Segredos
do Poder
"Podemos usá-lo aí para isso", diz
Resende
25/05/1999
Editoria: BRASIL
Página: 1-10
Estimulado pelo ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, André Lara
Resende liga para o presidente Fernando Henrique Cardoso na véspera
do leilão da Telebrás. Havia indicações da existência desse diálogo.
Mas o seu conteúdo continuava inédito até hoje.
Na primeira tentativa, André é informado pelo Planalto de que FHC
estava almoçando com convidados. Depois do almoço, os dois conversam.
O presidente autoriza explicitamente a utilização de seu nome para
pressionar a Previ a entrar no consórcio formado pelo Banco Opportunity
e a empresa Stet, do grupo Telecom Itália. André se refere, equivocadamente,
à Tele Norte Leste como "Tele Norte Nordeste". O presidente do BNDES
também erra o número de teles que comporiam a nova empresa: diz
que são 13, quando na realidade eram 16.
O presidente concorda com André sobre a inconveniência de Carlos
Jereissati ganhar a Tele Norte Leste (o que aconteceu). Na conversa,
FHC diz que Jereissati representa "aventurismo".
Fernando Henrique Cardoso - Alô?
André Lara Resende - Alô?
FHC - Oi, André.
André - Oi, presidente. Tudo bem?
FHC - Não tão bem quanto você (risos). Não estou vendendo
telefônicas.
André - (Risos.) Mas eu não estou subindo tanto nas pesquisas.
(Risos.)
FHC - (Risos.) 'Tá bom.
André - Eu... dois assuntos. O primeiro é sobre isso, mas,
depois, semana que vem, eu vou aí.
FHC - Ótimo.
André - Seria bom a gente, o BNDES, ter um tempinho aí.
FHC - Teremos, claro.
André - Mas eu vou pedir para depois marcar.
FHC - 'Tá.
André - Mas sobre, ainda sobre especificamente o leilão de
quarta-feira.
FHC - Hum, hum.
André - O... tem um tempinho, rápido?
FHC - Tenho, claro.
André - Tem esse... Tele Norte Nordeste é para a telefonia
fixa, são 13 empresas, é uma coisa grande, é o tipo da coisa que
seria chato não ter uma boa solução para lá. Nós estamos com alguma
confiança de que os portugueses vão "bidar" para lá.
FHC - Hum, hum.
André - Se os portugueses levassem, seria ótimo.
FHC - Certo.
André - Agora, os portugueses são meio cerimoniosos, a gente
não sabe bem com quem eles estão etc. Mas, seria muito bom. Eles
são mais agressivos, são independentes um pouco dos espanhóis, estariam
bem. De qualquer maneira, nós gostaríamos de ter certeza de que
tem, pelo menos, mais um segundo consórcio lá.
FHC - Qual é o primeiro?
André - Não, o primeiro seria o dos portugueses.
FHC - Sei.
André - Tudo indica. Os portugueses fizeram um sigilo danado
com a gente para contar, para dizer se vão "bidar" e tal, mas eles
têm, entraram com um consórcio com um nome chamado Por Com Norte
Nordeste.
FHC - Sei. (Gargalhadas.)
André - (Risos.) Então, quer dizer, é aquela coisa, né? "O
filho que era a mãe." (Gargalhadas.)
FHC - (Gargalhadas.)
André - Mas nunca se sabe, não é. Bom, então não queremos
confiar muito nisso. Aí, existe a possibilidade dos segundos consórcios
que entrariam... Todo mundo tem interesse, se perder a Telesp, todo
mundo "bidaria", então os próprios italianos etc. entrariam com
força para a Norte Nordeste, a Telemar.
FHC - Sei.
André - Bom, mas não vamos contar com isso. Nós gostaríamos
de ter um segundo consórcio "bidando" de qualquer maneira. O segundo
consórcio, quem estava mais ou menos montado, eram os italianos,
de novo, coordenados pelo, com o Opportunity, onde eles já estão,
têm um acordo, estão amarrados um com o outro. E, especialmente,
os fundos _que era a Previ. Que a Previ, de certa forma, é a coordenadora
dos fundos, dos demais fundos. Agora, aí entraram alguns, alguns
problemas, e a Previ bandeou para um segundo grupo. O senhor deve
estar aí bem informado de que ela tem andado aí para um outro grupo...
que nós 'tivemos com eles hoje de manhã.
FHC - Sei.
André - Esse segundo grupo, então, é o seguinte: só é todo
mundo nacional e não tem operadora...
FHC - Sei.
André - Em princípio, isso não tem nada de mais. Agora, a
conversa, quanto mais nós vemos aqui é, acho que é um pouco, é uma,
uma aliança da assim corporativa, do corporativismo das próprias
empresas telefônicas...
FHC - ...Com aventurismo.
André - Com a Sistel. Exatamente. Com o pior do aventurismo.
FHC - Com o pior. Exatamente. Comprometedor...
André - Inclusive, é o seguinte. É uma coisa muito ruim ir
para a frente. É um risco enorme.
FHC - Eu acho também...
André - Bom, então, o que nós precisaríamos um pouco é de...
e esse pessoal tem vindo assim, não, tal, falam, citam nomes.
FHC - Isso é que é o mais grave.
André - Muito complicado.
FHC - É, é.
André - Então, o que nós precisaríamos é o seguinte. Com
o grupo do Opportunity, nós até poderíamos turbiná-lo nós, via BNDESPar.
Mas o ideal é que a Previ entre com eles lá.
FHC - Com o Opportunity?
André - Com o Opportunity e os italianos.
FHC - Certo.
André - Perfeito? Porque aí esse grupo está perfeito.
FHC - Mas... e por que não faz isso?
André - Por que a Previ tá... tá do outro lado.
FHC - A Previ?
André - Exatamente. Inclusive com o Banco do Brasil, que
ia entrar com a seguradora etc., que diz, não, isso aí é uma seguradora
privada porque...
FHC - ... Não.
André - Então, é muito chato. Olha, quase...
FHC - ... Muito chato.
André - Olha, quase...
FHC - Cheira a manobra perigosa.
André - Mas é quase explícito.
FHC - Eu acho.
André - Quase explícito.
FHC - Eu acho.
André - Então, nós vamos ter uma reunião aqui, estive falando
com o Luiz Carlos, tem uma reunião hoje aqui às seis e meia. Vem
aqui aquele pessoal do Banco do Brasil, o Luiz Carlos etc. Agora,
se precisarmos de uma certa pressão...
FHC - ...Não tenha dúvida.
André - A idéia é que podemos usá-lo aí para isso.
FHC - Não tenha dúvida.
André - 'Tá bom.
FHC - O Ricardo Sérgio está atrás de mim. Será que é por
isso?
André - Exatamente. E ele inclusive vem hoje aqui às sete
horas.
FHC - 'Tá.
André - Então. Ele parece que... Ele é a pessoa-chave para
a decisão disso.
FHC - Sei.
André - Que é quem coordena. Então, porque aí entra o seguinte.
Os italianos... o Opportunity, na verdade é, é, é o fundo deles,
o Private Equity deles, que tem o Citi, tem não sei o quê, tem lá
outros.
FHC - É muito melhor, não é?
André - Não tem dúvida nenhuma.
FHC - Esse outro... Carlos Jereissati vai dizer que foi o
governo.
André - Já 'teve aqui. A conversa é horrorosa.
FHC - É. Não dá, não dá.
André - É horrorosa. 'Tá?
FHC - 'Tá certo.
André - Então eu vou... nós vamos, vamos nessa linha.
FHC - Eu acho que sim.
André - E se precisar eu entro em contato de novo.
FHC - Tudo bem.
André - 'Tá bom?
FHC - 'Tá bem.
André - Então, 'tá bom.
FHC - Combinado.
André - Obrigado, tchau.
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