São Paulo, quarta-feira, 12 de janeiro de 1994
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"Carnossauro" parodia filme de Spielberg

BIA ABRAMO
EDITORA-ADJUNTA DA "ILUSTRADA"

Ainda bem que para cada Steven Spielberg, há um Roger Corman. Quer dizer, para cada diretor que leva o artifício do cinema a sério, exista alguém para reafirmar que tudo aquilo é uma bobagem –e pode ser feita de modo muito mais barato.
Roger Corman, na realidade, nem participa diretamente dessa versão "gore" de "O Parque dos Dinossauros". "Carnossuro" é um projeto –se é que dá para falar em "projeto" em um filme como esse– de sua produtora, a New Horizons, e o nome do magnata do filme B aparece em letras garrafais na capa do vídeo, como um selo de (falta de) qualidade.
"Carnossauro", lançado pouco antes do "blockbuster" de Spielberg por artes da linha de montagem Corman, é diversão garantida. Sobretudo em contraste com "Parque dos Dinossauros": é o mesmo filme, só que onde um procura o artifício sofisticado, tenta a verossimilhança, apesar de operar no terreno da fantasia pura, e tinge a empreitada com alguma, digamos, seriedade, sua versão melequenta vai direto ao ponto. Corman & associados tratam o entretenimento, que é a intenção de ambos, na porrada. O roteiro é frouxo, os efeitos, ridículos, a cara-de-pau, exemplar. E por isso mesmo é que funciona.
Uma cientista fria, implacável e maluca (interpretada pela única atriz reconhecível do elenco, Dianne Ladd), desenvolve experimentos de engenharia genética com... Galinhas, é isso mesmo. Evidentemente, um carregamento de aves com modificações genéticas sai do laboratório e o monstro híbrido de galinha e dinossauro sai pela estrada afora devorando gente.
O "carnossauro" vai deixando corpos dilacerados e membros amputados pela região, que depois ficamos sabendo, foi uma antiga trilha de migração de dinossauros. Os guardas da corporação responsável pelos experimentos com as galinhas que saem para capturar o bicho são impiedosamente atacados. Um mais do que tradicional grupo de adolescentes em busca de sexo e aventuras em um lugar ermo acaba eviscerado.
Em vez de animais inteligentes, sensíveis e até vegetarianos que habitam o parque dos dinossauros spielberguiano, o carnossauro –parente próximo dos tiranossauros rex, com suas patinhas dianteiras frágeis e pequenas– é um assassino voraz, burro, sedento de sangue e tripas.
O único personagem mais próximo de um "herói" é Doc, um guarda responsável pela segurança de máquinas mineradoras. Até o aparecimento do monstro, seu maior problema é o excesso de bourbon e uma comunidade hippie-ecológica que tenta sabotar o trabalho da companhia de mineração. É aí que aparece a mais importante diferença com o filme de Spielberg: enquanto "Parque do Dinossauros" exalava uma mensagem ecológica ingênua, "Carnossauro" se diverte gozando sem misericórdia os bons sentimentos "verdes".
Em uma cena, os militantes ecológicos estão acorrentados às máquinas e recebem a visita do lagarto. Um sujeito com cara de quem ainda está voltando de Woodstock saúda o dinossauro com o símbolo de paz-e-amor, ao que o animal simplesmente come sua mão. Quando Doc consegue matar um dos seres (sim, porque eles vão se multiplicando, não se sabe muito bem como), ele exclama: "Odeio a vida selvagem!"
No fim, o roteiro, que já vem confuso e cheio de lacunas, enlouquece ainda mais. As mulheres do local começam a sofrer de uma estranha febre e, depois, a dar à luz a pequenos dinos, em pouco tempo a população feminina estará estéril. Parece que está começando um outro fio da história, mas a grana e o prazo deviam estar no fim e o diretor inventou um final abrupto e apocalíptico –o único possível para esse festival de cinismo explícito.

Título: Carnossauro
Produção: EUA, 1993
Direção: Adam Simon
Elenco: Diane Ladd, Raphael Sbarge, Jennifer Runyon
Lançamento: Califórnia Home Vídeo (tel. 011-452-5800)

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