São Paulo, quarta-feira, 7 de dezembro de 1994
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CDs revelam Beatles inéditos e rebeldes

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Chegou anteontem ao Brasil o álbum duplo "Live at the BBC", uma coletânea de 69 faixas, 25 inéditas, registradas pela banda inglesa The Beatles para a BBC de Londres entre 1962 e 1965.
Os Beatles produziram e gravaram em dez anos de atividade –de 1960 a 1970– quantidade de músicas suficiente para preencher as três décadas seguintes.
As sessões radiofônicas recém-lançadas são prova de que o material do quarteto ainda surpreende o mercado pop. Lançado na última sexta-feira em Londres, o álbum vendeu 400 mil cópias na Grã-Bretanha e chegou ao primeiro lugar da parada pop londrina.
George Martin produziu os discos (remasterizados digitalmente) e o livreto que os acompanha, com informações detalhadas sobre data, local e fontes de cada música. Martin foi o primeiro produtor dos Beatles. Especializado em música erudita, estreou no pop com os Beatles. Durante as gravações do primeiro compacto dos Beatles, "Love Me Do" (Parlophone), em julho de 1963, Martin alterou a imagem da banda, de rebelde para bem-comportada, e praticamente impôs o baterista Ringo Starr.
Apesar da arte-final de Martin, muito da rebeldia originária da banda aparece nas sessões da BBC. Mesmo porque o produtor e o ambiente eram outros. Lennon, McCartney, Harrison e Starr tinham liberdade nos estúdios da emissora.
Ao longo de quatro anos, gravaram 52 programas para a BBC, num total de 88 músicas, entre composições próprias e covers de rock'n'roll e rhythm'n'blues. O material selecionado por Martin resultou em 56 músicas, além de trechos de entrevistas feitas durante os programas.
Parte dos programas foi perdida. Os Beatles estrearam na BBC num programa ao vivo, transmitido do Manchester Playhouse, em 7 de março de 1962. Paul interpretou "Dream Baby", de Roy Orbison. John preferiu músicas agitadas. Cantou "Memphis Tennesseee" e "Please Mr. Postman". O registro se perdeu, bem como o de outros três dos quais a banda participaria.
O álbum traz dois textos. Um ensaio do crítico Derek Taylor dá conta de que os Beatles adoravam "trabalhar como cães" na rádio. Chegavam a gravar 18 músicas por dia. Um relato do produtor sênior da BBC, Kevin Howlett, revela detalhes sobre o envolvimento da banda com a emissora.
Howlett menciona a entrada dos Beatles na programação da BBC. Eles fizeram um teste na sucursal da rádio em Manchester em janeiro de 1962. O produtor Peter Pilbeam, que selecionava as atrações para o programa "Teenager's Turn (Here We Go)", deixou o seguinte relatório de avaliação sobre a banda: "Um grupo original; não tão rock, mais country e western e com uma tendência a tocar música". É uma definição precisa do estilo dos Beatles no início.
O grupo participou de diversos programas. O mais famoso foi "Saturday Club", transmitido ao vivo aos sábados às 10h. A carreira radiofônica da banda culminou no verão de 1963. Ela ganhou uma série, às terças às 17h.
Os CDs conservam a descontração dos programas. No "Saturday Club" de 16 de julho de 1964, antes de tocar uma versão de "A Hard Day's Night" (com acréscimo de piano), os Beatles caçoam de como são chamados em português. "O quê? 'Os' Beatles? Que coisa estranha!", brinca John.
Há até uma balada desconhecida de Lennon & McCartney intitulada "I'll Be on my Way", gravada em junho de 1963. A música foi gravada por Billy J. Kramer and The Dakotas no lado B do compacto de estréia do grupo.
Mas o material mais importante do álbum está nos covers. Ali, a banda revela laços com o fulcro do rock. Lennon canta nove músicas de Chuck Berry. A banda visita seis vezes Carl Perkins e quatro Elvis Presley e Little Richard.
Outra curiosidade é o rock "Clarabella", apresentado em 1963. Os Beatles foram buscá-lo num compacto da banda norte-americana Jodimars, datado de 1956. Jodimars eram dissidentes da banda de Bill Haley.
Desde o início, os Beatles faziam arqueologia do rock. Em vez de escavarem ruínas, ouviam discos norte-americanos.

Disco: Live at the BBC
Lançamento: Capitol (importação no Brasil pela EMI-Odeon)
Quanto: R$ 40,00 (o CD duplo, em média)

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