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SOM NA CAIXA
"Música na Rua" e "Ensaio Geral" revelam talentos, recebem veteranos e recuperam a história musical e da TV
MPB ganha espaço na programação
FÁTIMA GIGLIOTTI
DA REDAÇÃO
RODRIGO DIONISIO
REPÓRTER DA FOLHA ONLINE
O FESTIVAL da Música Brasileira -previsto para ir
ao ar ontem, na Globo, com a primeira das quatro eliminatórias- chamou a atenção para a histórica e fecunda
relação entre a TV e a Música Popular Brasileira, que jamais
viveu apenas dos festivais. Dois novos programas, "Música
na Rua", exibido pelo canal 21, e "Ensaio Geral", no Multishow, entraram recentemente no ar para a prova dos nove.
"Vamos fazer 60 shows até o final do ano com o "Música
na Rua", prosseguindo com uma linha de trabalho que consiste em arrumar espaço alternativo para novos músicos",
diz João Marcello Bôscoli, diretor da gravadora Trama, co-produtora, com o Canal 21, do novo programa semanal,
exibido ao vivo aos sábados, das 20h às 22h.
Nos seis programas pilotos do "Música na Rua", a atração
conquistou dois pontos de audiência. O formato é original,
para programas de televisão: montado num gigantesco caminhão, um palco móvel com telão e a mesma equipe técnica do Free Jazz Festival -"para garantir a qualidade do
som"- leva shows de novos talentos e artistas consagrados
para a periferia de São Paulo, universidades e cidades do interior. Nos intervalos e nas trocas dos músicos, Kid Vinil e
Sandro revezam-se nas entrevistas e na apresentação dos
artistas para quem está em casa e para o público que acompanha a apresentação, via telão.
"Já fizemos shows com o Zona Proibida (rap), o Ram
Science (tecno) e o Tom Zé, em Carapicuíba, ", diz Bôscoli,
que deve começar a gravar em agosto, para o Multishow, a
segunda série do "Música Brasileira", programa semanal
que foi ao ar em 99 pelo canal de TV paga e atualmente é um
dos dez mais requisitados para reprise pelos assinantes do
Multishow. Esse canal também exibe, desde junho, o "Ensaio Geral", apresentado por Lorena Calábria.
"Desde cedo, há três anos, detectamos no Multishow a carência de MPB na TV por assinatura. Mas, como esse universo era voltado para a programação, principalmente estrangeira, não havia a tradição de produção de programas",
afirma Wilson Cunha, diretor do canal. Com parcerias na
produção de shows para serem televisionados, foi-se desenvolvendo uma estratégia que culminou com o "Música
Brasileira" e, agora, com o "Ensaio Geral". "O "Música Brasileira" vinha de encontro a essa necessidade de produção
própria, para lançar gente nova, da MPB. E o "Ensaio Geral"
é uma grande revista musical sobre MPB", diz Cunha.
Exibido às quartas, às 21h30, o "Ensaio Geral" tem sempre um músico convidado. Tudo é permeado com clipes,
trechos de shows, MPB nas trilhas sonoras e uma geral no
que está sendo lançado no cenário nacional, com entrevistas dos artistas, comentários e apresentação dos trabalhos.
E a apresentadora Lorena Calábria, também roteirista do
programa, tem o cuidado de relacionar as atrações com a
história da MPB, inclusive utilizando imagens de arquivo e
videoclipes. Com isso, ao mesmo tempo em que registra o
presente, recupera o passado musical do país e da TV.
Foi assim que, no programa em que Lobão era o convidado, Lorena lembrou o músico Júlio Barroso, morto em
1984, e exibiu um número com a sua banda Gang 90 e As
Absurdetes. Jackson do Pandeiro foi lembrado a partir do
trabalho de Lenine e Fernanda Abreu.
Outro programa musical que invoca o
passado é o "Musikaos", da Cultura,
desde fevereiro exibido aos sábados.
Apresentado por Gastão, foi inspirado
na fórmula do histórico "Fábrica do
Som", exibido entre 83 e 84, auge do movimento pop-rock nacional. É gravado
no mesmo Sesc-Pompéia, em São Paulo,
tem a direção do mesmo Pedro Vieira e
apresenta ao vivo números de novas
bandas, selecionadas pelo músico Clemente, da banda paulistana Inocentes.
Essa onda da MPB nas TVs não é novidade, apenas dá continuidade a um casamento que já passou das bodas de prata. No final dos anos 60, foram os festivais, exibidos ao vivo e realizados nos
"teatros" das emissoras, que revelaram
Chico, Caetano, Gil, Elis, Benjor etc.
Mas foram programas como "O Fino
da Bossa" (1965), "Divino Maravilhoso"
(1968) e "Jovem Guarda" (1965) que garantiram a presença da MPB na TV. Nos
anos 70, "MPB Especial" (1972) e "Vox
Populi" (1977) desempenharam papel
semelhante. No início dos anos 80, foi o
"Fábrica do Som" que promoveu a reforma da MPB, abrindo espaço para
bandas como Legião Urbana, Barão
Vermelho, Titãs, Capital Inicial, Paralamas do Sucesso. Foi por meio da TV que
essa trupe consolidou o rock nacional,
muito antes de a MTV importar o modelo americano de canal musical.
Sinal dos tempos, a indústria fonográfica cresceu no Brasil nos 90, mas foi por meio da
TV que a renovação aconteceu, dessa vez por
meio do "Cia. da Música", exibido pela CNT entre 94 e 95. Sim, havia o "Som Brasil", da Globo,
mas relegado a horários e alcance menores.
Mas, de uma forma ou de outra, o "Cia.", capitaneado também por João Marcello Bôscoli, deu
a primeira cara para o que seriam os programas
musicais de TV nos anos 90. Transformando a
sigla MPB em "Música Pop do Brasil", o programa abraçava todas as praias sonoras.
Apresentou Lenine e Suzano, na época desconhecidos, com o disco "Olho de Peixe", trouxe
pela primeira vez para as "câmeras comerciais"
o grupo Racionais MCs, na época de "Raio X
Brasil", virou programa de rádio, CD e serviu de
tubo de ensaio para gente boa, como os irmãos
Max de Castro e Wilson Simoninha.
Na década de "movimentações" -e não movimentos-, o "Cia. da Música" foi a primeira
prova de que era possível fazer música na TV comercial, ao vivo (tudo era "playback" na época),
sem restrições de gênero, estilo ou vendagem de
discos. Qualquer semelhança com o que vem
sendo reproduzido nos mais novos programas
musicais da televisão não é mera coincidência.
E, claro, correndo por fora, há o "Ensaio", de
Fernando Faro, na TV Cultura, hoje tão histórico como a própria MPB.
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