São Paulo, domingo, 16 de outubro de 1994
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–Por que acha que será melhor presidente do que o deputado Luiz Inácio Lula da Silva?

COSETTE ALVES

–Se comparar o que ele fez como deputado com o que fiz como senador, na mesma época, você vai ver as razões. Tenho o maior respeito pelo Lula, como pessoa e como líder de massa. Mas acho que a proposta que o Lula encarna não tem viabilidade. O Brasil precisa aglutinar as pessoas, não simplesmente reclamar, gritar, ofender, separar o bem e o mal. Política é você mudar as pessoas. Eu tenho hoje, dada a minha trajetória, um conjunto de características que faz com que muitas forças se aglutinem ao meu redor e numa direção que eu já dei, desde que fui ministro da Fazenda.
–Qual será sua primeira providência como presidente?
–Será propor ao Congresso e à sociedade civil uma agenda de mudanças na Constituição. A estabilização econômica está feita. Temos que enfrentar agora os problemas estruturais do país. O Estado deve ser reorganizado, com a substituição do modelo burocrático, corporativista e assistencialista por um Estado público e democrático, onde todos sejam cidadãos. Vamos revigorar a Federação, simplificar e modernizar o sistema tributário e fiscal, aumentando a base de arrecadação e as formas automáticas de recolhimento, diminuindo alíquotas, na medida do possível, e impedindo o desperdício, a fraude e a sonegação. A Previdência Social tem que ser modernizada e a saúde precisa de uma fonte de financiamento seguro e estável. E temos que flexibilizar os monopólios estatais para a parceria com empresas privadas.
–Governar em coalizão. O que significa exatamente isso para o sr.?
–Isso significa que temos que ter o apoio no Congresso para o programa de antemão estabelecido. Significa, também, eu tenho reiterado isso, que não haverá indicação de partidos para a composição do ministério.
-Além da competência, e da honradez, qual será o critério que vai prevalecer para a escolha do seu ministério?
–Fora competência e honradez, o critério será o compromisso com a execução e consolidação do meu programa de governo e das reformas que vão mudar a cara do Brasil. O ministério será anunciado no momento mais conveniente.
–Qual vai ser seu estilo? Vai ficar em Brasília ou vai viajar mais?
–Não, eu vou viajar. Vou viajar porque hoje o brasileiro precisa sentir que tem alguém que está fazendo coisas, que dê sinais. Mas não é só uma coisa simbólica. Acho também que é preciso olhar de perto a coisa. Pretendo viajar pelo Brasil e para fora também.
–O que pensa da elite do país?
–Vamos separar as coisas. Uma coisa é a elite como a alma política: todo mundo ataca. O conceito de elite, sociologicamente, é diferente do conceito de elite que se usa aqui. Elite são os melhores. Eu disse outro dia: eu pertenço à elite cultural do país, o Lula pertence à elite sindical. Quer dizer, cada um tem uma elite, os melhores. Outra coisa são as classes dominantes. As nossas classes dominantes são cegas. E à medida que as várias elites não têm tido competência para desviar, para mudar o rumo das coisas, acabam ficando muito sufocadas pelas classes dominantes. E elite não é para isso. Elite é para você fazer o que há de melhor na sua área. A nossa classe dominante é muito imediatista. Não tem visão de médio e longo prazos. Acho até que ela perdeu a capacidade de conduzir o Brasil. A prova disso é a eleição. Os únicos candidatos com chance, Lula e eu, não têm ligação com as classes dominantes, no sentido orgânico das coisas! As classes dominantes não puderam colocar nenhum candidato delas. Elas se acoplaram, talvez até, a mim!
–O que o sr. considera um bom e um mau empresário?
–O bom empresário é o que entende que não adianta pensar no dia-a-dia, que tem que ter horizonte, que tem que ter visão. Hoje, essa visão não é mais dada empiricamente. O bom empresário é aquele que entende de um ponto de vista mais técnico, mais científico, as coisas. E quando não entende, chama quem entende.
–O que o fez caminhar da esquerda mais para o centro? Nos anos 70/80 estava muito mais à esquerda. Quais as razões da sua mudança?
–Mudou o mundo. Mudou o que é a esquerda. O Santiago Dantas já falava de esquerda positiva e esquerda negativa, na sua época. Eu não quero repetir a fórmula, mas você hoje tem um setor que pensa que é de esquerda mas não é progressista. É apenas uma etiqueta. As mudanças propostas pela chamada esquerda brasileira não são mudanças.

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