São Paulo, domingo, 23 de janeiro de 1994
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Tremor afasta moradores de Los Angeles

PHIL REEVES
DO "THE INDEPENDENT", EM LOS ANGELES

Tasha Anderson já tomou sua decisão. As célebres atrações da Cidade dos Anjos –o sol, muito espaço, liberdade– já estavam bastante arranhadas com os recentes incêndios, tumultos e a recessão que assolam o sul da Califórnia. O terremoto foi a gota d'água.
Ela decidiu abrir mão de seu emprego de gerente de loja, fazer as malas e ir para a Costa Leste, somando mais um nome à crescente lista de norte-americanos que estão abandonando o "Estado Dourado" para reiniciarem suas vidas em outros lugares. "O terremoto me deu um bom motivo para ir embora", disse Anderson, de 21 anos. "Foi apavorante".
Ela não é a única a pensar assim. Vários outros dos clientes –na maioria brancos e de classe média– de um restaurante chique em Encino diziam a mesma coisa na última quinta-feira. O ator James Horan disse: "Cheguei ao ponto em que tenho de pesar cuidadosamente as vantagens econômicas de viver aqui contra as desvantagens. Gosto de ter controle sobre o que vai acontecer. Mas não dá para controlar terremotos".
Mas, como atestam seus Jeeps e Porsches estacionados em frente às lojas das vizinhanças, a maioria das pessoas nesse restaurante tem uma opção. Na verdade, os mais ricos foram os menos atingidas pelo terremoto que abalou o sul da Califórnia na madrugada da segunda-feira, matando mais de 50 pessoas, comprometendo gravemente o sistema de "freeways" e causando danos estimados em entre US$ 15 bilhões e US$ 30 bilhões. Elas podem optar entre permanecer em Los Angeles ou se mudar.
O mesmo não se aplica às centenas de trabalhadores manuais de origem hispânica, e suas famílias, acampados num parque público em Reseda, amontoados em volta de fogueiras para espantar o frio e dormindo em barracas ou debaixo de lonas plásticas. Northridge, ao norte de Los Angeles, epicentro do terremoto, tem uma grande população de mexicanos, salvadorenhos e outros latino-americanos de baixa renda e sem seguro. Também tem uma proporção alta de apartamentos alugados, baratos e mal-construídos. A combinação desses fatores faz com que as "cidades de barracas", erguidas nos 70 parques da região, abriguem, em sua maioria, aos mais pobres.
Carmen Bargas, 35 anos, é mexicana e trabalha numa lanchonete. Ela estava dormindo em seu Ford Bronca com outras cinco pessoas, entre elas dois bebêsm, no momento do tremor. Assim como muitas das estimadas 20 mil pessoas que agora estão vivendo fora da cidade, ele espera um inspetor municipal decidir se seu apartamento, que sofreu sérias rachaduras, ainda é habitável. Bargas não sabe quanto tempo terá de ficar acampada, mas sabe que não pode abandonar a Califórnia. O que a mantém aqui é o dinheiro, por pouco que seja.
A imigrante polonesa Sophia Bronakowska está na mesma situação. Ela e seu marido estão vivendo numa barraca, enquanto seu filho e a mulher dormem no carro. Eles também aguardam uma decisão sobre sua casa. Como vivem do salário do filho, que trabalha numa loja, permanecer em Los Angeles, para eles, não é uma opção: é uma necessidade.
Para piorar a situação, o sofrimento dos acampados deverá se agravar se as chuvas previstas realmente caírem, intensificando o caos provocado pelo terremoto. Mas mesmo com o sol brilhando a situação já estava ruim. Na quarta-feira de manhã, os habitantes do sul da Califórnia foram acordados com mais um abalo desagradável –4,4 pontos na escala Richter– e tiveram de enfrentar o pesadelo de irem ao trabalho numa cidade cujo sistema de transportes foi gravemente comprometido pelo desabamento das vias expressas e a interdição de pontes e estradas. A previsão é que haverá vários meses de engarrafamentos, até o sistema de vias expressas ser refeito.
Os oito milhões de motoristas de Los Angeles estão sendo obrigados a utilizar as ruas no lugar das vias expressas. Esta perspectiva é desanimadora para muitos deles, em parte porque têm medo de serem forçados a atravessar alguns dos bairros dominados pelas gangues. Seu nível de dependência da rede de "freeways" ficou evidente pelos avisos difundidos pelas rádios, que aconselhavam motoristaas a "comprarem mapas da cidade, não dirigirem a 90 km/h (o limite nas vias expressas) e pararem nos faróis vermelhos".

Tradução de Clara Allain.

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