São Paulo, domingo, 27 de novembro de 1994
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Limites para a desindexação

LUÍS NASSIF

Há certa desinformação no tom taxativo daqueles que sustentam que haverá desindexação total na economia a partir de 1º de janeiro. É até possível, mas não é provável.
A notícia faz parte da arenga que precede toda mudança de governo. Entra-se numa entressafra de notícias –já que o governo que sai não tem muito a oferecer–, que abre margem a que deduções se transformem em boatos, boatos em notícias e o tom taxativo no creme de leite que transforma em doce qualquer receita de procedência duvidosa.
Dentro da equipe há quem sustente a necessidade de se proceder à desindexação, como uma aposta de tudo ou nada. Mas são posições individuais, que os autores emitem "off the record" na esperança de que se tornem majoritárias.
Se passa no primeiro teste –a de conquistar outros corações da equipe–, entra-se na segunda etapa, da avaliação de riscos e consequências. Os que garantiram que a desindexação seria total não aguardaram o segundo tempo do jogo.
No plano conceitual, há vantagens em se adotar esta postura e um grau nada desprezível de riscos. A desindexação total é a aposta final na estabilidade. Disparado o tiro de largada, não se pode cometer nenhuma concessão, sob o risco de desmoralizar a política econômica. Vai-se fazer a aposta sem sequer se ter avaliado as perspectivas da revisão constitucional?
Decretada a desindexação, o que acontecerá, por exemplo, se um banco estadual estiver à beira de um colapso? Terá que ser deixado à sua sorte, porque a aposta impõe limites severíssimos de emissão monetária. Sua quebra criará não apenas um impasse político, como um impasse financeiro complexo.
Se falharem as metas de arrecadação e não houver dinheiro para os compromissos públicos? Aplica-se o calote. Se os investidores não acreditarem nessa aposta e começarem a sacar dinheiro dos bancos? Aumentam-se os juros e esfrangalha-se de vez a política cambial.
Não encontrando indexadores pela frente, a volta da inflação transforma-se num furacão, arrebentando a arrecadação tributária (que não estará indexada), promovendo uma luta selvagem por recomposição salarial e assim por diante.
É uma aposta complexa, que até teria condições de ser bancada pelo próximo presidente, tendo por retaguarda a quase unanimidade nacional contra a inflação. Mas se há alguma certeza em relação ao próximo governo é o estilo pessoal de Fernando Henrique Cardoso, totalmente avesso às grandes apostas e aos gestos ousados.

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