São Paulo, sábado, 24 de dezembro de 1994
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Dinheiro até sobra

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - O presidente eleito Fernando Henrique Cardoso tem em mãos um estudo aterrador sobre a realidade tributária brasileira. Demonstra que o valor dos processos tributários em fase de julgamento na primeira instância corresponde a R$ 36 bilhões.
E que os chamados créditos tributários inscritos na dívida ativa chegam a R$ 21 bilhões. Ou seja, dinheiro que a União deveria arrecadar, mas não o fez ainda em consequência do popular "devo, não nego, mas pago quando puder".
Tudo somado dá R$ 57 bilhões, uma pilha de dinheiro para ninguém botar defeito. Para efeito de comparação: esses recursos, se efetivamente arrecadados, cobririam todo o déficit orçamentário potencial previsto pelo próprio governo para 1995 (R$ 10 bilhões) e ainda sobrariam R$ 47 bilhões para investimentos.
Ou, para prosseguir na comparação: com a sobra de R$ 47 bilhões, daria para assegurar um salário mínimo (de R$ 70,00) a todos os 32 milhões de brasileiros tidos como miseráveis durante mais ou menos 20 meses. Se o governo pretende mesmo implementar um programa de renda mínima, esse dinheiro de impostos supostamente devidos, mas não pagos, seria ouro sobre azul.
É claro que a perspectiva de se arrecadar toda essa pilha de dinheiro é irrealista. Uma coisa é a Receita supor que um dado contribuinte de uma quantia "x" e outra é provar, judicialmente, que a dívida de fato existe e/ou está corretamente calculada.
Mas, mesmo que se suponha que o governo consiga pôr a mão em 10% desse dinheiro, ainda assim seriam R$ 5,7 bilhões, o que já cobre mais da metade do rombo potencial no Orçamento de 95.
Acima de tudo, o que esses números demonstram é que o problema fiscal brasileiro é muito mais de gestão do que de qualquer outra coisa. Gestão, no caso, inclui simplificar o sistema tributário. Grande parte do contencioso jurídico se deve ao excesso de normas, assim como uma parte do não-pagamento decorre de uma carga fiscal excessiva sobre quem paga, já que o universo de contribuintes é reduzido.

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