São Paulo, domingo, 4 de dezembro de 1994
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Caso Paiakan abre discussão sobrepunições para os índios

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Caso Paiakan abre discussão sobre imputabilidade do índio
Promotora diz que líder indígena e sua mulher não são inimputáveis
A absolvição do líder caiapó Paulinho Paiakan e de sua mulher Irekran traz à tona a discussão sobre a imputabilidade penal dos índios. A legislação vigente é adequada? É preciso mudá-la, ou não?
Segundo o Código Penal, é isento de pena aquele que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto (aqui enquadra-se o índio não-aculturado, por não ter a identidade cultural e social comum) ou retardado, é inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito de seus atos.
Mas, o mesmo código, diz também que, se o autor do crime for parcialmente capaz de compreender o fato, terá pena reduzida de um a dois terços, conforme o grau de entendimento demonstrado.
O objetivo da lei é proteger aqueles que não têm condições de perceber a gravidade do ato que praticaram. No caso do índio, a proteção recai sobre aquele que vive isolado em sua tribo e não tem, ou quase não tem, contato com a civilização dominante.
Assim, conforme o nível de entendimento do índio –aferido por laudos psiquiátricos e antropológicos– ele pode ser absolvido, ter a pena reduzida ou receber condenação integral.
"Paiakan e sua mulher têm contato constante com a nossa civilização. Viajam para o exterior. Têm negócios e bens. Fazem aplicações financeiras. Seus filhos nascem em maternidades. Não podem ser considerados inimputáveis", afirma a promotora de Justiça Luíza Nagib Eluf, que participa da comissão que prepara o anteprojeto do novo Código Penal.
Luiz Flávio Gomes, juiz da 26ª Vara Criminal de São Paulo, também considera Paiakan e Irekran índios "aculturados".
Ele explica que o juiz deve eliminar todas as dúvidas que tiver acerca do grau de compreensão do índio, mandando fazer quantas perícias forem necessárias para formar sua opinião.
Para a promotora, a absolvição de Paiakan e Irekran abre um perigoso precedente quanto à imputabilidade penal dos índios. "A pergunta que surge daqui para a frente é: o que eles podem fazer sem ser punidos? Até onde podem chegar?", indaga.
A comissão que elabora a proposta de novo Código Penal, até agora, não rediscutiu a questão do índio. "A lei vigente não impede que se faça justiça. No caso Paiakan, a Justiça foi intimidada por pressão dos caiapós."

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