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São Paulo, segunda-feira, 24 de novembro de 2003

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ILHA DA FANTASIA

Ator abandona estrelato por dez anos para viver na região, que ainda inspira mestres da literatura

Marlon Brando troca cinema por atol nos anos 60

DO ENVIADO ESPECIAL À POLINÉSIA FRANCESA

A Polinésia não é um lugar por onde se passa impune. É comum ouvir histórias de pessoas que foram profundamente marcadas pela visita ao território e até chegaram a mudar radicalmente o destino de suas vidas.
É o caso do ator Marlon Brando, que esteve pela primeira vez na região em 1960, participando das filmagens de "Motim a Bordo". Conta-se que foi imediata sua identificação com a natureza local e o modo de viver dos nativos. Durante as filmagens, teria passado a andar nas ruas de Papeete com pareô e flor no cabelo.
Brando acabara de perder o controle sobre "A Face Oculta", seu primeiro filme como diretor. Havia se casado fazia pouco tempo com a atriz Movita, grávida de um filho seu, e sua ex-mulher, Anna Kashfi, lutava nos tribunais pela guarda de seu outro filho Christian, então com cinco anos.
Nas filmagens o ator conheceu e iniciou o relacionamento com a dançarina local Taritatum a Teriipaia, então com 19 anos e que também atuava no filme. A produção foi atrasada por chuvas e sucessivas faltas de Brando e estendeu-se pelo ano seguinte.
Apaixonado pelo atol de Tetiaroa, 17 km ao norte de Papeete, Brando teria usado a influência do então primeiro-ministro francês George Pompidou para comprar o lugar. Nessa mesma época, Taritatum deu à luz o menino Teyhotu, e o ator decidiu abandonar "definitivamente" o cinema para estabelecer residência em seu atol particular.
Durante mais de dez anos ficou desaparecido da mídia, dando espaço a inúmeros boatos sobre a vida excêntrica que levaria no Pacífico e sobre a decadência de sua saúde financeira, física e mental.
Em 1970, nasceu a segunda filha do casal, Cheyenne. O investimento sucessivo de milhares de dólares em Tetiaroa acabaria forçando a volta de Brando aos filmes em 1971. Atualmente, há apenas um hotel no atol. De propriedade de Taritatum, o estabelecimento é fechado quando Brando está presente.

Literatura
O lugar isolado onde o pintor Paul Gauguin encontrou o estado selvagem que retrata em suas pinturas e seu livro "Noa-Noa" também influenciou outros artistas.
O escritor americano Herman Melville (1819-1891), autor de "Moby Dick", conheceu o lugar navegando pelo mundo aos 25 anos. Seu primeiro romance, "Typee", ambientado nas ilhas Marquesas, foi rejeitado pela editora Harper and Brother com a alegação de que se tratava de uma descrição por demais fantasiosa. Provada a veracidade do texto, a publicação foi aceita por outra companhia e teve sucesso imediato. Seu segundo romance, "Omoo", trata do tumultuado contato entre os polinésios e o homem branco no século 19.
As duas histórias são envolvidas em um tom de apreensão, mantendo sempre a suspeita de que situações e pessoas não são tão pacíficas quanto podem parecer. A capacidade para a violência selvagem está sempre à espreita.
Curiosamente, outro visitante das ilhas escreveria seu livro mais famoso exatamente sobre esse tema. Robert Louis Stevenson (1850-1894), autor de "O Médico e o Monstro", viveu alguns anos nas ilhas Samoa em busca de um clima mais favorável para a cura de sua tuberculose.
O escritor William Somerset Maugham (1874-1965), depois de desistir da vida de jornalista, trabalhou para a inteligência britânica na Rússia durante a revolução de 1917, mas afastou-se da espionagem por causa da saúde frágil.
Realizou então viagens para a Ásia, o México e as ilhas do Pacífico. Seu romance "Um Gosto e Seis Vinténs" retrata a vida de um pintor de nome Charles Strickland, que, rejeitando a forma de vida ocidental, parte para o Taiti. Ali, mesmo acometido pela lepra, que o cega, continua a pintar.
Entre os últimos romances ambientados na Polinésia estão o policial "Stevenson sob as Palmeiras", do argentino Alberto Manguel, e o recém-publicado "O Paraíso na Outra Esquina", no qual Mario Vargas Llosa cruza as histórias da feminista Flora Tristán e de seu neto, o pintor Paul Gauguin. (MARCELO PLIGER)


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