São Paulo, quarta-feira, 2 de novembro de 1994
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O Brasil está anestesiado?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Levei um susto ontem ao ler a primeira página da Folha anunciando que a cesta básica subiu 8,56% em outubro. Susto maior, porém, levei ao perceber a falta de susto do país com a notícia. O Brasil parece anestesiado pela onda de consumo ou pela simples desinformação.
Mais grave de tudo: a alimentação foi o índice que mais pesou, chegando a 10,22%. O problema é que os pobres gastam a maior parte de seus ínfimos rendimentos em comida. Portanto, a inflação para eles vai direto na veia.
Tivéssemos um segundo turno presidencial com essa evolução de preços da alimentação, Fernando Henrique Cardoso poderia até vencer. Seria, entretanto, bem mais difícil. O PT teria a munição que não dispunha até o início de outubro. No final de setembro, a inflação girava em torno de 1% e o preço da cesta básica exibia queda.
O índice de 8,56% mostra que está entrando água no barco, fortalecendo as pressões pela indexação de salários. Tradução: o novo presidente assume com a obrigação de lançar medidas urgentes para evitar que a insatisfação se alastre. E, certamente, não serão medidas agradáveis.
Dificilmente Itamar Franco, querendo deixar a Presidência montado na sua altíssima popularidade, vai receitar, justo no final de ano, remédios amargos. Por isso preferiu, por exemplo, encontrar uma solução mais amena para a questão do Rio de Janeiro, apesar das pressões para que decretasse o estado de defesa.
PS – Sintoma da briga que aguarda o PT depois da derrota de Lula. Pela primeira vez uma liderança expressiva do partido propõe publicamente a expulsão dos radicais. Em contato ontem com esta coluna, o prefeito de Ribeirão Preto, Antônio Palocci, afirmou que a sobrevivência do PT depende do "desquite" urgente com os radicais e na aproximação com o governo Fernando Henrique Cardoso e de governos estaduais de tendência social-democrática.
Ele citou, em particular, Mário Covas. Essa aproximação deveria conduzir, no futuro, à entrada na administração. "O casamento acabou e não tem mas volta", disse, atribuindo aos radicais parte da derrota de Lula.

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