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DESVELANDO A ANTIGA PÉRSIA
Locais dizem ter 50% das jóias da Terra
Isfahan acredita ser "metade do mundo"
Caio Vilela
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Ponte dos 33 arcos, cartão-postal de Isfahan |
NO IRÃ
A incomparável Isfahan, com
seu charme de velho mundo, resume o esplendor da arte e da arquitetura islâmicas no Irã. Da cozinha de seus restaurantes, escondidos no labiríntico bazar, saem
banquetes aromáticos, servidos
em pequenas mesas ao nível do
chão. Às margens do rio Zayandé,
sombreado por suas pontes de
pedra, os locais passeiam ao pôr-do-sol, antes de encerrar o dia nas
"chaykunés", ou casas de chá, onde jovens, velhos, homens e mulheres reúnem-se todas as noites
para tragar um fumo suave e saborear o chá forte e adocicado.
No coração da cidade, que hoje
povoa o noticiário por abrigar
uma usina nuclear para conversão de urânio, uma das maiores e
mais belas praças do mundo, a
Emam Khomeini, mantém a elegância seiscentista e a vocação para centro de poder e adoração.
Ali, entre duas imponentes
mesquitas e um pequeno palácio,
reúnem-se cordiais vendedores
de tapetes, recitando bordões em
inglês, espanhol ou japonês, universitárias com seu manto negro
cobrindo o jeans e o tênis surrado
e alguns turistas que ainda arriscam uma visita ao país. Pouca
gente diante da grandeza da praça, quase sempre vazia.
Dividem espaço com uma dezena de pequenas carruagens pretas, prontas a percorrer rapidamente o retângulo de 500 metros
por 160 metros da praça, cobrando extorsivos US$ 10. Nas calçadas, crianças arriscam um futebolzinho, aproveitando-se das
antigas marcações, instaladas
quando a cidade ainda era a capital da Pérsia, há quase 300 anos.
Serviam de baliza para as partidas
de pólo que costumavam distrair
a nobreza, instalada no alto do palácio Ali Qapu, de seis andares.
Em um dos cantos da praça, a
sombria entrada da mesquita
Emam, com seu portal de 30 m de
altura emoldurado por dois minaretes ainda mais altos, confere
aos fiéis a certeza de sua pequenez
diante de Alá. Nas paredes e no teto, intricados desenhos em tonalidades de azul confundem-se com
obras-primas da caligrafia persa.
Sob a abóbada principal, a acústica perfeita faz o som ecoar sete vezes, como que para espalhar o texto sagrado por todo o edifício.
Vizinha, a mesquita Sheik Lotfollah reflete-se no espelho-d'água que define o centro da praça.
Famílias inteiras sentam-se no
gramado para saborear um farto e
longo piquenique, enquanto observam os azulejos em mosaico
da abóbada refletirem a luz do sol
de forma mutante, passando de
um laranja rosado a um dourado
intenso, conforme o fim da tarde
se aproxima.
Sons e cores
A tranqüilidade e o silêncio das
mesquitas são perfeitos contrapontos para o burburinho do bazar que ocupa o outro lado da
praça. Milhares de pequenas lojas
estendem-se por quilômetros de
ruelas centenárias, escuras e cobertas. E não é preciso gastar nada
para mergulhar nesses sons e cores, repleta de gente de todos os tipos, comprando e vendendo temperos, artesanato, roupas, acessórios automotivos e qualquer coisa
que caiba na imaginação.
Mais que palco de comércio, o
bazar é uma comunidade vibrante, com mesquitas próprias, banhos públicos e locais de encontro. Uma das saídas, não-sinalizada, é claro, leva à mesquita Jamé,
construída no século 11, mas modificada nos sete séculos seguintes. Conhecida como a enciclopédia da arquitetura islâmica, pela
variedade de estilos, é de uma
simplicidade desconcertante.
Mas Isfahan não se resume à
imensa praça e às mesquitas.
Abriga também belíssimos palácios, com o Chehel Sotun, com
afrescos perfeitamente preservados em suas paredes e teto. Edificado no século 17, ficou conhecido como palácio das 40 colunas,
somando às 20 pilastras que sustentam a entrada do castelo as
mesmas 20 refletidas no lago que
divide ao meio o roseiral.
Também fica na cidade o mais
charmoso hotel do Irã, o Abassi.
Instalado em um antigo ponto de
encontro de caravanas reais no
século 17, ainda mantém seu ar de
nobreza, ainda que um pouco decadente, conforme evidenciam o
velho encanamento e as banheiras descasadas dos apartamentos.
Logo na entrada, o teto do lobby
trabalhado com mosaicos de espelhos e os lustres de cristal inspiram o viajante e despertam a curiosidade dos iranianos comuns,
incapazes de pagar os cerca de
US$ 140 da diária.
O típico café da manhã, com
pão tradicional, queijo feta, mel,
geléia de cenoura e creme de leite,
é servido no restaurante, com paredes cobertas de afrescos em
tons avermelhados. Os quartos
distribuem-se ao redor de um
enorme pátio, com jardins e fontes que conduzem à casa de chá.
Ligando as metades
Outro capítulo se desenrola às
margens do rio Zayandé e nas
pontes quatrocentonas que ligam
os dois lados da cidade. Durante o
dia, o corre-corre das crianças,
carregando seu sorvete de açafrão, e o burburinho dos estudantes ávidos por treinar seu inglês
com qualquer estrangeiro garantem o movimento ininterrupto.
Jovens casais dividem barcos a remo e grupos de amigos cantam e
tocam violão no extenso bulevar
que percorre a margem o rio.
À noite, sob seus arcos dourados, a cidade vibra ao som das
águas, acomodando-se nos estreitos passeios sombrios debaixo
das pontes ou nas casas de chá
instaladas entre seus pilares.
Não é difícil entender por que os
locais, sem modéstia, repetem há
séculos que "Isfahan é metade do
mundo", acreditando estarem ali,
na grandeza da cidade, metade
das maravilhas da Terra. E mesmo para o mais cético dos visitantes, é difícil contestar.
(ALB e CV)
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