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vida urbana
23/08/2004
Insegurança cria dilema para os pais

"Não fale com estranhos." A tradicional orientação paterna tornou-se insuficiente com o avanço da violência nas grandes cidades e, hoje, vem acompanhada de uma série de outros "nãos".

Tornou-se proibido brincar na rua, ir à escola sozinho, exibir o brinquedo novo e mesmo andar com o uniforme do colégio. No entorno das escolas, a segurança é reforçada com câmeras e vigias.

Diante de casos como o seqüestro de um aluno do colégio Santa Cruz, em São Paulo, libertado na última semana, poucos são os pais que não pensam em implementar todas as medidas de segurança possíveis no cotidiano dos filhos. Mas enfrentam um dilema: em que momento a preocupação com violência ultrapassa os limites e resulta em uma geração de crianças neuróticas?

"Não só como profissional, mas também como pai e cidadão, tenho a impressão de que isso está acontecendo. O medo sempre foi uma grande arma dos pais para "segurar" as crianças. Mas, antes, elas tinham medo da cuca, e, quando cresciam, viam que a cuca não existia. Hoje, o medo é do assaltante, do seqüestrador, e eles existem", afirma o psiquiatra Eduardo Ferreira-Santos, que coordena um grupo de atendimento a vítimas de seqüestro no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas.

Para Ferreira-Santos, um dos aspectos mais preocupantes é o surgimento de pessoas com transtornos de estresse pós-traumático sem terem vivido uma situação de violência concreta. "É um estresse já anterior ao trauma. Nesse contexto, os pais tendem a enclausurar os filhos, como se isso evitasse alguma coisa."

A definição do limite entre a preocupação natural e a neurose divide especialistas. Para o psiquiatra Içami Tiba, autor de "Quem Ama, Educa!", é melhor ser hiperprotetor do que acreditar na sorte. "A tendência do jovem é não temer nada. É preferível ser paranóico do que não ter noção do perigo. Vivemos num período de guerra", diz.

Já para a psicóloga Rosely Sayão, colunista da Folha, a hiperproteção compromete a capacidade da criança de aprender a se cuidar sozinha. "Nessa sociedade atual, é muito difícil educar para a autonomia. Mas os pais precisam lembrar que o filho vai crescer e terá de enfrentar o mundo."

O melhor caminho, segundo a psicóloga, é apontar os riscos para a criança e perguntar como ela agiria naquela situação se estivesse sozinha. "Dá para fazer isso na rua, mostrando os perigos do trânsito, por exemplo. E, a partir das respostas da criança, mostrar os erros dela, as distrações."

Além de comprometer a autonomia da criança, a preocupação exagerada com a segurança pode trazer outro dano, segundo a psicóloga Ana Mercês Bahia Bock: incutir nas novas gerações um preconceito ainda maior em relação às camadas mais pobres da população. "O medo incontrolável desenvolve o preconceito social, faz uma criança ter medo de chegar perto de outra, que é pobre. É preciso desmitificar que as camadas mais pobres sejam sempre perigosas. A gente não percebe, mas essa precaução toda em relação aos pobres é uma grande forma de violência das camadas dominantes em relação às mais baixas", afirma Bock, que é presidente licenciada do Conselho Regional de Psicologia.

Para ela, é fundamental que pais e professores, além de ensinarem a criança a se defender, discutam os aspectos sociais por trás da violência. "Esse é o ônus de viver numa sociedade desigual. Tem que explicar isso para a criança."

AMARÍLIS LAGE
da Folha de S.Paulo

 
 
 

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