rampa do Mercado Modelo, no bairro do Comércio, na Cidade Baixa.
A Casa de Iemanjá, onde existe uma imagem da orixá, representada por uma sereia, fica nas dependências da colônia e lá são depositadas as oferendas para a orixá. Com os presentes, geralmente são colocados pedidos.
Os pescadores da colônia oferecem o presente principal, que é levado para Iemanjá por volta das cinco horas da tarde de 2 de fevereiro, numa galeota seguida por outras 300 embarcações, que levam os presentes depositados pelas pessoas ao longo do dia.
Durante todo o dia a praia de Santana fica lotada, assim como todo o bairro do Rio Vermelho. Muitas ruas são interditadas para permitir que a multidão as ocupe. Barracas com música, comidas e bebidas típicas ajudam a animar o público. Moradores do bairro organizam cafés da manhã comunitários ou almoços, geralmente feijoadas, para receber os amigos.
Existem também feijoadas vips, servidas em restaurantes ou hotéis do Rio Vermelho e de outros bairros da capital baiana.
Essas festas são pagas e reúnem pessoas de várias tribos, membros da alta sociedade, turistas e aqueles que querem evitar a multidão do bairro. Vários artistas participam dessas festas, que têm shows e apresentações musicais.
Bandas populares e grupos folclóricos também fazem apresentações para o público que circula pelo bairro. Na festa, também conhecida como Lavagem do Rio Vermelho, não é permitida a circulação de trios elétricos.
No dia 2, o mar é a atração principal. Todos voltam seus olhos para a praia de Santana, onde, além dos cerca de 300 balaios levados ao mar pelos pescadores, que os depositam a seis milhas da costa (11 km), são lançadas no mar diretamente pelos devotos da mãe-d'água oferendas como flores, perfumes e espelhos.
Isso ocorre principalmente porque as filas para depositar os presentes na Casa de Iemanjá são enormes (a festa reúne cerca de 200 mil pessoas a cada ano).
Nas areias da praia de Santana, pode-se ver, além do movimento do público em geral, manifestações do candomblé, como incorporação de espíritos. Mães e filhas de santo desfilam com seus trajes nobres, todas de branco. O que não falta é gente para oferecer e pedir coisas à Rainha do Mar. Ao final, todos dizem a saudação para Iemanjá: "Odoyá".
A festa começa ainda na madrugada do dia 2, quando os pescadores vão ao dique do Tororó levar oferendas para Oxum, deusa das águas doces, para que ela também se sinta homenageada.
Quando o sol nasce, há uma alvorada com queima de fogos e, nesta hora, já se pode ver pessoas vestindo roupas claras (branco, azul e verde-claro são as cores de Iemanjá) para saudar aquela que é considerada a mãe dos orixás.
Apesar de muitos serem contra o sincretismo, ele também existe nesta festa, afinal Iemanjá é a Nossa Senhora da Conceição dos católicos, a Janaína dos índios e a sereia dos marinheiros europeus.
O culto a Iemanjá foi trazido pelos africanos escravos no século 16. Em Salvador, a festa foi criada por volta de 1920 por uma iniciativa da colônia de pescadores Z-1, que, devido a um ano de fraca pescaria, resolveu recorrer a Iemanjá para pedir melhoras.
Porém a festa não se resume aos pescadores. Dela participam pessoas de todas as classes sociais e de variados credos e raças. A mãe dos orixás conseguiu a façanha de tornar a sua festa uma das mais importantes manifestações culturais baianas.
(PALOMA VARÓN)


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