São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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"Em cada país as pessoas vêem a saga de um jeito'

de Berkeley

Jeff Greenwald pode se tornar um dos próximos roteiristas de "Voyager". Brannon Braga, o novo produtor executivo da série, pediu que apresentasse algumas idéias para um episódio. Greenwald, que disse que gostaria de ter incluído um encontro com trekkers brasileiros, "mas viajar para a América do Sul ia ficar muito caro", recebeu a Folha em um café próximo a sua casa em Oakland, Califórnia. Leia a seguir trechos da conversa.

Folha - Segundo seu livro, "Jornada nas Estrelas" é uma "mitologia global". Como uma mitologia pode nascer da indústria de entretenimento?
Jeff Greenwald
- Há elementos sagrados nas mitologias, mas elas também significam entretenimento, e entretenimento muito bom, uma vez que elas oferecem um modelo moral. Não me surpreende, portanto. O que torna "Jornada nas Estrelas" diferente de outras mitologias é o fato de ela ser uma mitologia do futuro. Você pega a tecnologia e as idéias básicas que estão sendo desenvolvidas hoje e projeta essas idéias três, cinco séculos no futuro, em seu melhor desenvolvimento hipotético, ou seja, o melhor uso da tecnologia e da diplomacia, a aldeia global no melhor sentido.
Folha - O que essa nova mitologia diz a respeito da cultura contemporânea?
Greenwald
- "Jornada nas Estrelas" é um ciclo de histórias que cobre 32 anos de história americana contemporânea. A série original era uma espécie de Camelot espacial, era um produto da era Kennedy e da Guerra Fria. Os vilões eram os klingons, que foram inspirados na imagem que tínhamos dos russos. Havia uma mulher negra na ponte de comando da primeira Enterprise, o que era uma tremenda ruptura para uma sociedade que ainda não havia aprendido a aceitar negros numa posição de igualdade com os brancos. "A Nova Geração" reflete os EUA nos anos 80: há uma terapeuta na ponte de comando! Em "Voyager", você tem um comandante feminino, em "Deep Space Nine", você tem uma série de conflitos políticos...
Folha - Você acha que há algum outro programa na TV que possa ter o mesmo impacto de "Jornada"? "Arquivo X" chegará lá?
Greenwald
- "Jornada nas Estrelas" e "Arquivo X" são ambos seriados sobre fé, de certa forma. "Arquivo X" é baseado na crença de que as coisas são realmente ruins no mundo lá fora, que não há cinismo que chegue... "Jornada nas Estrelas" é sobre o tipo oposto de fé, é basicamente otimista. Não acho que "Arquivo X" vá chegar perto do impacto de "Jornada nas Estrelas".
Folha - Como "Jornada nas Estrelas" tornou-se um fenômeno global?
Greenwald
- O que eu aprendi viajando pelo mundo conversando com trekkers em diferentes países é que "Jornada nas Estrelas" é como aquela fábula dos homens cegos que encontram um elefante e cada um descreve o animal baseado na parte do elefante que está tocando. Ou seja, em cada cultura as pessoas adotaram "Jornada nas Estrelas" de acordo com suas esperanças e pensamentos. Na Alemanha, "Star Trek" é uma forma das pessoas dramatizarem suas tendências militaristas guerreiras, colocando-as num contexto positivo, divertido. No Japão, as pessoas ficam extremamente atraídas pela hierarquia do comando da Enterprise e fascinadas por Data, o andróide que quer se tornar humano de "A Nova Geração", porque eles vêem isso como uma metáfora da sociedade japonesa emergindo para o mundo. No norte da Índia, no Tibete, monges budistas assistem "Star Trek" porque eles vêem um reflexo de sua mitologia do shambala, o futuro paraíso terreno.



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