São Paulo, sábado, 5 de novembro de 1994
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Será que existe identidade brasileira na moda?

EVA JOORY; ERIKA PALOMINO
DA REDAÇÃO

A discussão em torno do aparecimento de uma identidade brasileira agita o meio de moda. Os elementos são o desfile da Coopa-Roca, no último Phytoervas Fashion, a coleção de verão da Forum e os respingos dessas referências à cultura brasileira nas roupas de nomes como Gloria Coelho e Alexandre Herchcovitch.
Para sedimentar essa polêmica, acontece hoje às 16h30 o terceiro e último debate do projeto Atitude 1 Ano, no auditório da Folha (al. Barão de Limeira, 425, nono andar, Campos Elíseos, região central). Há convites à disposição do público, que podem ser retirados a partir de 9h na portaria do jornal.
A consultora de moda Costanza Pascolato, o estilista Marcos Morcerf, o editor de moda da "Vogue", Giovanni Frasson, o diretor de desfiles Paulo Borges e a coordenadora de Estilo da Rhodia, Daniela Bongiorni são os convidados. Patricia Carta, editora de Moda da Revista da Folha, será a mediadora. O projeto tem patrocínio das microfibras Setila e Meryl, da Rhodia.
Ausentes do debate por estarem fora da cidade, os estilistas Gloria Coelho, proprietária da marca G, e Tufi Duek, da Forum, respondem aqui a perguntas sobre o tema. Leia a seguir trechos da entrevista com Duek.
(Eva Joory e Erika Palomino)
Folha - Existe moda brasileira?
Tufi Duek - O Brasil hoje está passando por um momento de amadurecimento da moda e também dos estilistas, que estão percebendo que são capazes de realmente criar algo novo, com a nossa cara, nosso clima, nossa situação sócio-econômica e cultural. Os japoneses, belgas e americanos recentemente passaram por esta situação e o mundo todo percebeu. Hoje são grandes pólos exportadores da própria cultura fazendo frente dos tradicionais mercados europeus. Por que não podemos também cortar o cordão umbilical e perder o medo de começar a definir uma moda brasileira?
O país, em todos os seus momentos, teve a influência da Europa pela própria colonização. Por que não a moda, que para mim seria tropical, colonial, sensual e com um toque exótico sem perder modernidade e tecnologia?
Folha - Por que uma preocupação em mostrar uma moda brasileira este ano?
Duek - Não sei da preocupação de outros estilistas em mostrar uma moda brasileira, sei com convicção da minha preocupação pelo amadurecimento do trabalho e pelo desenvolvimento da minha equipe. Com isso, buscamos fazer uma identidade própria e brasileira. Tenho a consciência que é só por esse caminho que podemos sair do Brasil para outro mercado.
Folha - O que tem de brasileiro na sua moda?
Duek - De mais brasileiro foi a inspiração em nossas raízes, cultura e problemas sociais, sem perder a modernidade e a internacionalização da moda.
Folha - O que tem de estrangeiro na sua moda?
Duek - A informação está aí para todos que estão com a antena ligada com o comportamento e atitudes dos nossos dias. Senão, acusariam de plágio quase todos os grandes nomes da moda no mundo inteiro. Jean Paul Gaultier dizia que num determinado momento (isto há anos atrás), aderiu à forma "près du corps" (próximo ao corpo), de Azzedine Alaia e que gostou tanto que não teria porque não adotá-lo.
Folha - Você acha que o Brasil pode conquistar um espaço internacional ao adotar um aspecto regionalista?
Duek - Acho que temos que perder o medo e o complexo de inferioridade. Acredito que somos capazes de conquistar um espaço internacional. O adotar aspecto regionalista ou não, vai de cada estilista mostrar o seu trabalho com uma identidade própria. Temos hoje bons estilistas que, se perderem o medo e pararem de pensar com a cabeça dos outros, sem dúvida serão grandes talentos para mostrar que na moda não somos tão Terceiro Mundo.
Folha - Como você vê as críticas de oportunismo ou apropriação em relação ao uso de aspectos da cultura brasileira?
Duek - Recebi muito mais elogios do que críticas. A importância deste trabalho é maior do que as críticas e coloca a moda muito acima das discussões de formas, cores ou comprimentos. Vai direto ao aspecto de importância cultural que ele representa. Quanto ao oportunismo colocado, várias pessoas sabiam que este trabalho já havia começado bem antes do Brasil ganhar a Copa, da perda de Ayrton Senna, e do Plano Real.
Folha - Moda regional dá certo em centros como Rio e SP?
Duek - As pessoas compram roupas para usar de uma maneira muito própria –não exatamente como se propõe–, o que é muito bacana. A venda das minhas lojas nestes centros responde a esta pergunta.

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