São Paulo, segunda-feira, 18 de junho de 2001

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NA MONTANHA

Com ares medicinais, Campos do Jordão pode ser identificada com plantas como araucária e murta

Símbolos vegetais resumem a cidade

DO ENVIADO ESPECIAL

Campos do Jordão ostenta, sobretudo desde fins dos anos 80, o emblema de cidade turística por excelência, opção tanto para a balada como para o repouso.
Que o símbolo de Campos seja o pinheiro, isso está garantido por lei municipal e confirmado por uma iconografia espalhada pelos muros e pela paredes.
Em frente ao Palácio do Governo, por exemplo, pode-se ler poema do historiador Pedro Paulo Filho, que exalta no pinheiro o "perfil delicado e simétrico" e os "galhos voltados para os céus" -formas que, no texto, alegorizam o ideal de comunhão dos homens entre si e com o divino.
Mas, além das araucárias, um outro vegetal poderia identificar a cidade: a murta, planta que, por sua "inconstância" e plasticidade a influências externas (tal como a água quando posta em recipientes de formas diversas), é boa alegoria, segundo o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, para culturas que buscam fora (no contato com outros grupos) a identidade interna.
Na profusão de hotéis e pousadas, no contorno suíço das casas e lojas e até nos braços abertos da atriz Ana Paula Arósio no cartaz publicitário à entrada da cidade, Campos parece estar sempre à espera do outro (na figura do visitante), atraindo-o ou indo simbolicamente em direção a ele, ao se camuflar de adornos estrangeiros, sobretudo alpinos, em plena serra da Mantiqueira.

Cidade-sanatório
O despertar de Campos para a vocação turística se deu nos anos 40, tendo relação direta com o interesse do governo e empresariado de São Paulo em dispor de um novo espaço para o lazer chique. Além da construção do Palácio Boa Vista (residência oficial de veraneio), data da época um verdadeiro boom hoteleiro e um novo Plano Diretor para a cidade.
Até então, o ar puro e o clima montanhês eram aproveitados apenas como terapia para doentes de tuberculose. Mesmo enquanto foi cidade-sanatório, Campos já tinha algo da "identidade-murta" que se exacerbaria quando da guinada ao turismo.
Daí que, para definir as virtudes medicinais do lugar, fosse tão comum compará-la à cidade suíça de Davos, também ela tradicional estância de tratamento de males do pulmão.
Essa semelhança entre Campos e Davos contagiou não só a visão de médicos como Emílo Ribas -pioneiro do povoamento local, com base na instalação de sanatórios. Inspirou também escritores como Dinah Silveira de Queiroz, que, em "Floradas na Serra" (1939), faz de Campos um palco geográfico e existencial à altura -guardadas as proporções- da Davos de sofrimentos e redenções traçada pelo escritor alemão Thomas Mann em "A Montanha Mágica" (1924).
(CAIO CARAMICO SOARES)


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