São Paulo, domingo, 27 de novembro de 1994
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Revolução silenciosa da qualidade

ANTONIO KANDIR

Sem que muitos se dessem conta, quase na surdina, as empresas brasileiras deram um importante salto de qualidade no correr desta primeira metade dos anos 90. Uma espécie de revolução silenciosa cujos frutos começam, cada vez mais, a aparecer à luz do dia.
Esse salto de qualidade não foi obra do acaso. Ele é resultado direto da decisão firme, tomada no início da década, de promover um conjunto articulado de políticas para transformar em definitivo o modelo de desenvolvimento construído com base no fechamento da economia e em ampla e minuciosa intervenção do Estado.
O conjunto de políticas abria-se nas seguintes vertentes: privatizações, desregulamentação, abertura econômica (com um cronograma de quatro anos de progressiva redução tarifária) e o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade, uma das mais bem-sucedidas e baratas experiências brasileiras de parceria entre os setores público e privado.
Hoje é possível perceber-se o acerto de mudar simultaneamente os aspectos essenciais do já caduco modelo de desenvolvimento forjado nos anos 40 e mantido com modificações, mas sem ruptura fundamental. A verdade é que, se tivesse havido hesitação em promover essa ruptura naquele momento, início dos anos 90, o potencial da economia brasileira seria hoje menor do que é.
Com efeito, frente ao desafio lançado pela decisão firme de mudança, que produziu novos riscos e oportunidades, as empresas brasileiras mostraram, no geral, boa capacidade de resposta. Prova objetiva disso é o notável crescimento, nos últimos cinco anos, do número de empresas brasileiras credenciadas com a ISO 9000, certificado que atesta a aplicação continuada de padrões de qualidade internacionalmente reconhecidos, verdadeiro salvo-conduto para participação nos mercados externos mais exigentes.
Para se ter uma idéia das dimensões desse processo, em 1990, eram apenas 18 as empresas brasileiras credenciadas. Hoje, esse número é superior a 400. Mais importante, é crescente a velocidade de adesão à ISO 9000.
Algumas comparações internacionais são importantes para avaliar-se a importância desse salto de qualidade. Na América Latina, o Brasil é, de longe, o país com maior número de empresas detentoras da ISO 9000. Países como Argentina, Chile e México, que estabilizaram mais cedo suas economias, estão em posição claramente inferior, com números que vão de 133 empresas, no caso mexicano, até cinco, no caso chileno. Na Argentina, não passam de 17 as empresas credenciadas.
Também com relação a outros países "emergentes", ocupamos posição de destaque. Temos quase quatro vezes mais empresas credenciadas que a Coréia e estamos empatados com a Espanha. Mesmo em comparação com algumas potências econômicas consolidadas, como o Japão, não estamos muito atrás (400 empresas contra 600, no caso japonês).
Dessa rápida panorâmica, pode-se extrair ao menos uma conclusão importante: o Brasil ingressa num período de estabilidade econômica com um time de empresas que o credencia a integrar-se de modo competitivo à economia mundial, com efeitos internos potencialmente muito positivos, quanto à renda, geração de divisas e capacitação tecnológica. Trata-se de posição certamente mais promissora do que a de países que, tendo estabilizado suas economias com maior antecedência, apresentam estrutura industrial mais débil.
Assim, havendo destreza para conduzir, de agora em diante, a indispensável consolidação de estabilização econômica, sem descuidar da notável capacidade e potencial competitivos conquistados pelas empresas brasileiras, o sepultamento da inflação crônica dará vida a um novo ciclo sustentável de desenvolvimento econômico, condição necessária para melhorar radicalmente a qualidade de vida da maioria dos brasileiros.

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