São Paulo, domingo, 9 de janeiro de 1994
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Artistas apóiam a causa dos indígenas

DO "LA JORNADA"

Cinco artistas mexicanos, todos nascidos em Chiapas e ganhadores de um prêmio que leva o nome do Estado, assinaram um manifesto de apoio à causa indígena, na semana passada. O abaixo-assinado foi divulgado no terceiro dia da revolta, que se iniciou na passagem do Ano Novo.
Juan Banuelos, Carlos Olmos e Elva Macías são poetas renomados no México. Eraclio Zepeda é radialista, atualmente no cargo de diretor-geral da Radio Universidad (Unam) e ex-candidato à presidência do Partido Socialista Mexicano (1987). Carlos Jurado é pintor.
Segue o texto integral do abaixo-assinado.
*
"Sobre a violência:
Nós, abaixo assinados, todos ganhadores do Prêmio Chiapas em anos diferentes, queremos expressar nosso ponto de vista diante dos últimos acontecimentos em nossa região de origem.
1 - A história de Chiapas é em grande parte a história de insurreições indígenas contra o desprezo e despotismo de diferentes governos. O povo Tzeltal, em 1712, e o Tzotzil, em 1968, só para citar duas das revoltas mais importantes, buscaram pelas armas o que não obtiveram pela lei: respeito à sua dignidade e cultura. Em ambas as ocasiões a guerra foi sangrenta e teve consequências fatais para toda a população.
2- Em Chiapas, ao contrário do resto do país, a revolução de 1910-1917 não triunfou. O governo de Obregón negociou com os rebeldes locais, armados contra as leis revolucionárias. Assim, por decisão do governo central, os caudilhos que lutaram para evitar a divisão da terra foram encarregados de aplicar a reforma agrária. A situação se estendeu até o governo do general Cárdenas, quando retirou a dotação de "ejidos" (propriedades rurais) e comunidades.
3 - Em Chiapas, aberta ou dissimuladamente, há uma persistente discriminação contra o índio e sua cultura. Muitos dizem, da boca para fora, que sentem orgulho do legado indígena: se referem à grandeza arqueológica, ou seja, aos índios mortos. Mas os índios vivos, que exigem condições dignas de cidadãos mexicanos, são vistos com evidente desconfiança.
4 - Com relação a eles, o governo desenvolveu, e continua mantendo, uma política baseada no paternalismo exercido através de caciques, índios ou não índios, a quem entrega uma considerável soma de poderes em troca do controle férreo da população a eles confiada.
5 - O nível e a qualidade de vida nas comunidades está longe de ser satisfatório. Mas o mais grave é a falta de perspectivas para muitas delas. Donos originais de uma terra rica, agora só colhem pobreza.
6 - Tudo isso explica, embora não justifique, o surgimento de uma tática em que prevalece a violência e a força. Do nosso ponto de vista, as condições de vida e exploração descritas no "Apelo da Selva" expressam, em termos gerais, uma evidência: a desigualdade da população indígena em relação ao resto dos mexicanos. Mas rejeitamos de maneira categórica a guerra como método para aniquilá-la. A violência gera violência. A violência, longe de abrir o caminho para a democracia, o adia.
7 - É necessário lembrar que, num passado recente, as organizações de massa e os partidos de oposição lutaram tenazmente para manter dentro da legalidade as reivindicações populares justas. Muitos corajosos representantes do povo foram assasinados, mas sua linha continuou sendo a da lei como única arma.
8 - Os problemas políticos se resolvem pelas vias políticas. As carências sociais se resolvem na paz. Não são os métodos militares, neste país e neste momento, os que podem resolver as grandes misérias do povo.
9 - O dia 2 de janeiro foi um dia triste com notícias de sangue derramado. O exército mexicano deve entender que a defesa da legalidade, o domínio da Constituição e de outras leis deve ser obtido e mantido com um minucioso respeito aos direitos humanos: a proteção da sociedade civil, indígena ou não, e o repúdio aos métodos bárbaros difundidos pelos instrutores internacionais da contra-guerrilha, que incluem repressão à população não-beligerante, terras arrasadas, genocídio.
10 - Diante de uma situação tão delicada, pedimos aos meios de comunicação que difundam informações não distorcidas.
11 - A paz deve ser reconquistada através da inteligência, democracia, liberdade, igualdade e fraternidade. É urgente nos esforçarmos por um entendimento baseado na unidade da diferença, no respeito às diferentes culturas. É a oportunidade, para o governo, de abandonar métodos obscuros de controle político, medidas antidemocráticas, terror contra as opiniões divergentes. É o momento de exigir firmemente nossos direitos e cumprir nossas obrigações de cidadãos. Chegou o dia de exigir da federação os recursos necessários para a decolagem econômica e social das comunidades indígenas, com pleno respeito a seus planos e projetos, através de sua participação democrática, sem caciques. É a hora ideal para pôr fim à destruição ecológica da selva lacandona, patrimônio desses povos e de toda a humanidade. Vivemos o momento certo para unir os mexicanos índios aos mexicanos não-índios em uma luta comum: conquistar o direito à autonomia dos povos indígenas no marco da soberania nacional.

Tradução de Lise Aron

Copyright "La Jornada"/World Media

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