São Paulo, segunda-feira, 28 de fevereiro de 2000


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QUALQUER VIAGEM
Finalmente um carro para a família toda

DAVID DREW ZINGG
em Sampa


 "Nada supera a vaidade de nossa existência exceto a frivolidade de nossas ocupações." - Oliver Goldsmith
Quase fui atropelado na semana passada por um daqueles VUS -veículos utilitários esportivos- que são os brinquedinhos da nova garotada ponto-com que enriqueceu na Internet.
Você sabe do que estou falando, Joãozinho: aqueles veículos que parecem ser frutos do amor de um tanque e um caminhão.
Poderíamos pensar nos VUS como uma espécie de "elo perdido" darwiniano na cadeia evolutiva do transporte 4x4.
Nas revendedoras, são conhecidos como veículos "off-road".
É engraçado, porque praticamente ninguém que eu já tenha visto num deles o dirige realmente fora de alguma estrada.
O VUS típico passa a maior parte de seu tempo sendo levado a shoppings, e não andando no meio do barro -aargh, que coisa nojenta!
Os únicos momentos em que um VUS corre o risco de andar fora da estrada, pelo menos no sudeste urbano da Bananalândia, é quando é estacionado em cima da calçada.
Para a maioria dos compradores de VUS em Sampa, é mais provável que um ambiente de liberdade ao ar livre seja algum simpático café com mesinhas na calçada no Itaim Bibi, e não a floresta amazônica.
Mas não faz mal. Afinal, o importante na vida é a imagem.
Os VUS são enormes, pesados e ostentam janelas por toda a sua extensão, como o convés de vigia de alguma velha máquina voadora zepelim.
Os novos-ricos os estacionam em bandos diante dos pontos de consumo alcoólico preferidos dos VUS, como o Parigi, em São Paulo.
Eles têm nomes como Range Rover -o veículo que inventou a raça horrorosa, nos longínquos idos de 1970- e Jeep Cherokee.
Têm mais ou menos o dobro da altura de um carro comum e, quando entram em choque com seu carro comum, típico de gente pobre, simplesmente passam por cima de você.
O "The Washington Times" diz que esses mastodontes chupam tanta gasolina que, se você for dono de um deles, deveria pedir desculpas ao planeta. O VUS, segundo o jornal, é representativo de um estilo de vida devastador: aço, combustível, poluição, gases causadores do efeito estufa, rodovias asfaltadas e subúrbios espalhados, tudo em excesso.
Nas últimas semanas de 1999, com fanfarra presidencial, a Agência Norte-Americana de Proteção Ambiental estendeu à categoria de "caminhões leves", que abrange a maioria dos VUS, os critérios de emissões de gases da categoria "automóveis".
Mas, por mais que se esforcem, os ativistas verdes não conseguem refrear nossa sede nova-rica de excesso. Quase metade dos veículos novos adquiridos por gringos é de VUS, minivans ou picapes. Apesar de custarem caro no Brasil, cada vez mais eles lotam nossas ruas já engarrafadas.
Quanto mais ricos nos tornamos, mais natureza destruímos.

Motivos bizarros
As pessoas raramente compram carros por razões lógicas e sensatas. O porquê de milhões de compradores se deixarem seduzir por veículos que são oxímoros automobilísticos -afinal, "veículo esportivo de luxo" e "off-roader" são contradições automotivas- é um tema que ainda deixa perplexos os fabricantes mundiais de veículos.
Esses "automóveis" VUS chupam muito combustível, rolam demais nas curvas, são mais lentos e menos confortáveis do que sedãs de preço comparável. Apesar disso, as pessoas os adoram.
A maior fabricante mundial dos elefantes VUS é a Ford.
Outra crítica dos VUS, Susan Ellicott, faz algumas previsões irônicas sobre o que a montadora estaria planejando para os VUS futuros e muito maiores.
Ellicott diz que informações não confirmadas vazadas da indústria automobilística indicam que o Extravagance, versão aperfeiçoada do Exorbitance, ele próprio um "upgrade" do antes popular Explorer, é o precursor de vários modelos utilitários esportivos ainda maiores e mais pesados, cujo lançamento está previsto para os próximos três anos.
Outro que já está nas pranchetas dos projetistas é o Extraneous, um veículo esportivo de 5,8 metros de comprimento que, na realidade, não passa de um Taurus fixado a uma bola de aço de quatro toneladas.
Consta que o Extraneous é extremamente seguro, exceto quando está em movimento.
Ellicott revela ainda outra informação confidencial: que, até o fim de 2001, a empresa pretende lançar o máximo em matéria de modelos VUS, o Excessive.
A julgar pelas informações recebidas, o Excessive pode ter até 12 metros de comprimento e pesar espantosas cinco toneladas.
Destinado ao uso de indivíduos que produzem sêmen em excesso, o veículo poderá acomodar 20 pessoas, em quatro fileiras de assentos. As versões de luxo do Excessive vão incluir amplo espaço de dormitório, uma área de jantar, um espaço para as crianças brincarem e um quartinho de empregada.
Consta que os opcionais extras, que com certeza vão agradar aos frequentadores habituais do Parigi, incluem uma simulação em estilo Imax do salão de corretagem de ações da Bolsa de Valores de Nova York.


Tradução de Clara Allain


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