São Paulo, segunda-feira, 17 de janeiro de 1994
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'Romário', o novo engano do Brasil

MARCELO FROMER; NANDO REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

1994, finalmente entramos no ano da Copa, ou entramos pelo cano? Parece brincadeira, mas o país do desperdício continua desprezando seu próprio talento, a sua capacidade nata de produzir craques técnicos e competentes para que pratiquemos aquele futebol que, por mais que a CBF faça de tudo para ele esqueça, o mundo não esquece. Quanta incompetência cabe num só órgão, dirigida atualmente por alguém que, sem dúvida, não ama o que faz e, pior, não sabe o que faz.
Mas o assunto é futebol, e quem teve a oportunidade de acompanhar a reação do Teimoso depois de definidos os times com os quais o Brasil irá jogar na primeira fase, pode ver com que seriedade analisou nossos adversários. Com alguma dificuldade, talvez pelo fato de estar sem óculos, Teimoso nos informou oportunamente o retrospecto de cada equipe em Copas, nos aterrorizando frente ao poderio dos inimigos. Já com a vista cansada, titubeou quando nos passava os dados referentes à equipe sueca. Foi no mínimo constrangedor; palavra de torcedor.
E são os próprios olhos de Parreira que revelam a sua alma franzina, ausente de brilho e fulgor, sem a jaça dos vitoriosos que iluminam o seu caminho com a lucidez e a opinião própria. Os olhos turvos de Parreira traem a sua falta de pulso e de lógica. Um homem confundido com a sua própria incoerência embaraçada em seus elos perigosos.
Examinemos o seu assessor para assuntos especiais, o velho Zaga. A presença desse velho lobo causa em nós certa desconfiança. O que deveria ter sido uma aliança entre o "velho e o novo", trazendo a astúcia de quem já se embarafustou pelos quatro cantos do campo, como uma formiga para a mente despojada de um valente iniciante, só resultou em imprecisão, indecisão, indefinição. Será que é a ausência de comando explícito que faz essa seleção colecionar em sua trajetória a enormidade de convocações incoerentes e episódios sem lógica a que temos assistido?
Vejamos o caso de Romário, presente em todas as listas de seleção feitas durante as eliminatórias; esse Romário que seguida e inacreditavelmente não era convocado. Até que o Brasil esbarrou na funesta possibilidade de ser desclassificado da Copa em pleno Maracanã, caso perdesse para o Uruguai, e aí sim Romário voa da Espanha para se tornar um fundamental. Tão fundamental que saltou em um único jogo para a posição de titular absoluto. Incrível, o Romário que não se fazia necessário para a seleção, num único jogo garante antecipadamente sua escalação para o jogo de estréia. Foi tão contundente sua atuação naquela instância que por alguns momentos nos esquecemos da péssima campanha que fizemos nas eliminatórias. Mas nada como um grande craque, o dissipador das dificuldades, o oportunista, o imprevisível, ele, Romário numa partida iluminada carimbou o passaporte do escrete rumo à América.
Endeusado por todos, inclusive pelo mesmo técnico que nunca soube justificar com clareza os motivos para sua ausência nas convocações, esse mesmo Romário agora é unanimidade. E como toda unanimidade ele corre o risco de se tornar um erro. Sim, Romário é o nosso mais novo grande erro. Não o Romário jogador, indiscutível craque, invisível apenas aos olhos esponjosos do nosso treinador; mas o Romário fato. É um grande erro alavancar um jogador dispensável em toda uma campanha para o posto de titular absoluto com o status e a autoridade de unanimidade. É um erro que desemboca, por exemplo, nas suas declarações sobre o Muller. O endiabrado Romário, em entrevista recente, resolveu tornar públicas suas idéias, –compatíveis com seu tamanho. O menino do Rio jogou farpas contra o seu colega de profissão, em detrimento de abrir os olhos de todos nós, para que pudéssemos nos convencer da escalação imediata de Edmundo, seu parceiro de praia e peladas.
Por acaso os gols do Romário valeram e valerão mais que os gols que o Muller fez durante os jogos da classificação e certamente fará na Copa caso ainda seja convocado? Por acaso o Romário classificou o Brasil sozinho e vencerá a Copa também sozinho?
E essa besteira toda não é culpa do Romário, pois se ele não é muito hábil com a boca, ele o é bastante com os pés. Dentre os fenômenos que só o futebol abriga, há um bem interessante. Nem sempre a genialidade, a habilidade, o talento que o jogador mostra em campo, em jogadas espetaculares, em dribles desconcertantes, fazendo mágica com os pés, necessariamente se reflete em palavras, raciocínios, idéias do mesmo calibre. Por vezes parece não estarmos diante do mesmo indivíduo, quando o vemos de repente frente a uma câmera de TV, jogando palavras ao vento, como um passe para ninguém numa bola alçada a lugar nenhum.
A culpa toda é da incoerência do Parreira, desse técnico confuso e ... teimoso, assessorado por gente que não inspira confiança. O fato Romário é apenas mais um entre tantos outros que nos fazem temer pelo futuro desta seleção.
Há alguma coisa de podre nisso tudo e nós tememos que, em breve, o cheiro comece nas narinas a feder.
Com o Teimoso, só faltam 150 dias para começarmos a perder mais uma Copa.
Marcelo Fromer e Nando Reis são músicos dos Titãs.

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