São Paulo, domingo, 27 de novembro de 1994
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País não tem controle sobre manicômios judiciários

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

As autoridades não têm controle sobre os manicômios judiciários e os hospitais de custódia (onde ficam os criminosos com problemas mentais) existentes no país. Não sabem quantas pessoas estão internadas e quais os principais problemas enfrentados.
"Até o final da semana passada, o Ministério da Justiça, que está finalizando um censo penitenciário, não tinha dados precisos sobre a quantidade de hospitais de custódia e tratamento", disse o advogado Luiz Flávio Borges D'Urso no 1º Encontro Interdisciplinar de Direito e Psiquiatria, realizado em novembro na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
D'Urso, que é membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, estima em 19 o número dessas instituições em todo o território nacional. Ele localizou quatro no Rio de Janeiro, duas em São Paulo, duas em Minas Gerais, duas no Ceará e uma em cada um dos seguintes Estados: Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Mas não é só esse o problema que cerca os manicômios judiciários. "Em nível federal, estadual e municipal verifica-se um descaso quanto à linha de tratamento que deve ser adotada nessas instituições", diz o advogado.
Segundo o Código Penal, as características essenciais dessas instituições devem ser hospitalares. Para esses locais são enviados aqueles que cometem crimes, mas não respondem pela sua conduta por incapacidade mental.
Pela legislação, estas pessoas não recebem uma pena (prisão), mas são submetidas a medidas de segurança (internação em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial), cujo objetivo é a cura.
"Não é isso que acontece. As unidades de tratamento são usadas como se fossem prisões. O acompanhamento psiquiátrico é displicente. Os métodos adotados –choques elétricos e drogas fortes– são considerados arcaicos e inadequados pela medicina moderna", afirma D'Urso.
Dirceu de Mello, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, concorda. "Nossas estruturas são deficientes. A imposição de medida de segurança não tem tido o resultado que deveria", diz.
A displicência no atendimento acarreta outro problema: as perícias não são feitas no prazo certo e a pessoa acaba ficando internada mais tempo do que deveria.
Diz o Código Penal que a perícia será feita findo o prazo mínimo de tratamento (de um a três anos) fixado pelo juiz, e repetida ano a ano até que se constate o fim da periculosidade do indivíduo, quando ele deverá então ser liberado.
"Como a maioria não pode contratar advogado (usa a assistência judiciária do Estado), embora acabado o prazo mínimo, a pessoa continua internada, porque não houve médico que fizesse a perícia e o liberasse", disse D'Urso durante o encontro.
A falta de maior atenção nas perícias faz com que a internação resulte, na prática, como uma condenação à prisão perpétua.
D'Urso reconhece que a administração e manutenção dos manicômios judiciários é cara. Ele propõe a criação de convênios entre Estado e iniciativa privada como uma possível solução. "As empresas seriam responsáveis pelo atendimento. O Estado pagaria pelo serviço prestado."

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