São Paulo, sexta-feira, 14 de janeiro de 1994
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PT –a estrela e a cruz

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Os textos sagrados garantem que ninguém é profeta em sua terra. Ontem profetizei um calvário para o PT, e como o partido não é a minha terra (nunca fui de partido algum) talvez venha a ter alguma razão. Comentei a via-sacra que espera o PT, mas em linhas estruturais, sem entrar nos detalhes do assassinato de um sindicalista que fazia sérias acusações ao partido e à CUT.
Com ou sem o cadáver de Cruz Junior, o PT já estava em crise dupla: de fora para dentro, com a CPI que ameaçava se formar e agora parece que vai se formar mesmo; e a crise de dentro para fora, visível no distanciamento de suas diversas correntes, que só têm um denominador comum: a eleição de Lula e qualquer preço para a Presidência da República.
Não tenho autoridade para falar nos detalhes do crime. Há uma opereta que conta a história do barbeiro que se faz passar por conde e embaixador da França na Espanha. Quando apresenta credenciais ao soberano espanhol, dele recebe e pergunta de chofre: "E o que os franceses estão pensando do meu primo, o rei da França?" O barbeiro, que era impostor, mas não era bobo, respondeu na bucha: "Majestade, há uns que são a favor e outros que são contra".
Não sou contra nem a favor da hipótese de crime político. Contudo, é mais do que evidente a materialidade para o inquérito e a suspeita. A vítima dizia-se ameaçada de morte pelas denúncias que já fizera. Prometia fazer outras tantas. Foi morto pelas costas, o que torna improvável a legítima defesa que o criminoso poderá invocar. Quanto ao motivo, até que podia ser caso marginal à política, uma desavença pessoal de dinheiro, mulher ou clube de futebol.
Se o PT ou a CUT estão inocentes nesse crime, deram um azar desgraçado. A estrela vermelha que simboliza a sorte e a garra do partido deveria ser substituída por uma cruz preta. É que nem naquele filme de Hitchcock em que o homem é apanhado na hora e no local do crime, com a arma do crime e tem motivos para praticar o crime. Mas é inocente. Encarando a coisa por esse lado, não se precisa ressuscitar Hitchcock. O caso está mais para o Zé do Caixão.

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