Livraria da Folha

 
03/07/2009 - 17h12

Guilherme Fiúza fala de seus livros biográficos e discute utopias sobre a Amazônia; leia entrevista

MANOELA MEYER
Colaboração para a Livraria da Folha

Rogerio Cassimiro/Folha Imagem
O escritor Guilherme Fiúza, autor dos livros "Amazônia 20º Andar" e "Meu Nome Não É Johnny"
O escritor Guilherme Fiúza, autor dos livros "Amazônia 20º Andar" e "Meu Nome Não É Johnny"

O jornalista e escritor Guilherme Fiúza ficou conhecido pelo livro "Meu Nome Não É Johnny" (Record, 2007), que deu origem ao filme homônimo, dirigido por Heitor Dhalia e estrelado por Selton Mello. Fiúza foi um dos convidados da Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto e durante sua palestra respondeu a delicadas perguntas sobre o discernimento dos jovens, tema central de sua principal obra.

"Quando se veiculam campanhas do tipo 'Drogas: Tô Fora!', querem impedir o jovem de experimentar. Mas isso não deveria acontecer", afirmou. "Os jovens não devem discutir as drogas por meio de tabus. Devem ser informados das possíveis consequências. Talvez tenha sido esse ponto de vista que deu crédito à minha obra".

Após a palestra, Fiúza concedeu uma entrevista para a Livraria da Folha, na qual discutiu a elaboração de biografias. Sua mais recente obra "Amazônia 20º Andar" (Record, 2008) deu espaço para uma reflexão sobre as utopias que envolvem a gigantesca floresta. Por fim, avaliou a importância de diversos eventos culturais.

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Livraria da Folha - A biografia pede um olhar jornalístico ou ela se basta nas técnicas literárias?

Guilherme Fiúza - Já li muitas biografias chatas, de personagens fascinantes. Acho que isso é uma crueldade com o leitor e com o próprio personagem, porque a obra é fundamental para que o conteúdo faça sentido. O jornalismo tem alguns mandamentos sagrados que convergem para o seguinte fato: você tem a missão de não deixar o leitor ir embora até o final do primeiro parágrafo. Porque a leitura tende à dispersão, mais do que a imagem. A imprensa é rápida, então você tem esse treino. Toda escola de jornalismo deveria ensinar, com diploma ou sem, que você tem que ser muito atraente. E para ser muito atraente, é a linguagem e a mensagem: escrever com ritmo, escolher as palavras certas e falar do que importa. E você cai no ingrediente que eu acho que o jornalista tem muitas condições de perceber e transmitir, que é a emoção. Ao longo desse trabalho com os livros, eu percebi que a emoção é um parâmetro quase infalível. Fala-se da emoção barata, mas é muito difícil você ter realmente emoção em cima de um fato desimportante. Os fatos realmente importantes são emocionantes. Acho que nessa linha, o legal é o narrador, seja ele jornalista ou não, ser um parceiro do leitor. Entregar o que há de melhor na história, mais gostoso, mais apetitoso e atraente.

Livraria da Folha - Sua última obra, "Amazônia 20º Andar", trata de um assunto fortemente relacionado com um dos homenageados da feira deste ano, o estado do Amazonas [os outros homenageados são o Chile e a poeta Cora Coralina]. Gostaria de saber o que você acha de tantas atenções voltadas para a Amazônia?

Fiúza - [O livro] conta a história de uma pessoa que sai da cidade com tudo resolvido, uma vida confortável. Ela deixa essa vida para trás, pondo tudo a perder para ir atrás desse enigma, que é a vida selvagem. Respondendo a sua pergunta, acho que é porque a Amazônia é um grande fetiche. Tenho a petulância de dizer que a maioria das pessoas que se preocupam com a Amazônia não sabem bem porque elas tão preocupadas. Eu tenho a impressão que a Amazônia está tão em evidência porque o Brasil, em especial, tem uma inquietude enorme sobre qual é o seu interesse lá. A Amazônia é um prodígio: maior floresta tropical do mundo! Isso é quase um orgulho ufanista. Por outro lado, é um símbolo de atraso, de mosquito, de vida pobre, de tragédia, de crime, de ausência de Estado, de ausência de civilização. No fundo, a sociedade não sabe bem o que fazer com esse símbolo. O meu livro é mais ou menos a história da demolição do romantismo em torno da Amazônia. A Bia [protagonista] vai para a floresta por uma utopia, imaginando uma floresta cor de rosa que ela quer salvar. Ela realiza o sonho dela, que é se aliar a índios e seringueiros para ganhar o mundo com seu produto. Mas junto ao sonho tem uma série de pesadelos que é ela caindo na real de quanto aquele lugar é inóspito, cruel, feio, às vezes. É um lugar fascinante, mágico, mas que tritura as pessoas que se arriscam a ir para lá.

Livraria da Folha - Há algum paralelo entre "Amazônia 20º Andar" e "Meu Nome Não É Johnny"?

Fiúza - O livro "Amazônia 20º Andar" tem essa coisa curiosa, da mesma maneira que o Johnny [ "Meu Nome Não É Johnny" ] é um cara bem nascido, da classe média e através do olhar dele a gente vai pro submundo, não por um olhar de um criminoso, de um cara que infelizmente já nasceu na periferia da sociedade. É um olhar muito rico, de um cara levando aqueles solavancos todos. E no "Amazônia 20º Andar" acontece uma coisa muito parecida: uma pessoa que sai com todos os códigos da cidade e na primeira vez que ela chega à Amazônia, pega um taxi que, na verdade, é um transporte que vai levá-la à cidade de Boca do Acre. Ela entra tranquilamente naquele taxi e, no meio da viagem, se vê no meio do nada, com um motorista louco, psicopata, que tem um revolver na cintura, onde tudo pode acontecer com ela. Isso é só uma caricatura de uma visão muito rica de alguém da cidade indo pra floresta sem a ONG, sem o deputado, sem as estatísticas e os satélites. Uma pessoa de carne e osso vendo aquele mundo tão estranho.

Livraria da Folha - E você? Teve a oportunidade de viver em carne e osso essa realidade?

Fiúza - Tive. Eu não tive a experiência que esses personagens tiveram, porque eles levaram a vida deles pra lá. E aí eles sentiram tudo mesmo na carne, de bom e de ruim. Eu fui fazer reportagem, e certamente não mergulhei tão profundamente.

Livraria da Folha - Gostaria de saber o que você acha de eventos como essa Feira Literária?

Fiúza - Eventos com essa potência cultural, como a feira de Ribeirão, a FLIP [Festa Literária Internacional de Paraty], festivais de cinema em Cannes e Gramado, é onde você vê que muitas cidades se tornam conhecidas, até internacionalmente, por conta de eventos que fazem. Eu acho maravilhoso porque você, no fundo, cria uma atmosfera de prazer, de entretenimento, os espíritos ficam mais soltos e essa é a melhor maneira de absorver cultura. E numa feira como essa, tudo ao mesmo tempo, tudo agora, um monte de coisas acontecendo, ela [atmosfera] é marcante e inesquecível. Por isso essas cidades se tornam capitais de cultura.

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"Amazônia 20º andar"
Autor: Guilherme Fiúza
Editora: Record
Páginas: 272
Quanto: R$ 42,00
Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou na Livraria da Folha

"Meu Nome Não É Johnny"
Autor: Guilherme Fiúza
Editora: Record
Páginas: 336
Quanto: R$ 44,00
Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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