São Paulo, terça-feira, 4 de janeiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

As estrelas sobem

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – A primeira segunda-feira de 1994 começou mal. Numa entrevista publicada ontem na Folha, um dos coordenadores do programa de governo do PT, César de Queiroz Benjamin, anuncia: se vitorioso na disputa presidencial, o partido vai se empenhar para quadruplicar os gastos militares. É tão irritante quanto desanimador, especialmente quando a proposta é lançada por gente que se intitula "progressista".
Há um gigantesco esforço entre os pacifistas e movimentos de direitos humanos em todos os países por uma bandeira: aproveitar o clima de alívio com o final da Guerra Fria e drenar recursos militares para programas contra a miséria. O Unicef acaba de lançar um documento, informando que, na década de 80, o mundo gastou por ano US$ 1 trilhão. Calculou que se essa quantia fosse aplicada em causas mais nobres, já não haveria pobreza em nosso planeta.
O ideólogo do PT se mostra entusiasmado em jogar mais recursos num avião de batalha batizado de AMX e no centro de guerra eletrônica. Vamos reconhecer: como prioridade administrativa é um desperdício. Mas como jogada de marketing tem sentido –e muito. É capaz de arrebatar elogios e admiração entre os militares com estrelas, onde o PT ainda busca consolidação para governar.
Discutir a segurança do país é importantíssimo. Mas por que não encontrar soluções que unam a segurança com a necessidade de drenar o máximo de dinheiro disponível para o combate à miséria? Impossível? Difícil, concordo. Impossível, não.
O Brasil está construindo um mercado comum com Uruguai e Argentina, algo que, até pouquíssimo tempo, se via como inatingível –sobretudo devido aos atritos com os argentinos. Isso tornou-se viável porque, entre outras coisas, mudou-se a noção de soberania. Por que, então, não se analisa a possibilidade de um exército regional para manter a paz nas fronteiras?
Loucura? Há casos ainda mais ousados que, diga-se, estão em prática e dão certo. A Costa Rica simplesmente não tem Forças Armadas.
PS- Será que os militantes de direitos humanos e os grupos cristãos do PT concordam com essa proposta? Se concordarem, nem são cristãos nem sinceros devotados à causa dos direitos humanos.

Texto Anterior: Siglas
Próximo Texto: Memorando
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.