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DE TODAS AS TRIBOS
Manuel Bandeira guia roteiro comparativo
Em 1927, escritor esteve na cidade; ao refazer seus passos, o visitante constata o que resiste e o que sumiu
DA ENVIADA ESPECIAL A SALVADOR
"Vou encher lingüiça com
bosta de boi, conto histórias da
carochinha, a guerra dos cem
anos e pronto." O escritor Manuel Bandeira descreveu assim,
em carta para Mario de Andrade, como faria uma crônica sobre Salvador a pedido de Assis
Chateaubriand para "O Jornal". Em 30 de abril de 1927, o
periódico publicou o texto "Impressões da Bahia".
Bandeira, no entanto, não o
fez com bosta de boi ou histórias da carochinha. Já na cidade, escreve novamente ao amigo: "Mario, estou apaixonadíssimo pela Bahia! É uma terra
estupenda a cidade brasileira".
E foi assim, "comovidíssimo", que passeou pela cidade e
visitou igrejas -"o que há de
mais belo na Bahia".
O relato, que está no livro
"Crônicas da Província do Brasil", de 1937, reeditado neste
ano pela Cosac Naify, serve de
guia para um passeio comparativo pelo patrimônio histórico.
No saldo geral, o turista tem
boas surpresas. Grande parte
do que Bandeira cita está de pé.
A começar pela "mais rica
maravilha de todo o Brasil": a
igreja de São Francisco. O
exemplo de "barroco depurado
e harmonioso" acolhe seus visitantes de 2006 com os mesmos
predicados de 1927. Estão lá "a
maravilhosa lâmpada da capela-mor, toda de prata maciça do
Porto", o são Pedro de Alcântara, do escultor baiano Manuel
Inácio da Costa, "uma escultura notável pela expressão de sofrimento estampada no rosto e
nas mãos", e o teto da capela-mor que "retém longamente a
vista do observador pela engenhosidade com que o artista
obteve o forte e rico efeito de girândola".
O roteiro segue para a igreja
do Carmo e seus "grandes tocheiros de prata maciça, tão pesados que ladrões não lograram
carregar quando (...) assaltaram o templo". O convento do
Carmo, colado na igreja, virou
hotel cinco-estrelas, mas isso
não deve intimidar a visita.
Fora do Pelourinho, na avenida Sete de Setembro, o convento São Bento também segue
de pé. Bandeira é implacável:
"A casa está toda infiltrada de
mau gosto e da mediocridade
do estilo Sagrado Coração".
De volta à praça da Sé, a primeira baixa: a "maciça e sombria Sé Velha, avó rija e memorável" foi demolida, em 1933,
para a passagem do bonde. Para
constar: "No interior, rica prataria guardada na pequena capela à esquerda do altar-mor".
Para compensar o lamento,
siga para a igreja da Misericórdia, "onde tantas vezes pregou
o padre Vieira". Após uma restauração precisa, foi aberto o
Museu da Misericórdia (tel.:
0/xx/71/3322-7355; ingresso:
R$ 5), contíguo à igreja.
E a lista de templos segue: a
catedral, a de São Domingos, de
São Pedro dos Clérigos, todas
na praça Terreiro de Jesus,
continuam ali. Conceição da
Praia, idem. A de Monte Serrat,
na ponta de Humaitá, e a de
Nossa Senhora da Graça estão
um pouco fora do circuito, mas
valem cada minuto de trânsito.
Sumiço
Em seu passeio, Bandeira foi
a dois solares que julgou merecerem "do governo estadual algum zelo". O do Saldanha, na
rua Guedes de Brito, na Sé,
abriga o Liceu de Artes e Ofícios e está bem cuidado.
Já o solar dos Aguiares, "num
arrabalde", já em 1927 estava
"reduzido a casa de cômodos".
"O pátio interno ameaça ruir.
Os lindos azulejos, que contam
a história do Filho Pródigo,tão
maltratados!", descreve Bandeira. Hoje, o visitante não encontra nem pátio interno nem
azulejos. Ninguém, nem os
guias, nem os taxistas, nem o
Iphan (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional),
sabe onde ele fica.
Intervenção
Na crônica de Bandeira, há as
impressões que o escritor teve
ao chegar à cidade. Essas impressões foram, a pedido do
Turismo, comentadas pelo
músico Tom Zé, que criou continuações para elas. Leia, nessa
página, essa soma de comentários.
(HELOISA LUPINACCI)
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