São Paulo, domingo, 14 de maio de 2000


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ENTREVISTA

Para diretor da Record, tirar programa do ar é "natural"

ANNA LEE
COLUNISTA DA FOLHA

O DIRETOR de programação da Record, Marcus Aragão, 37, prefere hoje ser chamado apenas pelo nome, sem o título de pastor, como uma forma de desvincular sua função na emissora de Edir Macedo de sua vida religiosa. No entanto, não esconde que foi graças à Igreja Universal que deixou as drogas.
Aragão, que foi DJ, contou à Folha como chegou à Record e os planos que tem para a emissora.

O fato de o sr. ter assumido a direção de programação da Record é um indício de que o projeto de desvincular a emissora da Igreja Universal não existe mais?
A Record tem uma meta de ser comercial e competir no mercado. Senão não valeriam a pena todos os investimentos que estão sendo feitos. Pretendemos disputar a liderança e não a vice-liderança. Nos últimos três anos, só em equipamentos foram mais de US$ 50 milhões.
Qual a interferência que a igreja tem na programação da Record? Já aconteceram alguns episódios, como no Revéillon, quando a programação do consórcio com TVs estrangeiras foi derrubada para ser exibido um culto.
Não é bem assim. Se fosse, não haveria no "Note & Anote" um comercial de um forno de microondas em que aparece um diabinho sendo tostado. O evento do Revéillon estava disponível, mas, quando percebemos que teríamos problemas de satélite, decidimos devolver o horário da madrugada para a igreja, que paga por isso.
Mas se o bispo Macedo, da Igreja Universal, é acionista majoritário da Record, é tirar de um bolso e pôr no outro.
Muitas empresas fazem isso.
Como o sr. chegou à direção de programação?
Passei por todas as áreas da empresa. Isso me deu uma certa experiência. Uma pessoa de fora ia assumir, mas tive respaldo dos diretores da casa.
O sr. sempre foi evangélico? O que o sr. fazia antes de entrar para a igreja e para a Record?
Parte da minha família era espírita e parte católica. Nasci em Belém. Meu pai tinha uma empresa exportadora e importadora de madeiras, ao lado de uma boate. Ele frequentava o lugar e me levava, quando eu tinha 9 anos. Eu ficava fascinado com aquele mundo de luz, cor e som. Pedi um som para o meu pai e comecei a gravar músicas e vender fitas cassetes, depois comecei a tocar em discotecas. Cheguei a trabalhar na New York City, Hippopotamus e Papagaio, no Rio. Depois fui trabalhar em rádio. Ainda estudei arquitetura e economia. Como DJ, vivi na noite e não consegui me isolar do que acontece nesse ambiente. Há facilidade de beber, fumar, se prostituir. Não dá para fugir. Então era natural que, trabalhando na noite, eu fumasse cigarro, maconha, o que pintava.
Como o sr. entrou para a Universal?
Em 91, eu fiquei muito doente. Ninguém sabia o que eu tinha. Disseram até que era Aids. Eu sentia que estava morrendo. Naquele momento de agonia, num programa da Igreja Universal, vi um pastor que fazia uma oração com um copo com água. Isso me deu um pouco mais de fôlego de vida. É por isso que defendo que a programação da igreja não saia da madrugada, traz apoio para pessoas aflitas. Eu me lembro da minha mãe ajoelhada ao lado da minha cama gritando pelo nome de Jesus. Foi quando uma enfermeira nos falou sobre um médico da Aeronáutica especialista em doenças pouco conhecidas. Fui me tratar com ele e me restabeleci. Tive a certeza de que tinha de procurar Jesus. Um dia me encontrei na frente da Igreja Universal. Assisti ao culto e vi que todas as fantasias que estavam na minha cabeça contra a igreja eram absurdas.
O que seriam essas fantasias absurdas?
Aquela idéia de que a igreja pede muito, que pastor é ladrão. Não pede nada, está tudo escrito na Bíblia. Deus age na vida de cada um de acordo com sua necessidade. Quando a pessoa entra na igreja, se torna membro, mas, se quiser, pode ser obreiro. Eu e a minha esposa quisemos. Um dia fui convidado para ser auxiliar de pastor. Depois de ver tantos milagres, tive a certeza de que era um convite do próprio Deus.
Como o sr. entrou para a Record?
Em 95, houve a oportunidade da compra de uma emissora em Belém, então, pela graça de Deus, fui o responsável por essa transação e pela implantação do canal. Depois fui mandado ao Rio, e, de lá, para São Paulo.
O sr. tem sido criticado pelas frequentes mudanças que tem feito na grade da Record. Dos novos programas lançados no começo do ano nenhum está mais no ar...
A Record tem alguns horários a serem preenchidos. Como o sábado pela manhã e à noite e parte do domingo. Estamos procurando programas novos e vamos continuar tentando. Se um programa não tem a resposta esperada, é natural tirá-lo do ar ou reformulá-lo. Somos a terceira emissora do país. Então tenho que me mexer mais rápido do que o SBT e a Globo. O "Rodeio Mania" e o "Ed Banana" estão sendo reformulados, o "Ação Ecológica" não vai voltar. Estamos procurando um espaço para o "Caminhos da Pesca". Quanto ao "Miguelito", pedimos apenas um piloto, só que os produtores fizeram alguns episódios, mas não temos interesse. Quando esses programas foram pensados, não existia pesquisa na Record. Hoje eu sei que o nosso telespectador exige um padrão de qualidade, mas com uma pitada de Silvio Santos. A diferença é que querem ao vivo, olho no olho. Somos bons nisso, e tem funcionado muito no jornalismo. Eu sei que os caras da Globo ficam loucos. Como a programação da Record é ao vivo, dou a notícia na hora em que acontece. A Globo tem dificuldade porque se engessa com programas gravados.
O sr. foi convidado para conhecer o Projac?
Logo que eu assumi, o André Dias (diretor de contratos artísticos) me ligou. Depois veio aqui, e a amizade cresceu. Agora me convidou para ir ao Rio. Na próxima quinta acho que estarei lá. Tenho que retribuir.



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