São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2004

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AUTOFAGIA À PAULISTA

Grupo XIX de Teatro realiza pesquisa no local e prepara estréia no próprio espaço em 2005

Maria Zélia vira palco de espetáculo

DO ENVIADO ESPECIAL AO INTERIOR DE SP

A Vila Maria Zélia deve ingressar no cenário cultural paulistano em março ou abril do ano que vem. Há seis meses vem sendo ali preparado o novo espetáculo do grupo XIX de Teatro. A peça, cujo tema é a casa, entrará em cartaz em 2005 no próprio espaço.
Batizado de "A Residência", o projeto da jovem companhia, que estreou com muita aclamação sua primeira montagem, "Hysteria", em 2002, contempla um longo estudo do meio, que enfeixa a coleta de depoimentos de moradores, a realização de oficinas teatrais e a apresentação de outras encenações -entre as quais "Hysteria".
Dez artistas freqüentam a vila quase diariamente. Eles se encontram baseados num armazém que estava desativado havia 37 anos. "Muita gente nunca tinha entrado ali antes de nós chegarmos", afirma o diretor Luiz Fernando Marques, 26.
Ele diz que a escolha da Maria Zélia tem uma dupla função. "Tem a ver com a discussão do grupo, que quer ocupar espaços históricos, e tem a ver com a vontade de chamar a atenção do poder público e de revelar a cidade", declara o encenador. "A vila é a única que possui, além das casas, aparelhos públicos como duas escolas, hoje abandonadas."
Tem ocorrido no local a interação entre visitadores e visitados. O grupo já realizou na área sessões de cinema ao ar livre e organizou uma mostra com fotografias antigas. "No aniversário da vila, montamos uma pequena peça especialmente para eles [os moradores]", recorda Marques. O projeto é viabilizado por uma verba de R$ 250 mil do Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo.
Propulsora da trupe, "Hysteria" despontou numa aula ministrada pelo diretor do incensado Teatro da Vertigem, Antônio Araújo, na USP. O espetáculo estreou no Festival de Teatro de Curitiba dois anos atrás e foi considerado a surpresa do evento. Foi indicado ao prêmio Shell e chegou a ser encenado em Portugal e na França.
Tanta curiosidade derivou do modo como era tratado o assunto da peça: a vida de internas de um hospício do século 19. Apropriando-se em todas as sessões de espaços não-convencionais, de preferência antigos -o prédio da FAU Maranhão, por exemplo-, a encenação dividia a platéia de acordo com o sexo. As mulheres eram postas em cena com as atrizes, e os homens apenas assistiam ao que disso resultava. A interação surgida, coisa rara, não caía no constrangimento típico.
Praticamente todo o mundinho de teatro -e de TV e de cinema- assistiu a "Hysteria": Antonio Fagundes, Antunes Filho, Eva Wilma, Matheus Nachtergaele etc. Fernanda Montenegro ficou sabendo da companhia por intermédio da produtora e decidiu dar um curso às intérpretes. Ela compareceu à peça no Rio de Janeiro e em Portugal. "Quando me ligaram [para conversar a respeito do curso], achei que fosse mentira", lembra Luiz Fernando Marques.
A próxima peça ainda não tem nome, e o esboço da sua dramaturgia está prestes a ser começado. O XIX de Teatro mantém um site -www.grupoxixdeteatro.ato.br- com mais informações.
(PEDRO IVO DUBRA)


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