São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Xerife atrabiliário

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Sou, talvez, a mais antinacionalista das criaturas. Sinto-me em casa em São Paulo, mas também em Buenos Aires, Madri ou Bruxelas, entre outras. Só torço para a seleção brasileira quando ela está jogando bem e não porque usa o verde-e-amarelo. Em 94, aliás, só vou torcer se o Parreira escalar os cinco atacantes que o Matinas Suzuki Jr. vem pedindo.
Não obstante, é irritante a insistência do governo norte-americano em impor ao Brasil a legislação sobre patentes. Pode ser até que os tópicos desejados pelos norte-americanos sejam convenientes também para o Brasil, um detalhe técnico que não me sinto em condições de analisar. Ainda assim, cabe a cada país legislar de acordo com seus interesses e não sob pressão insuportável de um parceiro, ainda mais quando esse parceiro é a única superpotência do planeta.
O que agrava o episódio é o fato de que os Estados Unidos e o Brasil assinaram, faz dois meses, o acordo da chamada Rodada Uruguai do Gatt (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), o mais abrangente instrumento de liberalização comercial já concebido. É no marco desse acordo que devem ser discutidas as relações comerciais entre os países-membros. O unilateralismo que tem caracterizado a posição norte-americana, com base no seu Trade Act de 1988, é uma violação ao espírito do Gatt, apontada aliás pelo próprio organismo internacional.
Além disso, os EUA não são exatamente anjos em matéria de protecionismo comercial, embora sua economia seja, de fato, uma das mais abertas do mundo. Um relatório de 1992 da Comissão Européia, braço executivo da União Européia, aponta 70 medidas discriminatórias ao livre comércio adotadas por Washington. Protegem seus agricultores à razão de US$ 3,750 bilhões por ano (dados de 1991).
A Rodada Uruguai foi, simplificando, um acordo para que ninguém entrasse armado no "saloon" do comércio internacional. Não tem cabimento, por isso, o xerife-mor sair por aí atirando antes mesmo que o parceiro chegue ao "saloon".

Texto Anterior: E o bicho continua
Próximo Texto: Fernando Henrique pode sair?
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.