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QUALQUER VIAGEM
Cadaques: o loooouco amor on the rocks de gala
DAVID DREW ZINGG
voando para a Espanha
"Não pinto um retrato para que se pareça com seu sujeito. É a pessoa que
acaba se parecendo com seu retrato
pintado por Dalí." Salvador Dal(í)
Cadaques é uma cidade espanhola de praia bem doida.
A minúscula cidade portuária fica logo ao norte de Barcelona, a caminho da França.
É o tipo de lugar da moda que
é frequentado pelo tipo de pessoa que tem tanto dinheiro
que, se você lhe perguntasse,
ela teria dificuldade em lhe dizer exatamente QUANTO tem.
Parafraseando um velho ditado gringo sobre esnobes ricos,
em Cadaques os Esteves só falam com os Guinesses, e os Guinesses só falam com Deus.
No verão, os turistas superam
os habitantes locais da cidade
numa proporção de mais ou
menos 10 para 1.
Poucas das pessoas que invadem a cidadezinha que parece
saída de um cartão-postal, com
casas caiadas, ruelas íngremes
e barcos pesqueiros pintados
em cores vivas, o fazem por
suas praias, que são pequenas e
recobertas de pedras.
A maioria ainda vem atraída
pela magia do falecido Salvador Dal (que você, Joãozinho,
conhece por Dalí).
Era aqui que o pintor surrealista passava suas férias em família, e foi aqui que viveu boa
parte de sua vida sexualmente
apimentada, logo aqui perto,
em Port Lligat.
Tio Dave também costumava
frequentar esse lugar, no final
dos anos 50.
Visitei o gênio exageradamente bigodudo e sua mulher,
Gala, que me examinou de alto
a baixo, com ar de conhecedora, com um par de olhos estranhamente brilhantes e ardentes.
(Foi só mais tarde que fui saber de alguns dos prazeres ninfomaníacos que a senhora Dal
curtia. Ela continuou sexualmente ativa, e muito, até bem
depois de completar 80 anos.)
Dal, tímido?
Parece difícil de acreditar,
mas Dal, o pintor expansivo,
que se autopromovia a toda
hora e parecia viver nas primeiras páginas do mundo, começou a vida na Catalunha como uma criança tímida e reticente.
Dolorosamente encabulado,
apavorado com a idéia de que
pudesse ser sexualmente impotente, os diários incompletos da
adolescência de Dal mostram
que, aos 16 anos, ele já decidira
que só conseguiria sobreviver
emocionalmente se construísse
uma personalidade extrovertida e exibicionista que usaria
para enfrentar o mundo.
Suas aventuras sexuais começaram quando Dal conheceu o
poeta francês Paul Eluard, numa visita a Paris. A esposa de
Eluard, a russa Gala, estava fora da cidade, e o poeta se divertia mostrando fotos dela nua
ao espantado e faminto de sexo
Dal, ainda virgem.
Dal acabara de fazer com
Luis Bu$uel o filme "Um Cão
Andaluz".
Os surrealistas parisienses ficaram impressionados com
"Um Cão Andaluz" e intrigados com Dal, que convidou
Bu$uel, Eluard e René Magritte
a visitá-lo mais tarde naquele
verão, com suas respectivas
parceiras.
Eles se reuniriam em Cadaques, o paraíso de infância de
Dal na Costa Brava, onde sua
família tinha uma casa de
praia.
O alegre grupo se reuniu no
povoado distante no início de
agosto de 1929.
Prazeres russos
Quando Dal viu Gala de
maiô na praia de Es Llane, em
Cadaques, a realidade superou
suas fantasias mais desvairadas.
A "mignonne" russa-transformada-em-parisiense era o
corpo de seus sonhos personificado.
Para serem belos aos olhos de
Dal, seios tinham que ser pequenos. Seios fartos provocavam sua repulsa. Os de Gala se
adequavam exatamente a seu
ideal.
Eram "tão doces", como
Eluard certa vez escreveu a ela,
"que dá vontade de comê-los".
O próprio Dal nunca deixaria
de afirmar que ele, pessoalmente, era apreciador de bundas. De fato, chegou ao ponto
de se dizer o maior pintor de
bundas femininas de todos os
tempos.
Agora, depois de uma espera
tão longa e angustiante, a própria Venus Callipygia tomara
forma concreta diante de seus
olhos e no cenário que ele amava mais do que qualquer outro
no mundo: a praia de El Llanes,
que Dal descobrira ainda
criança.
O cenário era ideal, o físico,
perfeito. Foi desejo desvairado
à primeira vista.
Gala, claramente, era um
vulcão erótico a ponto de entrar em erupção.
Ela detestava feiúra física ou
deformidades de qualquer espécie, de modo que seus amantes tinham, obrigatoriamente,
que ser belos. Dal satisfazia
seus critérios à perfeição.
Assim começou o período
mais original e criativo na vida
do pintor, que continuou até
que ele e Gala fugiram para os
Estados Unidos, em 1940.
Apesar dos inúmeros casos de
Gala, que continuaram até
quase seus 90 anos, os dois permaneceram juntos por quase
50 anos.
Sem o tino de Gala para os
negócios, sua motivação, sua
ambição implacável, seu egoísmo monstruoso e sua crença
profunda no talento de Dal, a
vida de Salvador teria, sem dúvida, sido uma história diferente (e, possivelmente, mais
bonitinha).
"Não fosse por ela", admitiu o
pai de Dal a contragosto, quando já estava velho, "meu filho
teria virado um vagabundo,
dormindo debaixo de alguma
ponte de Paris."
David Drew Zingg está viajando a convite da
Spanair, Finnair e do Conselho Finlandês de Turismo.
Tradução de Clara Allain
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