São Paulo, sexta-feira, 11 de fevereiro de 1994
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Lula faz discurso moderado a empresários

CARLOS EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Luiz Inácio Lula da Silva tornou público ontem seu descontentamento com a versão preliminar do programa de seu governo feita pelo PT. Em palestra a empresários japoneses na Câmara de Comércio Brasil-Japão, em São Paulo, o virtual candidato petista à Presidência da República afirmou que "só a partir de maio é que terei programa". No discurso, Lula procurou minimizar a importância do que foi produzido até agora sobre programa.
A Folha antecipou ontem que Lula não gostara do rascunho de programa e que decidira cacifar o deputado federal Aloizio Mercadante para combater o setor ortodoxo que deu o tom no documento inicial. No debate com empresários, Lula remeteu todas as respostas da área econômica a Mercadante. "O Aloizio é a figura pública mais importante na elaboração do plano econômico do PT", disse.
A entrada em cena de Mercadante vai agitar o debate interno petista. O deputado é estigmatizado pela ala ortodoxa do partido, que hoje tem a hegemonia na cúpula partidária. "Vamos construir o programa com a sociedade", afirmou Mercadante para os representantes de empresas japonesas instaladas no país. Tratou-se de outra tentativa de esvaziar o poder real do rascunho de programa de governo do PT.
Em seu discurso, Lula procurou tranquilizar os anfitriões que cobraram claramente o pagamento da dívida externa. "O que eu quero é uma discussão de governo para governo. Essa é uma questão política e não econômica. Devemos diferenciar o que é legítimo do que não é da dívida", disse. A resposta contempla a defesa da auditoria internacional para a dívida externa.
Lula não gostou da idéia da moratória ser incluída sequer como hipótese no trabalho inicial da equipe que faz o programa de governo. Mercadante foi mais claro. "Acho que um programa de governo não deve trabalhar com hipóteses", disse o ungido por Lula.
Mercadante questionou a legitimidade de parte da dívida, afirmou que um eventual governo petista seria um "negociador duro", mas enfatizou sempre que a conjuntura econômica atual é diferente dos tempos em que a moratória era uma palavra mágica para a esquerda. "O fundamental é o investimento externo também e o desafio é compatibilizar a questão do pagamento da dívida com o investimento estrangeiro", declarou.
Lula só teve uma recaída no discurso light ao pregar a priorização das relações econômicas com "Bolívia, Venezuela e Colômbia", em substituição ao papel ocupado hoje por Estados Unidos e Europa. A recaída terceiromundista poupou o Japão de críticas.
A política agrícola de um governo petista, cuja falta de explicitação no versão inicial do programa é outro alvo de Lula, foi sinalizada por ele ao defender um vago "incentivo aos pequenos produtores e às cooperativas".
Insistindo na palavra credibilidade como chave para definir as relações com o empresariado, Lula pregou que a inflação seja reduzida gradativamente, sem choques. Mercadante defendeu uma reforma do Estado e afirmou que só com a volta da estabilidade econômica é que os investidores estrangeiros voltarão ao país. "Precisamos também enfrentar o déficit público", arriscou o deputado, mesmo sabendo que a ortodoxia petista tem ojeriza à frase.
Lula confirmou que participará da reunião da Executiva Nacional do PT na próxima quinta-feira, quando a versão preliminar começará a ser questionada por Mercadante. No início da noite, ele, Mercadante e Rui Falcão, líder dos ortodoxos, se reuniram para debater a campanha presidencial.

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