São Paulo, Domingo, 14 de Março de 1999
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CAPA
Glauber Rocha, que hoje completaria 60 anos, é homenageado pela TV em documentários e ciclos que, juntos, somam mais de 15 horas
Tela em transe

Abril Imagem
O cineasta Glauber Rocha, em foto de 1980, posa à frente de cartaz do filme "A Idade da Terra", do mesmo ano


PAULO SANTOS LIMA
free-lance para a Folha

Esteta da fome, revolucionário, um dos fundadores do cinema novo, contundente e idealista. Qualquer um desses rótulos aplicados ao cineasta brasileiro Glauber Rocha ganha espaço até abril na televisão em ciclos de filmes, documentários e programas especiais que somam 15 horas no ar.
O que faz Glauber Rocha (1939-1981) aparecer mais horas em menos de um mês do que nos últimos dois anos é que hoje ele completaria 60 anos, fato comemorado pela TV Cultura e pelo Canal Brasil (Net e Sky).
O canal pago promete as cinco maiores obras do diretor baiano, começando por seu primeiro longa-metragem, "Barravento" (60), hoje às 23h (veja quadro ao lado). O sincretismo religioso e a militância política são os temas desse filme, que tem o ator Antônio Pitanga entre os protagonistas.
Antes da exibição, um documentário produzido pelo próprio Canal Brasil mostra cenas inéditas tiradas do acervo da mãe do cineasta, Lúcia Rocha, e depoimentos de contemporâneos, como o produtor Luiz Carlos Barreto (que trabalhou com Glauber em "Terra em Transe", de 67, e "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro", de 69).
No próximo domingo, o canal exibe "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (64), seu filme mais elogiado. Inspirado pelas dimensões épicas do western de John Ford, o diretor mostra um homem (Geraldo Del Rey) que se rebela contra o patrão, cai no fanatismo de um grupo místico e termina conhecendo Corisco (Othon Bastos) e o que restou do bando de Lampião.
O matador de cangaceiros Antônio das Mortes (Maurício do Valle), presente nesse épico revolucionário, reaparece em "O Dragão", que rendeu a Glauber o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes de 1969.
O polêmico "Terra em Transe", com Jardel Filho, faz uma alegoria do país sem poupar a Igreja, intelectuais, direitistas e esquerdistas, com uma contundência que incomodou até seus amigos mais próximos. O filme seria ainda um dos deflagradores do movimento tropicalista.
"A Idade da Terra" (80) foi seu último filme antes de morrer prematuramente, em 1981. A terra, no caso, não é o mundo rural de "Deus e o Diabo..." nem o urbano de "Terra em Transe", mas sim o global, com seus contrastes.

Documentários
A TV Cultura apresenta hoje, às 21h, "Que Viva Glauber!", documentário de Aurélio Michiles que conta a vida do cineasta.
O "Metrópolis", amanhã, resgata imagens do diretor na seção "Achados e Perdidos". Mais tarde, é a vez do "Roda Viva" entrevistar Nelson Pereira dos Santos, seu contemporâneo no cinema novo, diretor de "Vidas Secas".
Na terça, o "Zoom" exibe o primeiro filme do diretor, "O Pátio" (59), em que ele já esboçava o rompimento com a narrativa convencional. "À Meia-Noite com Glauber" é o curta de Ivan Cardoso, também mostrado no programa, que divide espaço com cenas inéditas, depoimentos e trechos de Glauber no programa "Abertura", da extinta TV Tupi.
O "Cine Brasil", na sexta, não exibe propriamente uma direção de Glauber, mas o trabalho de seus colegas, todos exilados na Europa, fazendo parte do Grupo Glauber Rocha, encabeçado pelo próprio cineasta.
"O Rei do Milagre", dirigido por Joel Barcellos e outros, produzido pela rede de TV italiana RAI e rodado nas praias brasileiras em 1971, fala sobre um pescador que, após um milagre, é procurado para salvar a filha do governador. Quem é o governador? Glauber Rocha, numa raríssima aparição como ator.
O músico Gato Barbieri também se faz de ator nesse filme. Barbieri assinaria mais tarde a trilha de "O Último Tango em Paris", de Bertolucci. "Tango", aliás, mereceu comentários de Glauber em carta que escreveu ao jornalista Zuenir Ventura, dizendo que o filme, apesar de ser bem dirigido, era um "superproduto luxuoso da cultura burguesa pós Viet-Nam".


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