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NA MONTANHA
Com ares medicinais, Campos do Jordão pode ser identificada com plantas como araucária e murta
Símbolos vegetais resumem a cidade
DO ENVIADO ESPECIAL
Campos do Jordão ostenta, sobretudo desde fins dos anos 80, o
emblema de cidade turística por
excelência, opção tanto para a balada como para o repouso.
Que o símbolo de Campos seja o
pinheiro, isso está garantido por
lei municipal e confirmado por
uma iconografia espalhada pelos
muros e pela paredes.
Em frente ao Palácio do Governo, por exemplo, pode-se ler poema do historiador Pedro Paulo Filho, que exalta no pinheiro o "perfil delicado e simétrico" e os "galhos voltados para os céus" -formas que, no texto, alegorizam o
ideal de comunhão dos homens
entre si e com o divino.
Mas, além das araucárias, um
outro vegetal poderia identificar a
cidade: a murta, planta que, por
sua "inconstância" e plasticidade
a influências externas (tal como a
água quando posta em recipientes
de formas diversas), é boa alegoria, segundo o antropólogo
Eduardo Viveiros de Castro, para
culturas que buscam fora (no
contato com outros grupos) a
identidade interna.
Na profusão de hotéis e pousadas, no contorno suíço das casas e
lojas e até nos braços abertos da
atriz Ana Paula Arósio no cartaz
publicitário à entrada da cidade,
Campos parece estar sempre à espera do outro (na figura do visitante), atraindo-o ou indo simbolicamente em direção a ele, ao se
camuflar de adornos estrangeiros, sobretudo alpinos, em plena
serra da Mantiqueira.
Cidade-sanatório
O despertar de Campos para a
vocação turística se deu nos anos
40, tendo relação direta com o interesse do governo e empresariado de São Paulo em dispor de um
novo espaço para o lazer chique.
Além da construção do Palácio
Boa Vista (residência oficial de veraneio), data da época um verdadeiro boom hoteleiro e um novo
Plano Diretor para a cidade.
Até então, o ar puro e o clima
montanhês eram aproveitados
apenas como terapia para doentes
de tuberculose. Mesmo enquanto
foi cidade-sanatório, Campos já
tinha algo da "identidade-murta"
que se exacerbaria quando da guinada ao turismo.
Daí que, para definir as virtudes
medicinais do lugar, fosse tão comum compará-la à cidade suíça
de Davos, também ela tradicional
estância de tratamento de males
do pulmão.
Essa semelhança entre Campos
e Davos contagiou não só a visão
de médicos como Emílo Ribas
-pioneiro do povoamento local,
com base na instalação de sanatórios. Inspirou também escritores
como Dinah Silveira de Queiroz,
que, em "Floradas na Serra"
(1939), faz de Campos um palco
geográfico e existencial à altura
-guardadas as proporções- da
Davos de sofrimentos e redenções
traçada pelo escritor alemão Thomas Mann em "A Montanha Mágica" (1924).
(CAIO CARAMICO SOARES)
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