São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 1994
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Incentivo atrai US$ 20 bi de brasileiros

NILTON HORITA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil, afinal, não é um patinho tão feio assim. Estão entrando dólares de todos os cantos do mundo no país. Como dinheiro não tem coração, inclui-se no bolo parte do patrimônio de brasileiros que se refugiou para alguma conta bancária no exterior. Na avaliação dos especialistas, foram repatriados cerca de US$ 20 bilhões entre 1991 e 1993.
O motivo principal, segundo o advogado Ary Oswaldo Mattos Filho, arquiteto da abertura das Bolsas de Valores brasileiras ao capital externo quando presidiu a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), foi a criação de instrumentos adequados para incentivar esta volta. "O conceito geral foi o de criar mecanismos para que este dinheiro depositado lá fora encontrasse um caminho de volta", conta Mattos Filho. "É melhor os dólares renderem frutos aqui do que permanecer em um banco internacional para financiar a economia deles."
Ou seja, criaram-se disfarces para a volta deste capital. Cerca de 30% dos US$ 7,3 bilhões líquidos investidos nas Bolsas de Valores são de brasileiros. Dos mais de US$ 13 bilhões em eurobônus vendidos por bancos e empresas no mercado internacional de capitais, 60% foram comprados por brasileiros.
Segundo o economista Carlos Geraldo Langoni, diretor do Centro de Economia Mundial da FGV (Fundação Getúlio Vargas), mexicanos e argentinos fizeram o mesmo. "Trata-se de uma reciclagem natural", afirma. "Se houver uma estabilização, o volume triplica."
O caminho de saída foi tomado principalmente em 1989 e 1990. O Brasil estava à beira da hiperinflação, as reservas cambiais representavam pouco mais que 10% do nível de US$ 32 bilhões de hoje e, para completar, assustava a possibilidade da vitória do PT nas eleição presidencial.
A partir de 1991, os brasileiros começaram a retornar capital: primeiro para socorrer seu negócio que estava abalado com o confisco do Plano Collor 1 e, depois, por uma situação peculiar da economia internacional.
Em reunião mundial dos executivos do ING Bank, na semana passada, ficou claro o diagnóstico. O mundo está com dinheiro sobrando. Os juros estão em parcos 3% ao ano e não há opções de rentabilidade. Os principais fundos de investimento internacionais estão refazendo suas estratégias. Reduzem aplicações na Asia e optam pelas chamadas economias emergentes da América Latina.
Os brasileiros não escapam desta tendência. Em vez de ficar com o dinheiro depositado em um banco europeu para ganhar 3% ao ano, é melhor aplicar em um eurobônus da Petrobrás ou da Telebrás e ganhar entre 8% e 10%.
Melhor ainda se for para aplicar nas Bolsas brasileiras e faturar a valorização real de 114% em 1993 e os outros 50% nominais das primeiras semanas de janeiro. "O dinheiro circula atrás de oportunidades de negócios", afirma Florian Bartunek, administrador de fundos do Banco Pactual.
A mesma coisa ocorreu aqui no Brasil mesmo. O cidadão comum que vendeu seu dólar para depositar na poupança fez o que donos do grande capital fazem. O resultado é que o deságio entre os câmbios comercial e paralelo chegou aos 4%, na média, e os bancos captaram cerca de US$ 1,8 bilhão na poupança.

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