São Paulo, sábado, 8 de janeiro de 1994
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As últimas palavras do sindicalista

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – As informações disponíveis até ontem à noite indicavam que, até aqui, é uma evidente exploração política vincular o PT ou a CUT numa trama para matar o sindicalista Oswaldo Cruz Jr. Mas é um desgaste à candidatura Lula à Presidência –e tudo por causa das últimas palavras da vítima.
Na noite anterior ao crime, Oswaldo Cruz Jr. cumpria mais um passo de sua estratégia, batizada por ele próprio de "conta-gotas". Pretendia ir divulgando em drops acusações contra CUT, PT e, em especial, Lula. Acabou deixando uma entrevista explosiva, publicada ontem no "Diário do Grande ABC".
Desta vez, ele disse que Lula "estava" envolvido diretamente na arrecadação de dinheiro dos sindicatos para os projetos eleitorais do PT.
Numa autoconfissão, Cruz afirmou ter fraudado documentos e produzido assembléias fantasmas, visando desviar clandestinamente recursos para o partido. Mostrou, inclusive, a trilha: o desvio se esconderia na rubrica "despesas extraordinárias".
Não é difícil, agora, saber: basta investigar, com a abertura de sigilo bancário, a movimentação do dinheiro. Assim como os demais sindicatos do ABC relacionados por Cruz. Suponho que a CUT, o PT e o próprio Lula tenham interesse em apoiar uma devassa –isso, natural, se estiverem mesmo convencidos de que nada será encontrado.
É uma briga incômoda para o PT: terá de discutir com um morto que virou vítima, trazendo a suspeita inevitável de queima de arquivo. Os adversários de Lula exploraram ontem essa fragilidade. "Era um homem de bem e corajoso", disse Paulo Maluf. O Brasil está repleto de assassinatos que, explorados politicamente, mudaram os rumos da história.
O desgaste vai mais longe. Lula se esforça diariamente em passar a imagem de moderação, capaz de garantir uma nação pacífica. O assassinato expõe um ambiente incivilizado nos sindicatos da CUT. Impossível dissociar a imagem da CUT do PT.

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