São Paulo, domingo, 30 de outubro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ministro do STF é mais que juiz

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há pouco mais de dez anos tentei, nesta mesma coluna, traçar o perfil ideal de um ministro do STF - Supremo Tribunal Federal. Vigente, ao tempo, a constituição outorgada pela junta militar, em 1969 era instrumento de dominação, sujeito a constantes transformações casuísticas, ao sabor das variações do poder.
As questões submetidas ao Supremo Tribunal Federal provocavam, muitas vezes, intensa perplexidade, tendo em vista os ajustes impostos pela força à lei, como consequência dos atos institucionais.
Fiz, naquela oportunidade, o registro de que o magistrado da alta corte de justiça é mais que o juiz investido da função de julgar, mas alguém incumbido de ajustar o direito aos preceitos fundamentais da normatividade constitucional.
Posso reiterar a antiga conclusão, sob a força do dispositivo que dá ao Supremo Tribunal Federal o papel de guarda da Carta Magna, como missão precípua. Levo em conta, ainda, uma visão que se reforça cada vez mais em meu espírito, desdobrada em dois pontos: a paz social depende mais do Judiciário do que de qualquer outro setor do Estado; o Judiciário é órgão de governo, diferentemente do que pensam muitos, levados a crer que governo é só o Executivo.
As exigências constitucionais para que o cidadão seja nomeado para o Supremo Tribunal Federal correspondem ao mínimo, sendo idealmente desejável que o escolhido ultrapasse largamente os limites dessa definição. Quer a Carta vigente –à semelhança do que ocorreu ao longo da vida republicana– que o escolhido tenha mais de 35 anos e menos de 65, dois dados objetivos de fácil verificação. Mas há dois outros de aferição complicada: o escolhido deve ter notável saber jurídico e reputação ilibada.
Reputação é a avaliação do caráter da pessoa considerada. Diz-se respeitável (e, portanto, ilibado) o cidadão do qual se fala bem em seu grupo ou em sua coletividade, merecendo a presunção de que possui bom caráter. A notabilidade do saber jurídico é relativa. Não é objeto de qualquer avaliação ou prova concreta, que defina os limites do saber, para dizê-lo digno de nota, compatível com a nobreza e a estatura do cargo.
Cada participante da Suprema Corte aplica o direito interno até a casos que dizem com a sobrevivência do Estado. Examina questões de direito internacional, nos tratados, convenções e nos negócios de que o Brasil ou seus cidadãos participem. Cumpre funções que exigem dele a visão do estadista, apto a avaliar adequadamente a missão do Estado e a garantia do indivíduo, nas relações de direito público e de direito privado.
A guarda da Constituição –inserida no art. 102 da mesma Carta Magna– justifica a opinião emitida. Guardá-la corresponde a cuidadoso exercício de política, em sentido alto. Envolve trabalho próprio do Judiciário, qual seja, o de decidir controvérsias, mas, na medida em que subordina os dois outros poderes à força de suas decisões, repercute sobre cada elemento concreto da vida nacional. Essa visão me permitiu acolher com naturalidade a nomeação do advogado e senador Maurício Correa. Nela estão satisfeitos os dados objetivos, com útil equilíbrio dos dados subjetivos, aos quais me referi, em que seu passado de líder da advocacia e de político será o equipamento habilitador do qualificado cumprimento de sua nova missão.

Texto Anterior: O Congresso Nacional e as reformas
Próximo Texto: Medo de Aids estimula traição entre casados
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.