São Paulo, sábado, 8 de janeiro de 1994 |
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Chico Buarque estréia com show apoteótico
SÉRGIO AUGUSTO
E dali em diante, num crescendo incontrolável e avassalador, o "falso cantor" (ele próprio admite isto em "Choro Bandido") foi montando o que talvez tenha sido uma das melhores e mais emocionantes apresentações de sua carreira. Quando nada porque na platéia pareciam estar todos os amigos e admiradores mais afortunados do cantor. "Parece uma festa de pessoas que não se viam há muito tempo", comentou ao meu lado Fernanda Montenegro. Mais que isso: tinha-se a impressão de que o Brasil finalmente havia tomado jeito e ali estávamos celebrando a grande nova com o mais querido e combativo dos nossos menestréis. Menos que um show, "ParaTodos" é um recital, tendo como cenário a capa do disco que o motivou. Magnificamente iluminado por Ney Matogrosso, Chico se limita a cantar, de pé, acompanhado de um sexteto cujo spala é o violonista Luiz Claudio Ramos. Nenhum floreio, nenhum "trompe l'oeil", nenhuma distração. Basta-lhe a pujança poético-musical de seu astro, bardo e hermeneuta de tristezas que nestas paragens ainda não tiveram fim, trovador de alegrias que por aí andam, na alma das ruas, no coração dos malandros, no rosto das cabrochas e no grito das arquibancadas. Daqui a dois meses já vai fazer 24 anos que ele voltou de seu exílio na Itália. Pelo júbilo da platéia, na noite de quinta-feira, Chico parecia só estar de volta agora. Coincidência ou não, ele entra em cena no dorso de um samba cujo mote é, justamente, a volta de um compositor ao seu devido lugar: "Pensou que eu não vinha mais, pensou/Cansou de esperar por mim/acenda o refletor/apure o tamborim/aqui é o meu lugar/eu vim". Como já disse, não veio, de início, com a corda toda. Largou tímido, meio acabrunhado, tentativo, a voz abafada pelos instrumentos. Chegou mesmo a decepcionar na interpretação solo de "Biscate" (que falta o dueto com a Gal Costa faz!), mas, também como já disse, ninguém o segurou depois de seu primeiro encontro com Edu Lobo –não no palco, evidentemente, mas nas notas de um choro que as rimas tantas fala grego com a imaginação. Programado para durar 90 minutos e ter, no máximo, 25 músicas, a estréia de "ParaTodos" acabou durando 105 minutos e mais três números, sem contar o bis ("Vida"). Ao ver o Canecão transformado na verdadeira praça da Apoteose, Chico retornou duas vezes à ribalta para se despedir com o bloco do sanatório geral, à frente do qual pôs a tristeza de lado, lembrando que não existe pecado do lado debaixo do Equador e que o importante é a gente ser feliz. Se contra fel, moléstia e crime, a gente deve usar Dorival Caymmi, contra desânimo, ceticismo e enfarte, a gente deve usar Chico Buarque. Show: ParaTodos Cantor: Chico Buarque Onde: Canecão (av. Wenceslau Brás, 215, tel. 021/295-3044, zona sul) Quando: às quintas, às 21h30; às sextas e sábados, às 22h; aos domingos, às 20h30) Quanto: CR$ 3.000 (arquibancada), CR$ 4.500 (mesa lateral); CR$ 6.000 (mesa central) Texto Anterior: É necessário trancar Nelson no teatro Próximo Texto: Platéia de convidados mata saudades Índice |
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