São Paulo, segunda-feira, 22 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Nativos do Havaí mudaram de idéia ao ver os veleiros do capitão inglês sucumbirem à tempestade

Cook passou de deus a diabo em meses

DO ENVIADO ESPECIAL AO HAVAÍ

Nascido em 1728 em Yorkshire, James Cook aprendeu a navegar em Whitby, numa costa traiçoeira onde o rio Esk encontra o mar do Norte. Curtido na adversidade da água rasa e do fundo pedregoso da foz do rio, Cook se lançou pelo mar cinzento que rodeia as ilhas britânicas para se tornar o navegador que inaugurou a era das viagens científicas.
Já capitão, velejou em águas pouco profundas do hemisfério Sul, bordejando a Antártida e descobrindo o que de importante faltava encontrar na época: a Austrália e o Havaí, a maior porção de terra da Polinésia e o único arquipélago importante que, na região, fica ao norte do Equador.
Suas expedições pela Polinésia tiveram início a pretexto de observar o trânsito do planeta Vênus, mas Cook acabou por desvelar minuciosamente o contorno desse conjunto infinito de ilhas cobiçadas pelo Reino Unido e pelas grandes potências da época.
Se o propósito das viagens era mapear terras e estudar a fauna e a flora, Cook acabou redefinindo as rotas comerciais marítimas.
Quando chegou ao Rio em novembro de 1768, sua esquadra foi recebida com hostilidade. O capitão, que tinha 40 anos e era famoso em todo o mundo, admirou-se com o Pão de Açúcar e anotou em seu diário que o cenário era "imensamente alto". A tripulação foi impedida de desembarcar no Rio, pois as autoridades desconfiaram da veracidade de sua missão (a observação de um planeta).
Essa primeira viagem prosseguiu rumo ao cabo Horn, explorou o Taiti, as ilhas Sociedade e descobriu a Nova Zelândia. Numa outra viagem, iniciada em 1772, Cook navegou muito próximo à Antártida e explorou a Melanésia e a Tasmânia.
Relatos confiabilíssimos de sua equipe, que incluía oficiais versados em cartografia, botânica e zoologia, dão conta de que Cook, ao descobrir o Havaí, foi recepcionado pela maior festa jamais presenciada por um europeu.
Todas as canoas de Kauai, cobertas de flores e frutas, foram ao mar em 18 de março de 1778. Místicos isolados do mundo, os nativos havaianos enxergaram nos navios britânicos uma floresta-cidade que navegava e concluíram que James Cook era um deus.
A expedição partiu, para voltar ao Havaí meses depois. A ilha de Maui foi avistada no dia 26 de novembro e, no dia 30, chefes nativos foram convidados para subir a bordo do navio Resolution.
No início de 1779, Cook decidiu navegar até a baía de Kealakekua, mas foi colhido por uma tempestade violenta, movida pela fúria das ondas havaianas. A expedição retornou e os nativos se deram conta da vulnerabilidade nada divina dos veleiros britânicos.
No dia 14 de fevereiro, após ver seus barcos depenados por nativos, que desconheciam instrumentos metálicos, o capitão ordenou o sequestro do rei nativo.
Desembarcou e, sem muita cerimônia, foi brutalmente assassinado pelos nativos. A carne do corpo foi removida dos ossos e o que restou do capitão, basicamente suas mãos, foram devolvidas sobre um manto de plumas brancas em 15 de fevereiro.
Nos dias seguintes, oficiais ingleses atearam fogo a cabanas, explodindo o que viam pela frente.
As mãos de Cook foram enterradas no dia 22 de fevereiro, na baía de Kealakekua -e, como numa explosão de fúria, o Havaí entrou, definitivamente, na era da modernidade. (SILVIO CIOFFI)


Texto Anterior: London vibrou com o homem sobre as ondas
Próximo Texto: Cozinha regional abusa de heranças étnicas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.