São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 1998.



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PESQUISA
Maioria das pessoas muda de canal por causa do desinteresse pela programação da televisão
Anúncios 'seguram' o telespectador

CRISTIANA COUTO
da Reportagem Local

A maioria dos telespectadores troca mais vezes de canal durante a programação do que nos intervalos comerciais. Esse é uma das conclusões da pesquisa Mediacross, feita pelo Datafolha e pela agência J.W. Thompson com 3.210 telespectadores paulistanos. De acordo com a pesquisa, 53,5% dos telespectadores das classes A, B e C, entre 10 e 55 anos, mudam constantemente de canal. Do total da amostra, 31,9% mudam de canal por desinteresse pelo programa, contra 23% que mudam de canal durante os intervalos comerciais. "A pesquisa mostra que o principal motivo de mudança de canal é a insatisfação com a programação, maior do que o descontentamento com os comerciais", diz Cláudia Rezende, 48, vice-presidente de planejamento e pesquisa da J.W. Thompson. Mas afinal, quem são os diretores que estão por trás dos comerciais, capazes de fazer com que o público comente e se lembre do "meu primeiro sutiã" da Valisere, dos "550 quilômetros" da Varig, ou o do sabonete Palmolive usado por Antonio Banderas? A Folha conversou com três premiados diretores "especialistas" em comerciais: João Daniel Tikhomiroff, 47, da Jodaf, especialista na direção de atores, Julio Xavier, 57, da Julio Xavier Filmes, que tem 60% de seus filmes feitos com crianças e animais, e Rodolfo Vanni, 53, da Cia de Cinema, o "rei do humor". Para todos eles, o que faz um bom comercial é uma boa idéia.

Folha - Como você vê o resultado da pesquisa?
Julio Xavier -
Acho que a pesquisa revela que os comerciais estão empatados com a ruindade da programação. A briga pelo Ibope baixou o nível de tudo.
Rodolfo Vanni - A TV está dirigida ao grande consumidor, e a programação está mais vulgar, cheia de sangue e violência. Talvez por isso as pessoas troquem tanto de canal e o comercial disperse menos.
João Daniel Tikhomiroff - É um sinal de que a propaganda é criativa, e que é um fenômeno brasileiro as pessoas se atraírem pelos comerciais. Se a propaganda é atraente, elas tendem a ficar no canal e a discutir os comerciais na mesa de bar. Alguns publicitários são até mais conhecidos do que atores de novelas.
Folha - E a produção de comerciais hoje?
Xavier -
90% do que se faz no Brasil e no mundo é lixo, tanto em termos de programa quanto de comerciais. Com o efeito "zapping" que surgiu nos últimos anos, foi preciso um gancho redobrado para seduzir o espectador. Nos EUA, isso fez com que se aumentasse a sofisticação dos comerciais e se utilizassem astros, para competir com a grandiosidade da programação.
Vanni - O Brasil está se estruturando com o Plano Real. Hoje se dá mais valor ao dinheiro e as pessoas são mais pão-duras. O acesso à TV paga sofisticou o gosto de telespectador.
Tikhomiroff - Ela é mais contemporânea, graças à revolução tecnológica, que permitiu a resolução de situações na pós-produção, ou seja, hoje usa-se a evolução da tecnologia a serviço de uma idéia.
Folha - Qual o segredo para dirigir crianças?
Xavier -
Primeiro você tem de achar o geniozinho. Fazemos, em média, 300 testes até achá-lo, sem que mães estejam no estúdio, o que leva de 3 a 4 dias, usando de 15 a 20 minutos de filme por teste. Depois, temos de ter muita paciência. Não se pode inibir a criança, vamos atrás de seu instinto lúdico, brincar com ela, fazer filmagens de brincadeira, estimular a competição entre elas com bebês, temos de se achar 4 ou 5 parecidos para gravar o mesmo comercial, pois nunca usamos um só. No comercial do papel higiênico Personal, por exemplo, usamos um casal de gêmeos e seis dublês para fazerem as cenas de costas, de detalhes etc. Foram necessários 5 dias de filmagens, e tivemos até que parar a avenida Paulista por duas horas.
Folha - E o segredo para um comercial com humor?
Vanni -
Primeiro é a escolha dos atores. Depois, ele deve ter um bom começo, a imagem certa. Depois, algo memorável no meio do filme e um bom desfecho. O comercial deve ter um grande momento, uma sutileza, que eu chamo de "anjo". Por exemplo, num dos comerciais do casamento da Prosdócimo e da Electrolux, o "anjo" é o velhinho tremendo ao segurar a xícara. Hoje falta ironia nos comerciais, o humor judaico desapareceu e ficou o pastelão. O humor deve ser sutil e agudo.
Folha - Por fim, qual a receita para dirigir atores?
Tikhomiroff -
Saber pedir o que o ator quer é o mais importante. Todo o ator é inseguro por natureza, e o diretor tem de ser um psicólogo, dar segurança a ele. Por exemplo, o ator tem de saber porque o diretor está rodando o comercial de novo e o diretor tem de sentir se o ator vestiu o personagem. Quando dirijo crianças, crio um clima descontraído, de brincadeira. Dirigir um ator e operar a câmera ao mesmo tempo, o que não é comum, faz com que eu sinta melhor a interpretação. Depois, o diretor tem que saber contar uma história.



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