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UMA AVENTURA NA ÁFRICA
Safári cobre 200 km do rio Zambeze
Excursão é desafio
contra a correnteza
MARGI MOSS
especial para a Folha
"Se a canoa virar, suba imediatamente para ficar fora do alcance
dos crocodilos." Bebendo chope
na varanda do hotel em Kariba, na
beira do lago, os avisos do guia
Lloyd Shambira soam exagerados.
No dia seguinte, o grupo embarca num jipe e sai arrastando um reboque carregado com as cinco canoas da Shearwater Adventures.
Três horas depois, chegamos a
Chirundu, na beira do rio Zambeze, onde colocamos na água as canoas azuis e carregamos alimentos, sacos de dormir, barracas e
uma mala de primeiros socorros.
Alegres, partimos de Chirundu
debaixo de um sol escaldante. Destino: Kanyemba, 200 quilômetros
rio abaixo. No caminho, nenhuma
cidade nem aldeia, só parques: o
Nacional do Zambeze, na Zâmbia,
e o Mana Pools, em Zimbábue.
O Zambeze, quarto maior rio da
África, nasce no noroeste da Zâmbia e segue um caminho tortuoso
de 2.700 quilômetros até desembocar no Índico, em Moçambique.
Percebendo o clima animado do
grupo, Shambira deu outro alerta.
"É proibido nadar no rio. Não estou brincando. Crocodilo é bicho
perigoso. E mais uma coisa: não
deixem braços ou pernas pendurados na água. São uma tentação."
Mais tarde, vemos nas ribanceiras, aparentemente num sono
profundo, os corpos gigantes desses répteis, únicos parentes dos dinossauros que sobreviveram.
Com a aproximação das canoas,
deslizam para dentro d'água, esperando um bom jantar. Os adultos
alcançam até quatro metros de
comprimento. Matam sua presa
por afogamento, podendo ficar
submersos por até duas horas.
"Outro obstáculo que temos pela frente são os hipopótamos. São
animais territoriais. Portanto é
bom lembrar que ele não ataca,
simplesmente defende. Temos de
evitar cruzar os territórios das famílias de hipopótamos, porque aí
o macho vem derrubar a canoa."
A viagem
A canoa de Shambira, zimbabuano da tribo shona, deve ficar
na frente, e as outras, atrás,
bem-comportadas, para ouvir
seus avisos: "Pedras submersas à
esquerda!" Como ninguém presta
atenção, ele levanta os olhos para o
céu e pergunta: "Por que eu, com
esse bando de brasileiros?"
"Hipos à direita", grita Shambira. À medida que as choupanas
de barro com teto de palha ficam
para trás, a frequência dos encontros com os hipopótamos cresce.
De dia, cochilam no rio para se
proteger do sol. Ao avistar as canoas, soam um alarme indignado,
e, de repente, grande número de
cabeças aparece na superfície.
A qualquer manobra considerada ameaçadora pelo macho dominante, ele não hesitará em partir
para cima de uma canoa. Com
uma mordida, é capaz de quebrá-la ao meio, assim jogando um
petisco aos colegas crocodilos.
Quem pensa que é coisa fácil deslizar 200 quilômetros rio abaixo no
"mighty Zambezi" está enganado. Às vezes, o vento é tão forte
que, depois de remar por duas horas, estamos exaustos.
Diariamente, acordamos às
5h30, desmontamos o acampamento e tomamos um rápido chá
com biscoitos. Em seguida, remamos umas duas horas até ganhar o
café da manhã. O almoço dá direito a uma sesta bem-vinda.
Caímos exaustos na sombra de
uma árvore e dormimos! Um dia,
paramos na sombra de uma acácia, árvore cuja semente é o prato
predileto dos elefantes. E um elefante não demora a aparecer.
Já de longe, impressiona pelo tamanho e pelo poder. Imagine, então, você a pé, sem ter para onde
correr, e ele mastigando sementes
a uns dez metros de distância.
À tarde, acontece a remada mais
prazerosa. Com pouco vento e o
Sol baixo, dando uma luminosidade deslumbrante à paisagem africana, com a bicharada chegando à
beira do rio para beber, parece que
seguimos um rio do Éden.
Repouso
Ao anoitecer, Shambira indica o
lugar para acampar: às vezes, um
banco de areia na margem, às vezes, uma ilha no meio do rio.
Dispensamos o uso das barracas,
preferindo dormir à luz das estrelas, protegidos pelos mosquiteiros
armados sobre o remo. Assim conseguimos ouvir melhor os sons da
noite africana -os rugidos dos
leões, os gemidos das hienas. Aos
poucos, os hipopótamos, vegetarianos, saem da água para pastar.
A regra de ouro: não passe entre
um hipopótamo e o rio. Se você assustar o animal, ele vai passar por
cima de você para chegar às pressas de volta à água.
A força do rio
No quarto dia, entrosados no ritmo das remadas, resolvemos preparar os sanduíches do almoço na
hora do café da manhã.
E lá vamos nós. Então, aparecem
umas corredeirinhas. Em torno
delas, a força do "mighty Zambezi". Numa manobra, a canoa de
Gérard e do amigo Bernie é jogada
contra um tronco de árvore e vira.
Os dois somem no casco da canoa emborcada. Passa uma eternidade até que, de repente, aparece
um braço, outro braço e, no final,
duas cabecinhas ainda de chapéu.
Lutam contra a árvore, a canoa e
a correnteza. Enfim, conseguem
liberar a canoa da árvore, para, logo em seguida, ser levados pela
correnteza agarrados a ela. Também para água abaixo, vão os conselhos do Shambira: "Subam na
canoa e esperem ajuda".
Gérard e Bernie continuam dentro d'água, lutando para acertar a
canoa que revira cheia d'água. Enquanto isso, a correnteza vai levando-os rio abaixo.
Depois, ainda dentro d'água, começam a tentar esvaziá-la. Com a
ajuda de cordas atadas a duas outras canoas e muito esforço nos remos, conseguimos arrastar a canoa cheia d'água até a margem.
Para alívio de Shambira, daí em
diante, o grupo fica bem-comportado. O Zambeze vai se estreitando
e ficando mais profundo.
Estamos nos aproximando dos
22 quilômetros da garganta de
Mupata. Em cada lado surgem paredões de pedra. É uma paisagem
surpreendente, onde crescem
muitas árvores baobás, que podem ter até 4.000 anos de idade.
Saindo da garganta, falta um dia
para chegar a Kanyemba, na fronteira com Moçambique. Depois de
oito dias longe da "civilização",
num calor chocante e sem bebida
gelada, sonhamos com um bar.
Subimos a ribanceira e demos
com umas casas cujas janelas quebradas batem no ritmo da brisa. É
uma cidade fantasma, abandonada. Só de volta a Kariba é que pudemos matar a sede de verdade.
Informações: Shearwater Adventures,
Harare, Zimbábue, fax local: (263-4)
75-7836. No Brasil, a Queensberry tem pacotes ao Zimbábue: (011) 255-0211
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