São Paulo, terça-feira, 8 de fevereiro de 1994
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Wenders filma sua visão do fado

EVA JOORY
DA REPORTAGEM LOCAL

Um ano após o seu lançamento, pelo qual ganhou o Prêmio Especial do Júri em Cannes no ano passado, o filme "Faraway, So Close!" (Tão Longe, Tão Perto), do diretor alemão Wim Wenders, chega ao Brasil em abril, ainda sem data definida. Antes disso, em março, entre os dia 16 e 27, o MIS (Museu da Imagem e do Som) e o Instituto Goethe preparam uma retrospectiva Wim Wenders, mas "Faraway, So Close!" ainda não está com a sua exibição confirmada.
Wenders, 49, chegou a ser convidado para o evento, mas recusou o convite por falta de tempo. É o que disse à Folha, em entrevista exclusiva por telefone de sua produtora em Berlim. O diretor frisou que "Faraway, So Close!" não é uma continuacão de "Asas do desejo", mas um filme sobre a Alemanha, a partir do olhar do anjo Cassiel, que retorna à cidade depois da queda do muro de Berlim. Além de Otto Sanders, Bruno Ganz e Peter Falk, o filme reúne Nastassja Kinski, Willem Dafoe, e participações especiais de Lou Reed e do ex-presidente Mikhail Gorbatchov.
Atualmente o diretor se prepara para as filmagens de seu novo projeto, ainda com título provisório, o documentário, "The Lisbon Story", e continua trabalhando em parceria com o escritor americano Paul Auster, num projeto ainda inédito. Wenders falou ainda de sua paixão pelo rock, do seu novo livro "Once", e da crise em que se encontra o cinema europeu.
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Folha - Fale-me do seu livro, é um diário?
Wim Wenders - Não é um diário, é um livro de pequenas histórias chamado "Once". É basicamente um livro sobre fotos que fiz durante mais de 20 anos, com pequenas histórias que escrevi para acompanhá-las. Não tem nada a ver com o que já fiz antes.
Folha - Qual a importância das artes em geral, como fotografia, literatura e artes plásticas? O senhor queria ser pintor?
Wenders - Todas estas formas de arte são ingredientes que necessito para fazer um filme. Tudo isso é importante na minha vida. É um privilégio poder hoje em dia combinar todas estas coisas numa só forma, que é cinema. Eu sempre tentei manter todos estes ingredientes, e de vez em quando eles se juntam para virar um filme. Eu não posso fazer filmes sempre, por isso me concentro numa coisa só.
Folha - O que o senhor pretendeu com "Faraway, So Close!", já que não é uma continuação de "Asas do Desejo"?
Wenders - Inicialmente, quis fazer um outro filme sobre Berlim, e pensei fazê-lo com personagens diferentes como motoristas de táxi, carteiros, crianças. Quis que eles tivessem um olhar sobre a cidade assim como os anjos, no meu filme anterior. Mas depois pensei na volta dos anjos e como ainda havia um trabalhando... Achei que seria engraçado rever Damiel (Ganz) e Marion (Solveig) anos depois, e ver o que havia acontecido.
Folha - "Faraway" é uma parábola sobre a reunificação?
Wenders - Sim. Vi que depois de uma euforia inicial, quando o muro caiu, a atitude mudou. Hoje os alemães não são pessoas felizes. Prometeram a eles uma mudança para melhor, e hoje vêm que estavam melhor antes. Estão tendo que pagar um preço alto por conta destas mudanças. Naquela época, disseram a eles que as mudanças não iriam custar nada e hoje, seis anos depois, vêem que estão bem longe de seus sonhos. Vendo toda esta infelicidade, senti que queria fazer alguma coisa. O filme tenta oferecer uma solução, através do anjo Cassiel, para essa infelicidade.
Folha - Apesar de ter sido premiado pelo júri, os críticos foram bem duros com seu filme. O que acha das críticas já que o senhor chegou a ser crítico também?
Wenders - Assim como não leio as críticas boas, também não leio as más. Eu já fui crítico de cinema, mas de uma maneira diferente. Não fazia críticas do jeito que a maioria faz hoje. O que se vê hoje é uma indústria de opinião. Os críticos ficam bem felizes em destruir alguma coisa. Eu nunca escrevi sobre um filme que não gostei. Eu estava mais preocupado em descrever uma experiência. Acho crítica opinativa extremamente chata. Não preciso disso. Os críticos não estão interessados nos filmes, preferem escrever sobre si próprios, e sobre o quão espertos eles são.
Folha - Fale-me do seu projeto "The Lisbon Story".
Wenders - Quero fazer uma espécie de documentário, assim como fiz em "Tokyo-Ga". A história gira em torno da música portuguesa e do fado. Amália Rodrigues fez uma participação especial em "Até o Fim do Mundo" e gostaria de trabalhar novamente com ela.
Folha - O senhor é muito ligado em rock, seus filmes têm participações de pop stars como Nick Cave e neste, Lou Reed. Qual a sua relação com o rock?
Wenders - Cresci ouvindo rock, foi uma música muito importante para mim. Quando eu era uma rapaz, a música dos anos 60 me influenciou muito, tanto através do rock inglês, como Kinks, Van Morisson, e Pretty Things, como do rock americano como Byrds, Velvet Underground e Bob Dylan. Essa música me abriu para um mundo novo e me ajudou a me manter em contato com minha criatividade.

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