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São Paulo, segunda-feira, 20 de outubro de 2003

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BONS VENTOS

Autêntica, contida e algo pão-dura, cidade, que resgatou seus prédios históricos, se prepara para efervescer

Em 2004, Gênova vira epicentro cultural

SILVIO CIOFFI
ENVIADO ESPECIAL À LIGÚRIA

O caminho das pedras é o site oficial www.genova-2004.it: Gênova será Capital Cultural da Europa a partir do Ano Novo. Com isso, uma série infindável de eventos -agrupados sob os títulos "Cidade das Artes", "Capital do Mar", "Cidade Contemporânea" e "Conferências"- vai transformar a metrópole portuária em megadestino turístico.
Mas, mesmo com festa, a cidade, que edificou sua basílica de San Lorenzo durante séculos, alternando o mármore rosado e o negro, e que ora restaura freneticamente o centro histórico para ser sede de um mundo de atrações culturais, é séria, sisuda até.
Metrópole de 800 mil habitantes que conquistou espaço lutando contra o mar e comerciando, Gênova nunca foi eterna e disponível como Roma nem teve a pressa e o arrojo de Milão. Talvez por isso, no fundo do golfo da Ligúria, ela se manteve autêntica, contida, e até algo pão-dura. O resultado é que Gênova (cujo site é www.apt.genova.it) pratica preços menos altos que os de Roma ou Milão e, por trás de uma aparente timidez, é, afinal, arrebatadora.

Porto Antico
A onda de renovação teve início em 1992, no Porto Antico, e agora entra na reta final. Já recuperaram a antiga forma a fonte e os prédios rosados no entorno da piazza de Ferrari e o palácio Ducale, cuja fachada é adornada com pinturas.
Agora é a vez dos prédios ecléticos e do calçadão coberto por galerias da via 20 Settembre, a avenida larga onde a cidade passeia.
No setor medieval, no emaranhado de ruelas entre a basílica de San Lorenzo e o porto, os museus-palácios patrícios do século 16 sofrem retoques. No interior deles, desde sempre, estiveram pendurados óleos de Pedro Paulo Rubens e de Van Dyck, flamengos que moraram em Gênova financiados por famílias ilustres da "Soberba" (ou La Superba, nome italiano adotado na época em que lá houve uma república).
A cidade também diz a que veio quando o assunto são as artes da culinária -das frutas cristalizadas aos frutos do mar; da pasta al pesto (com manjericão, pinólis e queijo pecorino, de cabra) às massas al nero de sépia, cujo molho é feito com a tinta da lula.

Caráter
Varrida pelo "libeccio" (pronuncia-se libétchio), o vento frio que, no inverno, vem do mar e gela os becos, Gênova moldou seu perfil negociando com locais tão distantes como Bizâncio (atual Istambul) e Bruges (na Bélgica). Os comerciantes locais eram ativos ainda na Argélia e na Síria, para a ira de Veneza, sua arqui-rival.
Entre 1378 e 1381, a "Soberba" (Gênova) e a "Sereníssima" (Veneza) guerrearam, e os genoveses levaram a pior.
Entre seus filhos ilustres, está Cristóvão Colombo (1451-1506), o navegador que, sem saber, descobriu a América a soldo dos reis da Espanha, em 1492. Colombo deve ter nascido numa casa próxima à Porta Soprana, antigo portão leste da muralha que cercou a cidade, embora seu nascimento também encerre controvérsias (há quem afirme que o navegador, que pode ter origem judaica, nasceu na Espanha ou na ilha da Madeira).
Já Andrea Doria (1466-1560), que conduziu Gênova ao apogeu militar e comercial, nasceu nos arredores, em Onegila, de antepassados que viviam no castelo de Dolceaqua, ainda um local digno de se visitar.
Chamado de "O Pai da Paz", Andrea Doria foi na verdade um bravo guerreiro que serviu à Itália e à França, recuperando o esplendor de Gênova, que passara por momentos difíceis depois de sua participação nas Cruzadas, e combatendo invasões mouras.
É dessa época a Banca di San Giorgio, cujo prédio fica ao lado do Porto Antico. Já em 1408, a organização criara um sistema de letras de câmbio para custear a expansão marítima, movida à ambição de famílias aristocráticas.
Hoje, o filho pródigo de Gênova é Renzo Piano e tem 63 anos. Arquiteto tão festejado por seu arrojo técnico quanto é criticado pela obra do Centro Georges Pompidou de Paris (1977), ele redesenhou o Porto Antico em 1992, abrindo caminho para a cidade virar, arquimerecidamente, Capital Cultural da Europa em 2004.


Silvio Cioffi, editor de Turismo, viajou a convite da Alitalia e do Ente Nazionale Italiano per il Turismo (Enit) em SP


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