São Paulo, segunda-feira, 10 de janeiro de 1994
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CD reúne canções inéditas de Lamartine

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Paulista de 32 anos, que canta, toca piano e há muito mora no Rio, Cadu se orgulha de ser o maior arqueólogo musical de Lamartine Babo. Quando Suetônio Soares Valença lançou a segunda edição de "Tra-la-lá", quatro anos atrás, ele montou um show no Museu de Arte Moderna carioca com as músicas mais populares do compositor. Agora, em homenagem aos 90 anos de Lalá, gravou um CD que, por enquanto, só pode ser encontrado no Rio (nas lojas do MAM, do IBAC, do MIS e da Escola Nacional de Música), em São Paulo (MASP e IBAC) e na Fundação Cultural de São José dos Campos. A exceção da "Marchinha do Grande Galo", as outras 13 faixas ou são pouco conhecidas (porque nunca regravadas) ou estão chegando ao disco pela primeira vez.
Cachorro-quente
Primeiro, as absolutamente inéditas. Há três sambas compostos para o carnaval de 1928: "O Ciúme é que me Mata", "Essa Velha Tem Malícia" e "Cai... n'Agua"; um charleston, "Saias Curtas", talhado a quatro mãos com o maestro Lírio Panicalli, em 1927; uma marcha-cançoneta de 1929 ("Dona Boa"); e a lendária marcha-charge com que Lalá e Ary Barroso saudaram a chegada ao Brasil do mais típico acepipe norte-americano, o cachorro-quente, já lá se vão 66 anos.
Com gírias que caíram em desuso, todas aplicadas a mulheres jovens e bonitas, como "pirão", "canja de pavão" e "pancadão" (que Lalá também usaria em "O Teu Cabelo Não Nega"), "Cachorro Quente" brinca com o verbo comer, por via oral e outras vias, piscando o olho para um ponto da gastronomia carioca (a lanchonete Americana, próxima à praça Serrador, Cinelândia) que há décadas deixou de existir. Talvez seja a surpresa mais curiosa do disco, ao lado de "A.B. Surdo", marcha satírica, feita de parceria com Noel Rosa, que só havia sido gravada em 1931, por Olga Jacobino.
Antes de Olga dar seus trinados, o próprio Lamartine anunciava, à guisa de prefixo, um estranho código, "70-Sul", hoje obscuro para 99,9% dos cariocas. 70-Sul era o número do telefone do hospício da praia Vermelha, na zona sul do Rio.
Futurista
Igualmente brincalhão na hora de qualificar o gênero de suas músicas, chegou a inventar um "fox-trote passo Marinetti" (para gozar o poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti, criador do futurismo) e uma "marcha-enxerto" (para fazer troça do médico russo, radicado em Paris, Sergei Vonoroff, célebre por enxertar glândulas de animais em seres humanos com veleidades rejuvenescedoras). O fox-trote futurista, "Que Pequena Levada", foi gravado por Francisco Alves, em dueto com Rosa Negra, em 1928, ano em que também chegou ao disco a marcha "Seu Vonoroff", apresentada pela primeira vez por Francisco Alves na revista "Não é Isto que Eu Procuro".
Para o ano (1934) que já havia brindado com três clássicos carnavalescos ("Ride Palhaço", "História do Brasil" e "Uma Andorinha Não Faz Verão", este de parceria com João de Barro), Lamartine aprontou mais uma marchinha, "Dá Cá o Pé... Loura!", que afinal não pegou. Gravada pelo próprio Lalá, foi sua primeira parceria com Alcir Pires Vermelho e fecha o CD de Cadu, oferecendo a uma loura as mesmas honrarias que, dois anos antes, haviam sido proporcionadas a uma mulata:
"O meu prestígio já caiu
No meu país natal
Não tenho nenhum cabo eleitoral
Se eu fosse presidente
Mandava pra você

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