São Paulo, segunda-feira, 24 de outubro de 1994
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Economia, xadrez e mentira

LUÍS NASSIF

Dizia o grande Emanuel Lasker, campeão mundial de xadrez do início do século, que esse jogo não comporta a mentira. Um lance mentiroso vai se refletir alguns lances à frente, desmontando a estratégia proposta. O mesmo ocorre com a economia.
Desde fins do ano passado, a coluna e outros analistas não ideologizados apontavam os problemas centrais a serem resolvidos, antes de se iniciar um plano de estabilização.
Confira-se cada lance falso e seu desdobramento:
Bancos Estaduais: desde a gestão Marcílio Marques Moreira, passando por Krause e Haddad, sucessivas equipes econômicas vinham tratando do enquadramento dos bancos estaduais. Sabia-se que, sem os ganhos inflacionários, eles iriam se constituir em ameaça a qualquer plano de estabilização.
Interrompeu-se o processo na gestão FHC, porque seus assessores acreditam que o mundo se resume a meros movimentos de taxas e câmbio, mas principalmente para não atrapalhar as futuras alianças políticas do candidato. Dois lances depois, a mentira aparece.
Contrato Coletivo: desde o início de 93, alertava-se para a necessidade de acelerar a implantação do contrato coletivo, para desarmar a bomba da indexação. Questionado sobre a questão, FHC esquivava-se com seu estilo habitual: ``Isto não é problema meu, mas do Barelli", como se não fosse elemento importante de um plano de estabilização. Dois lances depois, a mentira aparece.
Câmara Setorial: sabia-se, desde sempre, que um plano de estabilização deveria vir acompanhado de uma estratégia política e econômica visando estimular os agentes econômicos a aumentarem a oferta e os investimentos, de maneira a criar fôlego e ânimo para consolidar a estabilização. As Câmaras Setoriais eram o fórum adequado para se fazer esse trabalho político. Quando as Câmaras foram desativadas, FHC não quis entrar em dividida: ``Isto é problema do Ministério da Indústria e do Comércio." Dois lances depois, a mentira aparece.
Agora, apreciando o panorama da Rússia, o velho e bom FHC reitera seu estilo: sem pressa de voltar e encetar o programa de reformas porque a estabilização é um processo lento, cuja responsabilidade deve ser de todos. Acha que a opinião pública vai engolir.

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