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CRÍTICA
FG não é FHC
LUIZ CAVERSAN
A CENA até que era fraca: pouco mais que uma
dúzia de manifestantes carregando faixas, punhos cerrados, expressões de indignação. O que
chamou a atenção mesmo foram os gritos, a palavra de ordem: "Abaixo FHC! Abaixo FHC!".
Abaixo FHC?
Ainda que distraído com a leitura de um jornal, sabia
que o aparelho estava sintonizado na Globo, e, logo, soou
estranha toda aquela explicitude antigovernista.
Mas a confusão mental durou apenas alguns segundos e
se desfez com o surgimento dos rostos de
atores conhecidos, como Paloma Duarte
e Kadu Moliterno.
Não, não era o "Jornal Nacional" num
arroubo de pluralismo democrático,
dando voz e vida aos descontentes, àqueles que são contra, ou do contra.
Tratava-se da novela que havia começado e os gritos eram, na verdade, "Abaixo FG! Abaixo FG".
FG é Félix Guerreiro, o prefeito mau-caráter, corrupto e sacana de "Porto dos
Milagres", cidade fictícia que dá nome à
principal trama global atualmente no ar.
Em seguida à cena da passeata, o personagem, vivido por Antônio Fagundes,
demonstra toda a sua malignidade: tenta
um truque, socorrendo uma moça
adoentada, tem um ataque de raiva e
promete esmigalhar seu principal desafeto. Segue adiante em sua performance
de político bandido, manipulando manifestantes, enganando jornalistas, apoiado pelo um filho
bobão, pela mulher interesseira e pelo capanga violento.
Ou seja, pondo em prática na ficção aquilo que ocorre
com uma frequência revoltante na política nacional.
Não deixa de ser didático: a telenovela cumprindo um
papel precípuo do jornalismo, obviamente no terreno da
fantasia, mas demonstrando como é que se dá o jogo do
poder no mundo da política mesquinha e rastaquera.
Aliás, esse tem sido um dos raros predicados nessa novela das oito: mostrar o mundo da política real via personagens fictícios. Pouco tempo atrás, em plena temporada
de cassação de senadores, Lima Duarte viveu um parlamentar pilantra que acabou se dando muito mal nas
mãos do escroque Guerreiro.
No mais, a novela, na qual outra vez impera aquele insuportável sotaque pseudobaiano, vai bem pouco além
do drama da mocinha loira e rica que se apaixona pelo
pescador moreno e pobre. Originalíssimo, não?
Desde que o TV Folha publicou uma reportagem apontando alguns erros no concurso televisivo "Show do Milhão", tenho ouvido as mais variadas manifestações a respeito do programa, Ora é alguém dizendo que também
detectou um erro, ora é um colega comentando uma pergunta que foi levada ao ar. O fato é que o programa de Silvio Santos mobiliza as pessoas, atrai a atenção de gente
das mais variadas camadas sociais, tendências políticas,
sociológicas ou estilísticas.
Religiosas também: para esclarecer uma dúvida relativa
a uma pergunta de cunho eclesiástico, o repórter do caderno recorreu às autoridades da Igreja no Brasil. Não teve problemas, porque o bispo que o atendeu era telespectador do programa.
Ou seja, um almanaque de cultura
inútil ("Qual a cor do topázio?") é capaz de conseguir a façanha de liderar a
audiência da segunda rede de TV do
país. Menos mau. Poderia ser mais
uma reprise de "Rambo" ou uma hora
a mais de "Programa do Ratinho",
com suas aberrações. Preferível acompanhar alguém respondendo que lusitano se refere a alguma coisa de Portugal, ainda que, no programa, o nome
do país tenha sido grafado Portugual...
Por isso creio que o SBT deveria se
levar mais a sério, o programa poderia
ser mais bem cuidado, e não simplesmente sustentar as respostas das perguntas que vão ao ar em uma enciclopédia, que, como já foi demonstrado,
traz erros ou permite interpretações
diversas.
Ou, quem sabe, é justamente no fato
de conter incorreções, estimular a polêmica que se encontra a fórmula do sucesso?
Por falar em sucesso: não há quem não fique enternecido com o comercial da rede de lanchonetes McDonald's,
em que o personagem é um bebezinho sobrancelhudo,
ruivo e com carinha de filho do Russel Crowe.
Tecnicamente, o comercial é de uma simplicidade só: a
câmera não abandona o rosto do garoto, captando suas
expressões em sintonia com a locução de fundo. A marca
do produto anunciado praticamente não aparece, surge
em relances. Mas chega lá, ou seja, você fica sabendo do
que se trata.
Exploração comercial da imagem infantil? Que seja. Pelo menos temos aqui uma demonstração de que é possível exercitar o bom gosto na TV comercial. Em tempo: o
garotinho tem oito meses de idade e a agência que produziu o anúncio é a Taterka.
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