São Paulo, domingo, 23 de janeiro de 1994
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'Ficar no topo é o mais difícil', diz Sampras

THALES DE MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL

Campeão em Wimbledon e no US Open no ano passado, o norte-americano Pete Sampras parte para um desafio maior. Pela primeira vez em sua carreira, ele inicia uma temporada como o melhor tenista do mundo. Em entrevista exclusiva concedida em Munique no mês passado, durante a disputa da Grand Slam Cup, Sampras se diz pressioando pela condição de líder do ranking. Mesmo assim, acha que está pronto para vencer os quatro principais torneios do mundo, Austrália, Roland Garros, Wimbledon e US Open.
*
Folha - O que você espera deste ano, a primeira temporada que você começa na primeira posição do ranking?
Pete Sampras -Espero ficar onde estou. (risos)
Folha - Todos querem chegar ao topo. Qual o desafio de quem está lá?
Sampras - Ficar lá, o que é muito mais difícil. "Chegar ao topo é fácil, permanecer lá é mais difícil." Não sei quem disse isso, mas é verdade. Toda a pressão está em cima de você. A pressão do público e a pressão dos pontos, que é a pior.
Folha - Explique melhor.
Sampras - Falo da pressão dos pontos que tenho no ranking. Venci oito torneios em 93. Sou obrigado a vencer cada um deles novamente para garantir os mesmos pontos nesta temporada. Perder nas primeiras rodadas de algum deles pode ser desastroso.
Folha - Mas é pouco provável.
Sampras - Hum... Não sei... O circuito está cada vez mais equilibrado. A cada dia aparecem novos jogadores bons. Veja o holandês Jacco Eltingh. Perdi dele há dois meses, agora ele venceu Courier. E é um jogador que ainda não estourou, ainda tem muito potencial. Hoje em dia você estréia num torneio e já deve ficar preocupado com seu primeiro adversário, mesmo que seja um juvenil.
Folha - Por que existe tanto equilíbrio no circuito?
Sampras - Não sei. Talvez seja a fase atual do esporte, existem mais jogadores com condições de vencer os principais torneios.
Folha - Há alguns anos, os grandes títulos ficavam nas mãos de poucos jogadores. O que mudou?
Sampras - Não faço a menor idéia. Não sei analisar o tênis de 20 anos atrás, nasci em 1971. (risos) E essas comparações me aborrecem.
Folha - Qual a razão?
Sampras -Parece que virou moda falar mal do momento atual do tênis. Muita gente na imprensa adora escrever que hoje os jogos são monótonos, é só uma disputa de saques e coisas assim. Não concordo. Se Rod Laver, John Newcombe ou Ilie Nastase jogassem hoje, também seriam criticados. A ordem é falar mal.
Folha - Você discorda que seu jogo seja fundamentado em seu saque fortíssimo?
Sampras - Totalmente. Posso ganhar partidas difíceis em dias que estou sacando muito mal. Tenho mais recursos do que o serviço.
Folha - Pode ser, mas o que mais preocupa seus adversários é a força e a precisão dos seus primeiros saques.
Sampras - Se é o que eles pensam, tudo bem.
Folha - Vamos falar de sua carreira. Você venceu o US Open com 19 anos, mas depois demorou quase três anos para decolar ao primeiro lugar do ranking. O que aconteceu?
Sampras - Bem, não fui tão ruim assim. Estou há quatro temporadas entre os "top ten", mas eu sei o que você quer dizer. Fiquei um pouco confuso após vencer em Nova York. Era um garoto, posso ter me descontrolado um pouco. Não soube treinar como devia, troquei de técnico no momento errado. Mas acho que achei o trilho certo com a vitória em Wimbledon. De lá para cá, estou jogando mais tranquilo, sem afobação. Parece que ganhar um outro grande torneio serviu como prova de que eu posso jogar como quero.
Folha - Falando em grandes torneios, Roland Garros vai ser seu grande desafio este ano?
Sampras - Não encaro dessa maneira. O Aberto da Austrália será muito difícil, principalmente com o maldito calor de Melbourne. Todos os torneios do Grand Slam serão difíceis. Ter vencido Wimbledon e US Open em 93 não quer dizer que esses torneios se tornaram mais fáceis para mim.
Folha - Mas o piso de Paris não o incomoda?
Sampras - Bobagem. Já venci torneios em terra batida. Tudo bem, não é a superfície dos meus sonhos, mas não me sinto mal em Roland Garros. Os jogos que perdi lá até hoje foram derrotas para tenistas que estavam em grande fase, não estão relacionados com uma suposta falta de adaptação ao saibro.
Folha - Você acha que pode vencer o Grand Slam já este ano?
Sampras - Acredito nisso. Veja bem, não é uma provocação minha. Acho que todos os tenistas que estão nos primeiros lugares do ranking devem se orientar por esse tipo de convicção. Se eu não acreditar que posso ganhar, quem mais o fará?
Folha - Novos títulos significam mais prêmios. Como você investe o dinheiro que ganha no tênis?
Sampras - Essa é uma coisa que deixo para a minha família. Meu pai cuida de tudo. Sei que tenho alguns apartamentos e um rancho na Flórida. Acho que meu pai vai diversificar os negócios, mas não tenho interesse em acompanhar.
Folha - Ele vai abrir um restaurante?
Sampras - Não, isso não. (risos) Somos gregos. Restaurantes gregos dão prejuízo porque se gasta muito na reposição de pratos quebrados.
Folha - Muitos falam que você é brigão por causa do sangue quente dos gregos.
Sampras - Brigão, eu? Nada disso. Às vezes eu posso me revoltar com juízes, mas estou longe de ser um John McEnroe.
Folha - Como foi jogar duplas com McEnroe na Davis?
Sampras - Uma experiência incrível. A final contra a Suíça em 92 foi inesquecível. Eu joguei muito mal, John teve que jogar por nós dois para virar o placar. Perdemos os dois primeiros sets, mas John nunca desanimou. Aquele ponto a equipe deve a ele, eu me esforcei para acompanhá-lo, mas o cara é demais.
Folha - Você vai voltar à equipe norte-americana este ano?
Sampras - Eu nunca deixei de fazer parte dela. Às vezes não jogo porque a direção prefere convocar outros jogadores contra equipes mais fracas. Caímos fora da disputa em 93 porque menosprezamos nossos adversários, e isso é fatal.
Folha - Quais serão seus grandes rivais na temporada?
Sampras - Michael Stich terminou o ano jogando muito bem. Pode ser que 94 seja seu grande ano. Ele sempre sacou bem, mas agora está perfeito. Courier caiu um pouco nos últimos meses, mas pode voltar a jogar melhor.
Folha - E quanto a Andre Agassi e Boris Becker?
Sampras - Eles estão jogando abaixo do que se espera de tenistas como eles, mas quem tem talento não esquece seu jogo. São adversários terríveis em qualquer quadra. Realmente, ficar no topo não vai ser fácil.

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