São Paulo, domingo, 9 de janeiro de 1994
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Quércia diz que 'é cedo' para Britto

ANDREW GREENLEES
DO PAINEL

O ex-governador de São Paulo Orestes Quércia diz que o PMDB somente definirá seu candidato presidencial em abril ou maio, mas já assume o discurso de quem pretende encabeçar a chapa. De um lado, ataca o que considera a falta de competência política e administrativa do governo federal. De outro, abre baterias contra o PT e seu candidato presidencial, Luiz Inácio Lula da Silva.
Em entrevista à Folha, Quércia diz ainda que "é cedo" para o ex-ministro Antônio Britto disputar a Presidência. O PMDB, afirma o ex-governador, deve começar a preparar "um projeto para o Brasil". Quércia nega ainda que tenha recebido qualquer financiamento de empreiteiras em suas campanhas. "De empresas, pode ser".
A seguir, a entrevista do ex-governador, que vinha evitando declarações desde que renunciou à presidência do PMDB no ano passado.
*
Folha - O sr. é candidato a quê em 94?
Orestes Quércia - Minha disposição é colaborar com o partido para organizar um projeto de desenvolvimento para o país. O PT está se organizando e o PMDB também precisa. Tenho idéias no sentido de que o governo precisa fazer uma aliança com os empresários do Brasil para a questão da modernização industrial. E acredito que o Executivo tem que ser muito forte. Essa questão toda do Orçamento aconteceu porque há uma espécie de parlamentarismo dentro do presidencialismo. Os parlamentares têm que aprovar o Orçamento, mas não têm que votar a construção de uma ponte no município tal. Quem faz plano de governo, de investimentos, é o Executivo. Tem que ser decidido, firme, que é o grande problema de hoje no país: falta um governo que mande mesmo, que tenha condições políticas de executar. Acho que o PMDB tem que se preparar para isso.
Folha - Mas e a sua situação?
Quércia - Eu não tenho definição. Pretendo continuar na política, ser candidato. Se você perguntar sobre as alternativas que tenho: governador é difícil. Não posso excluir de vez, mas não é minha prioridade. Presidência da República: o PMDB tem que encontrar um nome de unidade do partido. Temos que conversar. Hoje, os companheiros do PMDB ficam conversando pelos jornais, um falando mal do outro. Tem que haver um entendimento.
Folha - Quem são os nomes hoje para a Presidência no PMDB?
Quércia - Não gostaria de dar nomes. Pode atrapalhar os diálogos.
Folha - Circulam hoje o seu nome, o do ex-presidente Sarney e o do ex-ministro Antônio Britto.
Quércia - Não tenho nada contra ninguém. O Britto, por exemplo, é uma pessoa boa, se for o candidato do partido, vou trabalhar por ele. Agora, acho que é muito cedo para ele ser candidato a aresidente. Não exerceu cargo executivo a não ser o ministério. Não foi prefeito, não foi governador. Entre o Pedro Simon e o Britto, é provável que o Britto tenha melhores condições de ser candidato a governador. Mas, para presidente, o Simon tem mais história. Não é restrição ao Britto, mas acho cedo.
Folha - E quando será a sua definição oficial?
Quércia - Lá por abril. Essa questão do PMDB tem que ser resolvida num diálogo das lideranças.
Folha - No ano passado, o sr. deixou a presidência do PMDB em meio a pressões contrárias a seu nome. Elas continuam?
Quércia - Eu tinha força para me eleger presidente do partido naquela época. Houve problemas que prefiro não lembrar agora, mas hoje está tudo muito bem. Não tenho mais os problemas que tive. A unidade é mais possível.
Folha - O candidato do PMDB precisa ser um anti-Lula?
Quércia - Não. Tem que ser a favor do país. Porque o Lula é o candidato contra o país, é o candidato do atraso. O PT é incompetente no governo, as administrações petistas são carregadas de corrupção e incompetência. Nenhuma escapa. O Lula fala em não pagar a dívida externa: é tirar o país do contexto internacional quando nós precisamos de investimento estrangeiro. Querer reverter as privatizações é o fim do mundo. O PT tem posição ultrapassada, eles são anteriores ao Muro de Berlim.
Folha - Como será financiada a campanha nacional? Quanto vai custar?
Quércia - Quando fui candidato a governador não gastei muito dinheiro. Não tive recursos, fiz a campanha e ganhei. Acho que a eleição não precisa de muito dinheiro. O importante é o horário gratuito para falar ao país.
Folha - Mas e o relacionamento com empreiteiras? Não são elas as grandes financiadoras de campanhas? O sr. recebeu dinheiro?
Quércia - Nunca fui ajudado por empreiteira. Nunca me deram um tostão.
Folha - Nunca?
Quércia - Nunca.
Folha - O prefeito Paulo Maluf disse há alguns dias que todo político recebeu dinheiro de empresas para a campanha.
Quércia - Nas minhas campanhas, sem ser empreiteira, pode ser, não sei. Era o partido que lidava com essa coisa. De qualquer forma, acho que é necessário regulamentar melhor a possibilidade de empresas, menos empreiteiras, ajudarem em campanhas.
Folha - A CPI tem um suposto documento da empreiteira Servaz que lista seu nome e o de José Nunes Lopes, seu sócio, ao lado do termo "porcentagem variável".
Quércia - O Fleury me disse que essa lista é falsa. Não tenho nada a ver com empreiteira.
Folha - Qual a situação de Sarney no partido?
Quércia - Sarney é uma figura importante no PMDB. Quando houve essa história dele sair, eu o procurei. Acho que dentro do partido ele não tem muita força, mas ele tem força fora, no Nordeste, no país inteiro, foi presidente, está bem nas pesquisas.
Folha - O sr. tem atacado o Plano FHC. Por quê?
Quércia - Planos não são difíceis de serem feitos. O Fernando Henrique tinha uma empresa de fazer planos. O problema é político. Você precisa competência política, administrativa, decisão, coisa que esse governo não tem. E não é culpa só do Itamar. O Fernando Henrique não manda, nunca administrou nada na vida. O país precisa de gente que saiba administrar. O Fernando Henrique diz que tem projeto, mas que o Congresso pode arrumar outra alternativa. Governo assim não aprova nada. O governo tem que dizer 'quero aprovar esse projeto' e fazer aprovar. O grande desafio no Brasil é o problema da moeda, da inflação. A moeda é uma instituição, tem que ser forte, respeitada.
Folha - O clima da CPI domina hoje o país. Isso não poderá levar a uma resistência contra sua eventual candidatura, pelo fato de o sr. ser um político que juntou fortuna? Não pode haver desconfiança?
Quércia - Sou, provavelmente, o primeiro exemplo de um político que tem que provar que é honesto. O ônus da prova compete a quem acusa, mas eu tive que provar que sou honesto. Contratei uma grande empresa de auditoria, eles analisaram tudo. Como o pessoal vai achar ruim se é isso que eu prego? Sempre disse que temos que dar oportunidade ao filho do trabalhador. Sou mais conhecido como político, mas essas explicações que dei ao partido me fazem conhecido também como empresário. Quando fui eleito prefeito de Campinas, um dos slogans da campanha era "um empresário bem sucedido para prefeito". É importante que me conheçam como empresário, porque é isso que o país precisa: dar condição ao filho do trabalhador de subir na vida. Mas a elite não quer saber dessa transformação e a reação contra mim principalmente é essa.

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