Acostumados a frequentar o Morro do Capim desde criança, os estudantes Maurício Junior, 19, e Adilon Moreira, 18, observavam com curiosidade o que se transformou no Parque Radical, do Complexo Olímpico de Deodoro, bairro onde os dois nasceram e vivem até hoje. "Era só mato", conta Maurício.
Os esportes mais disputados até a Prefeitura do Rio começar as obras na região eram empinar pipa e banho de cano furado. A água formava uma lagoa e os meninos se revezavam entre a rabiola e os mergulhos na piscina improvisada. Quando chovia, outra modalidade conquistava adeptos, esqui no barro. Com um pedaço de papelão, a diversão era deslizar ladeira abaixo no piso escorregadio.
Nem a "lagoa do coronel" escapava às investidas da molecada de Deodoro, que fica em zona militar. É proibido entrar, tem "até jacaré". Às vezes, aparecia soldado e eles tinham que sair correndo, mas quem duvida que por isso mesmo era mais divertido?
Em dezembro, quando o Parque Radical foi inaugurado, os amigos se tornaram frequentadores assíduos. "Nunca imaginei que um lugar abandonado como aquele poderia passar por essa transformação. Mas com a chegada da Olimpíada ficamos sem diversão", diz Maurício.
PÉ DE JACA
Ele e Adilon cresceram juntos nas ruas do bairro e não tinham planos de ver nenhuma competição na Rio - 2016. O preço dos ingressos foi o maior impeditivo, mas a falta de afinidade com os esportes praticados a poucos metros de casa também não os animou. A convite da Folha, os dois foram ao Parque Radical para acompanhar as semi-finais e finais da canoagem, esporte que eles não conheciam nem pela TV.
Adilon aponta um pé de jaca que abastecia os frequentadores do Morro do Capim. Muito mais saudável e mais em conta do que os preços praticados na Rio - 2016. Não precisou ser especialista em leitura labial para entender o palavrão que saiu em silêncio da boca de um incrédulo Maurício, quando viu a tabela de alimentos e bebidas. "Dez reais uma Coca de 600 ml. Pago R$ 8 em uma garrafa de 2,5 litros."
7 A 1 ATÉ NA CANOAGEM
Sem entender as regras no início, os dois não desgrudavam os olhos dos caiaques descendo as corredeiras. Em poucos minutos começaram a palpitar sobre os competidores. "Achava um esporte sem graça, mas está dando frio na barriga. Sofri com os alemães na frente. É sete a um até na canoagem", brincou Mauricio ao ver os brasileiros Charles Correa e Anderson Oliveira fora da final.
"Aqui você sente a vibração da torcida. Imagino que esgrima e tiro com arco sejam legais ao vivo", analisou Adilon, que se animou a fazer aulas de slalom, se tiver cursos no Parque. "Acho que em dois meses eu conseguiria descer sem o barco virar."
Para os dois é uma pena que o pessoal de Deodoro não veja como tudo ficou bonito. "É um privilégio estar aqui. Espero que depois, todos possam usufruir de um espaço tão legal como estamos vendo", disse Maurício.