Livraria da Folha

 
04/03/2010 - 13h24

Veja o encontro dos protagonistas da sátira aos vampiros de Stephenie Meyer

da Folha Online

Divulgação
Paródia de "Crepúsculo" faz piadas que apenas fãs podem entender
Paródia de "Crepúsculo" faz piadas com o sucesso dos vampiros

Conhecido por seu humor ácido e suas paródias, o grupo "The Harvard Lampoom" não poupa a saga de Stephenie Meyer em sua sátira "Opúsculo". Exagerando nas descrições e nas atitudes dos personagens, o livro consegue fazer graça até com as características que fizeram milhares de leitores se apaixonarem pelos vampiros de "Crepúsculo" .

Com fãs devotos, que não recebem bem as críticas negativas ao seu objeto de adoração, os livros de Meyer atraem multidões para o que quer que leve seu nome. Ainda assim, "Opúsculo" conseguiu um posto na lista estendida de livros mais vendidos da semana da revista "Veja".

O romance de Edwart e Belle não é tão misterioso ou absurdamente romântico quanto o de Bella e Edward, mas consegue ser tão inusitado e repleto de situações inimagináveis quanto.

Leia abaixo o momento no qual a heroína encontra seu amado pela primeira vez na cafeteria, em trecho de "Opúsculo".

*

Foi então que o vi. Ele estava sentado atrás de uma mesa, totalmente concentrado, nem mesmo comia. Tinha uma bandeja inteira de batatas assadas à sua frente e, mesmo assim, não havia tocado em nenhuma. Como poderia um ser humano ser capaz de resistir a um prato de batatas assadas? Ainda mais estranho, ele não havia me notado, Belle Goose, futura ganhadora de um Oscar.

Havia um computador diante dele sobre a mesa. Ele olhava atentamente para a tela, estreitando os olhos em fendas e concentrando aquelas fendas sobre a tela como se a única coisa importante fosse dominá-la fisicamente. Era musculoso, como um homem que podia prensar você contra a parede tão fácil como um pôster, mas mesmo assim magro, como um homem que a acalentaria em seus braços. Tinha cabelos ruivo-castanho-alourados, heterossexualmente aparados. Parecia mais velho que os outros rapazes dali - talvez não tão velho quanto Deus ou meu pai, mas certamente um substituto viável. Imagine juntar a ideia de todas as mulheres sobre o que seria um cara gostoso e fazer uma média disso num único homem. Era ele.

- O que é aquilo? - perguntei, sabendo que, o que quer que fosse, não era uma ave.

- Aquele é Edwart Mullen - disse Lululu.

Edwart. Eu nunca havia conhecido um rapaz chamado Edwart antes. Na verdade, nunca tinha conhecido qualquer ser humano chamado Edwart. Era um nome que soava engraçado. Muito mais divertido que Edward.

Enquanto nos sentávamos lá, contemplando-o durante o que pareceram ser horas, mas não podia ter sido mais do que o intervalo do almoço, seus olhos de repente voltaram-se em minha direção, deslizando sobre o meu rosto e cavando um buraco dentro do meu coração como se fossem presas. Então, bruscamente, voltou-se com seu olhar carregado para aquela tela.

- Mudou-se do Alasca para cá há dois anos - ela disse.

Então não somente ele era pálido como eu, mas também um forasteiro de um estado que começava com a letra "A". Senti uma onda de empatia. Nunca havia sentido uma conexão como essa antes.

- Aquele cara não vale seu tempo - ela disse, erroneamente. - Edwart não namora.

Sorri por dentro e ri cuspindo para fora, enfiando a soda-gosma dentro do meu bolso. Então, eu seria sua primeira namorada.

Ela se levantou para sair.

- Vamos para a aula de "bio", Belle?

- Não diga, Lululu - eu disse, desdenhosamente.

- Lucy. Meu nome é Lucy, como em I Love Lucy.

- Tudo bem. Lucy, como em I Love Edwart. - Talvez eu fosse especial, mas sempre tive um talento para memorizar. "Lata de lixo à esquerda", falei alto, jogando fora meus restos do almoço: um bolo comido pela metade. Olhei de volta para Edwart para ver se ele tinha percebido que também tenho disciplina para comer. Mas, estranhamente, ele havia partido. Nos dez minutos desde que tinha olhado para ele pela última vez, ele havia desvanecido no ar.

Olhei em volta bem a tempo de ver que eu tinha errado a lata de lixo e que meu bolo meio comido havia voado em direção às costas de uma garota sentada a uma mesa próxima.

- Ei! - disse ela quando o bolo a atingiu. - Quem fez isso?

- Vamos - eu disse a Lucy, agarrando-a pelo braço e correndo para fora da lanchonete enquanto a guerra de comida começava.

Quando Lucy e eu chegamos à classe, ela foi se sentar com sua parceira de laboratório e eu olhei em volta procurando uma carteira vazia. Havia apenas duas: uma na parte da frente da sala e outra perto de Edwart. Como a carteira da frente ficou com uma perna bamba depois que eu passei por ela e a chutei, não havia escolha. Tinha de me sentar ao lado do rapaz mais gostoso da sala.

Caminhei na direção das carteiras, rebolando meu quadril e erguendo minhas sobrancelhas ritmicamente, como uma pessoa atraente. De repente, eu estava caindo para a frente, deslizando por entre as carteiras com o impulso do meu mergulho. Por sorte, um fio de computador se enroscou em meu tornozelo e me impediu de ser arremessada à mesa do professor Franklin. Rapidamente, apoiei-me à parede para me desembaraçar, fiquei de pé e olhei em volta casualmente para ver se alguém tinha visto. Toda a classe estava olhando para mim, mas provavelmente por uma razão diferente: eu tinha um holograma costurado na minha mochila. De um ângulo era um mexerica, de outro ângulo era um tangerina.

Edwart também estava olhando para mim. Talvez fosse a luz fluorescente, mas seus olhos pareciam mais escuros - sem alma. Ele estava se agitando furiosamente. Seu computador estava aberto na frente dele, e a melodia sintetizada de antes havia cessado. Ele ergueu o punho para mim com raiva.

Limpei a poeira química das minhas roupas e me sentei. Sem olhar para Edwart, tirei da mochila meu livro e meu caderno. Ainda sem me virar para Edwart, olhei para o quadro-negro e anotei os termos que o professor Franklin havia escrito ali. Não achei que outras pessoas na minha situação poderiam fazer tantas coisas sem olhar para Edwart.

Virada bem para a frente, deixei meus olhos se desviarem ligeiramente e estudarem-no de maneira periférica, o que não conta como olhar. Ele tinha mudado seu computador para o colo e havia recomeçado seu jogo. Estávamos sentados lado a lado no balcão do laboratório e, mesmo assim, ele não começava uma conversa comigo. Era como se eu não tivesse usado desodorante ou algo assim, quando na realidade eu tinha usado desodorante, perfume e Bom-Ar. Será que meu brilho labial havia borrado ou algo parecido? Apanhei meu espelhinho de bolsa para checar. Negativo, mas eu tinha algumas espinhas junto à linha do cabelo. Apanhei um lápis na carteira de Edwart e o pressionei contra a carne macia e suave do meu rosto. As espinhas eram do tipo projétil. Satisfação garantida.

Voltei-me para ele para agradecer gentilmente pelo uso de seu lápis, mas ele estava olhando para mim horrorizado, com a boca aberta, um convite a todo tipo de micro-organismos aéreos como pássaros. Ele agarrou o lápis e começou a limpar suas mãos com lenços umedecidos e a esfregar o lápis com desinfetante. Então traçou um círculo de giz em torno dele e voltou a copiar as notas do quadro-negro, cantando para si este amigável jingle:

"Germes contagiosos. Alerta de contágio. Mas Edwart e seu desinfetante são mais fortes que a sujeira."

Estendi a mão para emprestar outra vez o lápis para fazer minhas anotações, mas, no momento em que minha mão atravessou a linha de giz, ele gritou. Um grito estranhamente agudo para um menino. Porém, o grito certo para um super-herói.

O professor Franklin estava falando sobre citometria de fluxo, imunoprecipitação e microarranjos de DNA, mas eu já sabia aquela matéria da fita cassete que havia escutado em meu caminhão naquela manhã a caminho da escola. Girei meus olhos em círculos, como se eles estivessem numa roda-gigante. É a melhor maneira que conheço para me impedir de cochilar. Toda vez que meus olhos se moviam para a direita, contudo, eles pairavam um pouco por ali. Eu não conseguia evitar - eles queriam ver Edwart. Então, meus olhos iam para o alto em direção ao teto e paravam porque, meu, que bela visão.

Edwart continuava a martelar em seu computador. A cada golpe de dedo, eu podia ver o sangue pulsando através das veias salientes de seu antebraço até seu bíceps, aparecendo contra a camisa Oxford branca justa arregaçada descuidadamente até os cotovelos como se ele tivesse um monte de trabalho manual a fazer. Por que ele estava digitando tão sonoramente? Estaria tentando me dizer alguma coisa? Estaria tentando me provar o quão fácil seria para ele me atirar até o céu e então me pegar bem forte em seus braços, sussurrando que nunca me dividiria com mais ninguém no mundo inteiro? Estremeci e sorri timidamente, apavorada.

Quando o sinal soou, roubei outro olhar dele e me encolhi num profundo sentimento de inutilidade. Ele agora estava encarando o sinal furiosamente, sacudindo todos os músculos de seu punho em sua direção, mirando-o com raiva, seus olhos escurecidos e esquentados e suas sobrancelhas hostis. Ele puxou seus cabelos com exasperação, agarrando tufos enquanto erguia a cabeça para o teto. Então, vagarosamente, voltou-se para mim. Olhando dentro de seus olhos, senti ondas de eletricidade, correntes de elétrons carregados em minha direção. Era isso, imaginei, que significava estar apaixonada por robôs? Apanhada em minha hipnose ionizada, o velho adágio me veio à mente: "Belo o suficiente para matar, estripar, rechear e emoldurar em cima da sua lareira".

De repente, ele saiu de seu deslumbramento e disparou correndo para porta. Enquanto corria, percebi como era alto, suas longas pernas saltando em passadas do tamanho do meu corpo inteiro, seus braços tão sólidos que não ondulavam com o impacto. Meus olhos saltaram. Não tinha visto uma coisa tão bela desde que eu era uma garotinha e as balinhas coloridas Skittles em minha mão fechada e suada se transformavam num arco-íris. Suas omoplatas ficavam salientes sob a camisa enquanto ele corria. Pareciam asas brancas batendo majestosamente antes da decolagem. Demoníacas asas brancas.

- Espere! - gritei para ele. Ele tinha deixado seu computador no assento. "Fim de jogo", lia-se na tela. Fim de jogo, realmente, pensei, usando uma metáfora.

- Posso copiar suas anotações? - perguntou um humano normal do sexo masculino. Levantei os olhos e vi um garoto de estatura mediana, cabelos escuros e uma estrutura esguia, mas musculosa. Senti-me atraída por ele. Ele sorriu para mim. Perdi o interesse.

- Claro, como quiser - eu disse, estendendo-lhe meu bloco de anotações e de repente percebendo que tinha rabiscado nele um desenho de Edwart. No desenho, ele tinha presas gotejando uma substância escura. Molho Shoyu.

- Vou precisar disso de volta - eu disse. Aquele desenho ia para o meu mural.

- Obrigado, Lindsey - disse ele, confundindo-me com Lindsey Lohan. Ele sorriu outra vez. Um rapaz simpático. Tinha um belo cabelo e olhos claros gentis. Íamos ser grandes amigos. Apenas grandes amigos.

- Leve-me ao escritório da administração - eu disse. Tínhamos ginástica em seguida, mas eu precisava da minha cadeira de rodas. Tenho um problema que faz minhas pernas ficarem paralisadas toda vez que penso em ginástica.

- Certo - ele disse, deixando-me apoiar meu peso sobre ele

- Sou Adam, a propósito. Acho que vi você em minha aula de Inglês. Vai ser ótimo! Desde que um de nós tome notas, o outro, eu, não precisa ir à aula - ele estava ficando ofegante enquanto me arrastava com ele. Estar perto de mim deixava alguns rapazes nervosos.

- Você percebeu algo engraçado sobre Edwart na aula? Acho que o amo - eu disse casualmente.

- Bem, ele parecia meio zangado quando você caiu e desconectou o fio do computador dele. Então, isso não estava só na minha mente; outros haviam percebido a consciência de Edwart a meu respeito. Havia alguma coisa em mim que evocava sentimentos muito fortes em Edwart.

- Humm - eu disse cientificamente. - Que interessante.

- Aqui estamos - depois de me escorar contra a parede, Adam cambaleou para trás, bufando e assoprando.

Eu o dispensei e entrei no escritório.

- Estou paralisada até a próxima hora - anunciei à secretária.

- Vá se sentar em seu carro, querida - disse ela, levantando os olhos de seu exemplar de Luz do dia.

Saí para o meu carro, tentando sonhar com os poderes dele, o rei dos carros, mas estava muito perturbada. Em primeiro lugar, se eu tinha conseguido meu carro de graça, isso significava que todos os outros tinham pago mais por carros muito menores. Em segundo lugar, estava muito certa de que havia alguma coisa sobrenatural sobre Edwart - algo além de especulações racionais.

Então, parei de especular sobre ele e assisti a uma procissão de formigas passando por ali. A vida seria muito mais fácil se eu pudesse carregar coisas que pesassem vinte vezes mais que eu.

*

Opúsculo
Autora: The Harvard Lampoon
Editora: Novo Século
Páginas: 144
Quanto: R$ 24,90
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

 
Voltar ao topo da página